A paulista Piracicaba ganhou fama nacional pela sua pamonha – “o puro creme do milho verde” –, pelo rio que lhe empresta o nome, cantado por Tião Carreiro e sua viola caipira, e pela excelência de ensino da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq). Mas a cidade, distante 160 quilômetros da capital, quer muito mais e já caminha para se transformar em cidade-modelo, utilizando conceitos modernos como o planejamento estratégico. Mandamento-chave nas grandes empresas, a elaboração de planos de desenvolvimento com metas de longo prazo nunca fez parte da administração pública, acostumada a mudar as prioridades de acordo com as trocas de governo. O pontapé inicial da mudança foi dado em 2000 por executivos da americana Caterpillar, maior empregadora da cidade, junto com 450 entidades da sociedade civil em torno do projeto Piracicaba 2010. “Nós queremos que a sociedade seja mais participativa e tenha o poder de influenciar os projetos e a administração pública”, diz João Carlos Maranha, secretário-geral do Piracicaba 2010.

A idéia, que se transformou em uma ONG, envolve uma infinidade de áreas e projetos, que vão desde estudos sobre obras vultosas, como o anel viário da cidade, até pequenas iniciativas, como a que obriga profissionais da área de saúde a fazer cursos de reciclagem. O atual prefeito, Barjas Negri (PSDB), ressalta o fato de o Piracicaba 2010 não ser antagônico, mas complementar ao poder público. “A participação das ONGs no debate público funciona como instrumento de mobilização”, diz ele. Fazer com que as pessoas entendam a natureza do projeto e a falta de recursos ainda são os dois principais obstáculos.

A revitalização da rua do Porto, às margens do rio Piracicaba, foi o primeiro grande projeto do 2010, e o melhor exemplo de que o programa é viável. Há dois anos, o então prefeito José Machado (PT) conseguiu patrocínio de R$ 4 milhões da Petrobras. “Queríamos requalificar a relação da cidade com o rio e promover sua reaproximação física e subjetiva com as pessoas”, afirma o arquiteto do projeto, Fábio Rolim. No lugar do antigo barranco, agora erguem-se uma pequena pista de caminhada feita de brita, decks em que repousam mesas e cadeiras e um caminho de cimento que avança sobre o rio, onde tranqüilos habitantes se reúnem para pescar. A obra foi pautada pelo respeito ao meio ambiente e obedeceu às diretrizes de um estudo de três anos realizado pela Esalq. A reforma levou nove meses e trouxe de volta o piracicabano aos bares e restaurantes à beira do rio.

A alguns metros do belo casarão em estilo neoclássico da sede da Esalq, no campus universitário, uma sinuosa passarela liga a rua a uma construção de tijolinho aparente. Lá funcionará a Casa do Produtor Rural na Esalq, uma parceria entre a faculdade e o Piracicaba 2010. Prestes a abrir as portas, a Casa será mais uma aliada do agricultor familiar, trazendo informações técnicas de parceiros como o Banco do Brasil, o Sebrae e o Ministério da Agricultura. “O principal é articular as diferentes instituições em um só lugar. Isso economiza recursos financeiros e humanos e potencializa o conhecimento”, diz Marly Pereira, professora da Esalq e responsável pela área de agricultura. Mas nem tudo dá certo. Há um ano, um dos principais projetos na área de saúde está paralisado por falta de verbas. O que seria o maior pronto-socorro da cidade espera por aparelhos e pessoal para entrar em funcionamento. É nessa luta para “aumentar o cobertor” que a sociedade civil de Piracicaba pretende transformar a cidade da pamonha do milho verde em parâmetro nacional de qualidade de vida.