Um bom filme é resultado de um afinado e afiado trabalho de equipe – diretores e atores certos, juntos no set certo. Uma parceria recente que se tornou sinônimo de sucesso é formada pelo cineasta Tim Burton e pelo ator Johnny Depp. Estão no sexto trabalho conjunto – fizeram Edward, mãos de tesoura e A fantástica fábrica de chocolate, entre outros. Agora, trata-se do filme Sweeney Todd – o barbeiro demoníaco da rua Fleet, que estréia no Brasil na sexta-feira 8. Depp está tão bem em cena que concorre ao Oscar de melhor ator, mesmo fazendo o que até então era inimaginável: ele cantou, nesse que é o primeiro musical de sua carreira. Burton, que sempre deixou claro que não vibrava com longas cantorias nas telas, também jamais se aventurara nesse gênero. Pois bem: o trabalho da dupla é empolgante, como tantas outras parcerias, atuais ou antigas, no cinema.

Sweeney Todd é a melhor adaptação cinematográfica recente de um espetáculo da Broadway.

O enredo se desenvolve numa sombria Londres do século XIX, onde um barbeiro (o Sweeney Todd do título) volta do exílio para se vingar de uma injustiça. Todd era feliz, casado e pai de uma linda garotinha, até que foi condenado por um crime que não cometeu devido à falsidade de um juiz interessado em arrebatar-lhe a mulher. Quinze anos depois, com a fama de melhor barbeiro de Londres, ele fica sócio da locatária de seu salão, a senhora Lovett (interpretada por Helena Boham Carter). Trata-se de outro tipo de parceria, bem incomum: enquanto ele degola os clientes que barbeia no andar de cima, a mulher usa a carne dos mortos para fazer tortas que são vendidas no restaurante instalado no andar de baixo. Tudo embalado por belíssimas canções de Stephen Sondheim. "Não existe nenhuma intenção de glorificar os serial killers", disse Burton ao jornal francês Libération. "O cinema possui uma forte dimensão catártica e, assim, mostra certas atitudes para que elas não sejam praticadas no mundo real."

Deve ter sido fácil para o diretor Burton convencer o ator Depp sobre a sua tese envolvendo catarse e filmes violentos: eles são amigos, e o ator costuma aceitar e acatar tudo aquilo que o diretor pede. Quando Depp, por exemplo, não concorda com uma cena, Burton sugere que ele ensaie mesmo a contragosto, e no final o ator acaba gostando do resultado. O mais difícil no caso de Sweeney Todd foi convencê-lo de que ele podia cantar. Depp já havia participado de uma banda de rock na juventude (a The Kids), mas nunca interpretara uma canção inteira. Procurou então seus antigos companheiros de garagem e gravou a música My friends, que está no atual musical e cuja letra diz que as duas navalhas são os únicos amigos que Sweeney tem no mundo. Quando Depp enviou a fita da gravação para Burton, recebeu imediatamente as cópias do contrato para serem assinadas.

Parcerias afinadas no cinema, como Depp e Burton, não é um fenômeno isolado – muitas vezes a sintonia é tão grande que as decisões partem não do diretor, mas dos próprios atores. Era o que acontecia com Robert De Niro na época em que ele era o protagonista habitual dos filmes de Martin Scorsese – fizeram, entre outros, Taxi driver, Os bons companheiros e Touro indomável. Vale destacar que Touro indomável foi sugerido pelo próprio De Niro, que presenteou Scorsese com a autobiografia do boxeador Jack LaMotta e não se cansava de falar que a história daria um grande filme. Outro que palpitava bastante era o italiano Marcello Mastroianni, e fazia isso com um diretor que nem sequer escrevia roteiros: Federico Fellini. Em Ginger e Fred, a última parceria de ambos, Mastroianni teimou que teria de usar um sapato elegante, feito à mão, pois esse detalhe era importante para o personagem inspirado no ator e dançarino americano Fred Astaire. Fellini sabia que Mastroianni nunca precisou desse tipo de laboratório, mas cumpriu o pedido à risca. "Desconfiei que ele queria um belo par de sapatos para usar depois das filmagens", revelou Fellini.