MARIO ANGELO/FOTOREPORTER/AE

Uma tentativa de assalto. Um advogado ligado às casas de bingo e caça-níqueis. Um carro acidentado. Uma estranha coleção de envelopes com dinheiro dentro e, mais que sinistro, com numerais ordinais anotados por fora. Isso dá um bom enredo de filme. Está dando também uma grande dor de cabeça para as polícias Civil e Militar de São Paulo – e já se cogita de que a enxaqueca possa pegar a Polícia Federal. A encrenca é a seguinte: ou a PM tem em seus quadros um soldado que criminosamente forja provas contra policiais civis, o que é muito grave para a corporação, ou a Polícia Civil terá de admitir que tem nas delegacias gente sua que é corrupta. Na linguagem da malandragem, situações como essas são apelidadas de B.O (numa referência irônica a boletim de ocorrência). Pois bem, eis o B.O. desse enredo real.

O advogado Jamil Chokr foi à casa de um cliente na zona norte de São Paulo e, ao sair de lá com R$ 10 mil que diz corresponder a honorários, percebeu que seria assaltado. Era a noite da sexta-feira 25. O ladrão se aproximou, Jamil voou para dentro de seu Vectra blindado e voou mais ainda por uma das marginais da cidade quando viu que o assaltante o seguia. Vectra correndo na frente, moto correndo atrás, uma viatura da PM decidiu acompanhá- los, também a toda velocidade. Jamil bateu o seu carro. O motoqueiro caiu. A PM então se aproximou, prendeu o homem da moto e socorreu o advogado, que foi internado. Ao revistar o carro, os policiais militares encontraram 28 envelopes com diferentes quantias de dinheiro dentro deles. Por fora dos envelopes (e é aí que começa a dor de cabeça geral) havia as seguintes anotações: 42º, 81º, 98º, 27º, seccional, distritos policiais. Em outras palavras, na batida do carro ficou um cheiro de propina no ar.

Assim que pôde prestar depoimento, o advogado disse que todos os envelopes referem-se a honorários. Não convenceu. O caso foi parar na Corregedoria da Polícia Civil e aí a história enrolou para valer. Segundo essa corregedoria, um PM prestara depoimento e declarara que fora ele quem anotara os valores nos envelopes, embora tivesse negado ter forjado a indicação dos destinatários do dinheiro. O comando da Polícia Militar reagiu dizendo que a Polícia Civil é que está falseando a história.

Enquanto as polícias brigam, o Ministério Público entrou na parada e, na quinta-feira 31, bingo! Isso mesmo: descobriu-se que Jamil advoga para casas de bingo e caça-níqueis, e apareceram novas anotações. Em uma delas consta PFSP e, ao lado, o valor de R$ 35 mil. O Ministério Público quer saber se essa sigla corresponde, na contabilidade do advogado, à Polícia Federal de São Paulo. Aparecem também anotados Decap (R$ 5 mil) e Deic (R$ 17 mil), siglas de órgãos da Polícia Civil. É nisso tudo que deu a suspeita batida de Jamil.