25/05/2005 - 10:00
Fundada em janeiro de 1995, a Organização Mundial do Comércio (OMC) está completando dez anos, mas já enfrenta desafios de gente grande. Criada para regular as transações comerciais internacionais, a instituição elegeu para a direção geral, na sexta-feira 13, o francês Pascal Lamy, ex-comissário de comércio da União Européia (UE). Quando assumir o cargo, em setembro, pesará sobre seus ombros a responsabilidade de concluir com sucesso as negociações da Rodada de Doha, lançada em 2001 na capital do Qatar, que visa aprofundar o livre comércio mundial, combatendo subsídios e barreiras alfandegárias. A partir da conclusão da Rodada de Doha (que os analistas acreditam que deva se estender até 2007), serão desenhados os próximos anos da OMC e o futuro do comércio exterior brasileiro. Há alguns anos, o País deixou de lado o fato de representar irrisórios 1% do comércio mundial e passou a desempenhar um papel de destaque na organização. Terceiro produtor agrícola mundial, o Brasil liderou, na malfadada reunião ministerial da OMC em Cancún, em 2003, um levante dos países subdesenvolvidos (o G-20) contra o protecionismo agrícola das nações ricas, em especial Estados Unidos e países da União Européia (EU). Na época, o defensor dos subsídios agrícolas europeus era justamente Pascal Lamy.
Na eleição deste ano, o Brasil chegou a lançar seu candidato (de protesto, pois não tinha condições de vencer), o embaixador Luiz Felipe Seixas Corrêa, que saiu da disputa na primeira rodada de consultas. Mas a vitória do antigo adversário europeu, que substituirá o tailandês Supachai Panitchpakdi, parece não assustar o Itamaraty. “Lamy vai ter de agir com objetividade. A função do diretor-geral é de aproximar as partes”, afirma o ex-ministro das Relações Exteriores Celso Lafer, que já esteve lado a lado com o francês em várias negociações. A bem da verdade, nos últimos anos, o Brasil tem colecionado vitórias na OMC. Primeiro, venceu a questão dos subsídios ilegais dados pelo governo americano aos produtores de algodão. Depois, também ganhou o caso do escandaloso subsídio concedido aos produtores de açúcar da UE.
Risco – Após a divergência em Cancún, em 2003, acentuou-se o temor entre os negociadores de que a Rodada de Doha não irá resolver a questão do protecionismo agrícola, o nó górdio a ser desatado. O problema é que as negociações são realizadas tendo por base as tarifas e subsídios registrados pelos países após a Rodada do Uruguai, há dez anos. A Índia, por exemplo, tem tarifa consolidada média (sobre a qual se negociam as reduções) de 116%. Entretanto, a média tarifária aplicada é de 37%. Se um possível acordo em Doha, por exemplo, reduzir em 60% as tarifas indianas, na prática isso não significará nada. Esse mecanismo é utilizado em todos os países, inclusive no Brasil. “O grande risco dessa rodada é que as reduções tarifárias não atinjam níveis que permitam diminuir o protecionismo de fato e produzir os ganhos do comércio”, alerta Marcos Jank, especialista em negociações internacionais. Esse fiasco, segundo ele, além de manter as desigualdades entre os países ricos e pobres, poderia causar uma explosão de acordos bilaterais, que não resolvem os problemas do protecionismo global e diminuem a relevância da OMC.
Já os diplomatas do Itamaraty estão otimistas com relação à Rodada de Doha. “É perfeitamente possível que haja um acordo”, afirmou Seixas Corrêa. Mas Jank ressalta que a questão mais difícil de ser equacionada nas negociações – a fórmula que vai ser usada para jogar as tarifas para baixo e que define o tamanho da redução – ainda não foi discutida. E não parece haver entusiasmo entre os grandes do comércio mundial em reduzir o protecionismo. De fato, o governo americano não está conseguindo nem aprovar no Congresso o Cafta, acordo de livre comércio com a América Central, cujos países em conjunto possuem economias insignificantes perto do titã americano. “Em Washington, as políticas comerciais têm de ser aprovadas pelo Congresso, no qual os lobbies protecionistas são muito fortes”, diz Jank. Ou seja, a batalha diplomática está apenas começando.