25/05/2005 - 10:00
O termo blowback originalmente designava a possibilidade de gases químicos retornarem, por efeito de ventos contrários, às tropas que os haviam lançado contra as linhas inimigas. A CIA (Agência Central de Inteligência dos EUA) redefiniu o conceito para descrever os efeitos inesperados ou indesejados, para a política externa americana, das operações secretas ou encobertas realizadas por seus agentes em outros países. A idéia, tradução erudita dos populares “efeito bumerangue” ou “feitiço que se volta contra o feiticeiro”, é desenvolvida por Chalmers Johnson no livro Blowback: the cost and consequences of American Empire. Um caso famoso de blowback, só para ficar aqui por estes tristes trópicos, foi o do general panamenho Manuel Noriega, dublê de ditador e narcotraficante, que na década de 70 estava na folha de pagamentos da CIA, mas, por motivos vários, se voltou contra os seus criadores. A rebeldia do filho ingrato levou o então presidente George Bush, em dezembro de 1989, a invadir o Panamá para caçar Noriega, que, como castigo, foi preso e enviado para a Flórida, onde apodrece na cadeia. Agora, George W. Bush, o filho, está às voltas com outro blowback vindo do Caribe: na terça-feira 17, o Departamento de Segurança Interna (DHS) dos EUA prendeu em Miami o cidadão cubano Luis Posada Carriles, acusado de atos de terrorismo pelos governos de Cuba e da Venezuela. Posadas, 77 anos, anticastrista fanático e ex-agente da CIA, tem um prontuário extenso, digno de um romance de John Le Carré ou de roteiro de um filme de suspense: em 1961, ele participou da fracassada invasão da Baía dos Porcos em Cuba; em 1967, transferiu-se para a Venezuela, onde trabalhou no serviço de contra-espionagem; em 1976, foi acusado de ser um dos autores do atentado que derrubou um avião de passageiros da Cubana de Aviación nas Bahamas, causando a morte de 73 pessoas. Preso em Caracas, fugiu em 1985 antes de ser julgado e colaborou com os americanos no abastecimento dos “contras” na Nicarágua. Em 1997, envolveu-se nos atentados terroristas contra hotéis em Havana. Três anos depois, foi preso no Panamá, suspeito de planejar um atentado contra Fidel Castro, mas acabou indultado no ano passado. Com tudo isso, Posadas foi detido nos EUA não por ser um terrorista perigoso e foragido, mas por estar ilegal nos EUA.
Asilo – O cubano entrou clandestinamente em território americano em março
deste ano, pela fronteira mexicana. No mês seguinte, fez um pedido de asilo
político. Fidel Castro chiou e acusou os EUA de hipocrisia por defender a luta
contra o terrorismo e, ao mesmo tempo, manter um terrorista à solta no país.
Sempre em busca de catalisadores externos que desviem a atenção do povo dos problemas internos, o ditador cubano colocou mais de um milhão de pessoas
nas ruas de Havana na terça-feira 17, numa manifestação pela prisão de Posadas. Já Caracas pediu a extradição do terrorista porque ele tem nacionalidade venezuelana e era funcionário da contra-espionagem da Venezuela quando participou do atentado contra a Cubana de Aviación.
A prisão de Posadas aconteceu horas depois de uma entrevista coletiva que ele concedeu em Miami, na qual se disse disposto a retirar seu pedido de asilo para “não causar problemas políticos aos Estados Unidos”. De qualquer forma, o episódio pegou mal para a Casa Branca, principalmente para o Departamento de Segurança Interna (DHS), que foi criado depois do 11 de setembro de 2001 para combater o terrorismo no país. O nome do cubano constava de uma lista de procurados e, no entanto, ele não só entrou ilegalmente nos EUA como ficou quase dois meses escondido em Miami, com conhecimento do governo. Só a coletiva fez as autoridades se mexerem.
Tão certo como um dia após o outro é o fato de que Washington jamais entregará Posadas a Havana, onde dificilmente ele escaparia do paredón. Também é pouco provável que os EUA o extraditem para as mãos do pouco amistoso Hugo Chávez, hermano de armas de Fidel. Em vez disso, a Casa Branca deve enviar o agora indesejado pupilo para um terceiro país que se disponha a acolhê-lo – talvez alguma republiqueta do Caribe. Assim, tudo ainda pode acabar bem para um terrorista confesso, mas fiel aliado de Tio Sam.