ciencia_cacador_01.jpg

 

Nascido no principado de Liechtenstein, o paleontólogo Alexander Kellner poderia ter seguido carreira em qualquer das grandes universidades européias, mas trocou a rotina das salas de aula pela aventura nos lugares mais inóspitos do planeta. Naturalizado brasileiro e funcionário do Museu Nacional do Rio de Janeiro, Kellner, 44 anos, encontrou vestígios dos gigantes pré-históricos no Brasil, no Chile, na China e no Irã que resultaram na classificação de 22 novas espécies. “Passei por situações dramáticas para encontrar esses fósseis”, conta. Mas nenhum de seus achados é tão importante quanto o que será anunciado nos próximos meses pela conceituada revista Nature. Uma cláusula de exclusividade proíbe Kellner de antecipar o nome do animal, mas sabe-se que é um novo pterossauro – réptil alado que chegava a cinco metros de comprimento e que habitou a China e o Brasil há cerca de 65 milhões de anos.

Conhecidos por suas enormes cristas, os pterossauros são um desafio às leis da aerodinâmica. O Tapejara imperator, por exemplo, tinha uma crista que aumentava em seis vezes a área de seu cérebro. “Ninguém sabe como ele conseguia voar”, diz. Descoberto por Kellner há quatro anos, o Thalassodromeus sethi tinha outra dificuldade – sustentar uma crista de osso sobre a cabeça. “Ela o obrigava a fazer mais esforço para sair do chão.” Esses animais viviam na Chapada do Araripe, região que fica na divisa entre Ceará, Piauí e Pernambuco, que é considerada uma das áreas mais férteis em fósseis do período mesozóico – período que teve início há 225 milhões de anos e acabou 65 milhões de anos atrás com a extinção dos dinossauros. “Ali os fósseis estão bem preservados graças às formações rochosas da região que não comprimiam os animais.”

ciencia_cacador_02.jpg

 

A análise das duas espécies brasileiras fez com que Kellner elaborasse uma nova teoria sobre a serventia das cristas. Ricas em vasos sangüíneos próximos à epiderme, elas permitiam a troca de calor entre o sangue e o ar, regulando a temperatura corpórea. Essa tese ganhou reforço com um outro estudo da biofísica americana Jamie Gillooly, da Universidade da Flórida, em Gainsville. Ao contrário do que se imaginava, Gillooly descobriu que nem todos os dinossauros tinham o sangue frio. As espécies de grande e médio porte se comportavam como mamíferos, cuja temperatura corpórea é constante girando em torno dos 36 graus Celsius. “Quanto maior, mais quente”, diz a especialista. Apenas os menores, como os répteis primitivos, mantinham o sangue a baixas temperaturas graças a mecanismos de resfriamento, a exemplo do que poderia acontecer com os pterossauros.

O anúncio da espécie desenterrada na China é uma nova peça desse quebra-cabeça. As escavações duraram cerca de três anos e Kellner fez parte da equipe liderada por paleontólogos da Academia Chinesa de Ciências, em Liaoning. O perfil do novo membro da família dos pterossauros o ajudará a avançar na teoria que tenta explicar como esses répteis voadores se extinguiram há cerca de 65 milhões de anos. Segundo Kellner, existiam na China duas espécies distintas: os confuciosornis e os pterossauros. Os primeiros viviam nas áreas litorâneas, enquanto seus rivais dominavam o interior do continente. “Há chances de que a competição entre eles possa ter levado os pterossauros a desaparecer”, explica. “Mas ainda não conseguimos provar.”