16/08/2006 - 10:00
Mário Jorge Lobo Zagallo desempregado é uma imagem quase tão inacreditável quanto a de uma Copa do Mundo sem o Brasil. Mas é um fato consumado. Aos 75 anos, completados na quarta-feira 9 de agosto, dois terços deles dedicados à “amarelinha”, o “Velho Lobo” Zagallo, como é chamado, é uma lenda do futebol brasileiro à procura de uma nova oportunidade – até porque se recusa a pendurar as chuteiras. Único tetracampeão mundial de futebol (1958 e 1962 como jogador, 1970 na função de técnico e 1994 na coordenação técnica), esse alagoano criado no Rio de Janeiro perdeu na Confederação Brasileira de Futebol (CBF) uma cadeira que era tida como cativa.
Debilitado após uma cirurgia no duodeno, no ano passado, ele completou seu inferno astral com a eliminação precoce do Brasil da Copa da Alemanha e seu posterior afastamento do cargo de coordenador técnico da equipe. “O presidente Ricardo Teixeira me disse que precisava dar uma resposta, mudar a cara da Seleção e, pelo jeito, uma cara nova, uma renovação, não me inclui”, lamenta. “Qualquer coisa me interessa”, avisa logo Zagallo, que comemorou os 75 anos sem nenhuma proposta no horizonte. Não foi chamado tampouco por seu ex-companheiro e amigo Carlos Alberto Parreira, em sua nova aventura internacional: treinar a seleção da África do Sul, sede da Copa de 2010. Nem iria. “Descarto sair do Brasil”, diz o homem que, num desabafo contra seus críticos, celebrizou a frase: “Vocês vão ter que me engolir.”
Não queria sair. Fiquei surpreendido, pensei mesmo que fosse continuar. Normalmente quando se perde uma Copa, há uma mudança, mas esperava que continuassem contando comigo. Disse mais de uma vez, antes mesmo de a Copa terminar, que gostaria de prosseguir, tinha ainda o que fazer pela amarelinha.
Por mim, eu continuaria como coordenador técnico – mesmo do Dunga, eu não me incomodaria. Sou grato ao presidente Ricardo Teixeira por ele ter acreditado em mim, mesmo com a idade avançada que tenho. Mas o presidente me disse que precisava dar uma resposta, mudar a cara da Seleção e, pelo jeito, uma cara nova, uma renovação, não me inclui. Não me aposentei, mas vou ficar dois meses sem pensar em nada. Depois vejo o que vai pintar, qualquer coisa me interessa. Não tenho nada em mente e nenhum convite. Não consigo ficar parado, não gosto dessa vida de ficar na varanda de casa. Só descarto sair do Brasil. O fato é que não estou mais no comando.
Ele comentou isso por alto, mas não sei que cargo seria.
Ele nunca foi técnico, é o que todos repetem, mas temos bons exemplos aqui dentro, como o Falcão, e lá fora, como o (Jürgen) Klinsmann e o (Marco) Van Basten, que treinaram Alemanha e Holanda na última Copa do Mundo. Já que o presidente (Teixeira) optou por isso, vamos esperar. A gente só pode julgá-lo depois que ele começar o seu trabalho. Ele pode dar conta do recado. E eu torço por ele.
Era por aí mesmo, não daria para fazer uma Seleção só com jogadores que atuam no Brasil, não haveria nem tempo de treinamento para isso. A verdade é que ele não pode mudar tudo de cara, mas tem que se preocupar com aqueles jogadores que serviram à Seleção, mas estão com idade avançada batendo os 35… 36… 37 anos. O Cafu terá 40 anos na próxima Copa. Vão ter que parar, todo mundo pára um dia. Saber sair faz parte do futebol.
Temos que superar tudo na vida. Essas coisas machucam, mas a gente supera. Tem que deixar o que aconteceu para trás.
Deixo mais coisas positivas do que negativas, acertei mais do que errei. Boas lembranças e esperança. Quatro títulos mundiais, muitos campeonatos, torneios, uma infinidade de conquistas. Mas ninguém ganha nada sozinho. Divido cada título com minha equipe.
Pelo que está na boca do povo. E nada está mais na boca do povo do que a Seleção tricampeã do mundo em 1970 (quando foi técnico). Foi a melhor Seleção que o País já teve justamente porque foi vitoriosa jogando bonito. Não adianta apontar outra seleção que não ganhou ou não jogou bonito. Resultado é importante – e jogar bonito também.
Acho que nós ganhamos demais antes da Copa. Ficamos em primeiro nas Eliminatórias, vencemos a Copa América, fizemos uma exibição de gala na
Copa das Confederações, um futebol digno de ser visto. O grupo era o mesmo que acabaria indo à Copa. Mas futebol é esse clichê mesmo, uma caixinha de surpresas. Fomos para a Copa como favoritos absolutos. Nós da comissão técnica nunca admitimos isso, batemos o pé para enfrentar esse favoritismo, para tirar isso da cabeça dos jogadores. Se conseguimos ou não, não sei.
Não foi ali contra a França que nós perdemos a Copa, ali nós fomos eliminados. Começamos mal e seguimos mal na competição. Perdemos pelo conjunto da obra. Jogamos mal contra a Croácia, contra a Austrália e só praticamos o legítimo futebol brasileiro contra o Japão (o Brasil venceu por 4 x 1, de virada), ainda assim com todas aquelas alterações. Contra o Japão, tomamos o primeiro gol, mas tínhamos a certeza de que venceríamos. Contra Gana, para mim, foi o pior jogo, embora tenhamos vencido (3 x 0). Ganhamos apenas porque aproveitamos as chances, mas eles fizeram muito mais do que nós. Ali pintou um pressentimento.
Eu não demonstrava isso para ninguém, mas no meu interior eu sabia que as coisas não iam bem. O incrível é que o ambiente de trabalho estava excelente, não havia brigas no grupo nem desunião. Eu torci para pegarmos a França (nas quartas-de-final) justamente porque o time deles só tinha se classificado no último jogo da primeira fase, com um futebol vacilante. Mas aí veio o jogo e não jogamos nada contra a França.
A verdade é que não existe uma explicação que me convença. Todo mundo ali queria ganhar. Porque jogamos daquele jeito é algo inexplicável. Não é que faltou amor à camisa, como dizem, isso todos eles têm. Só que a coisa não deu certo, não funcionou. Copa é momento. Não foi o Brasil que jogou aquela Copa. O pior é que, revendo os jogos e o time que foi campeão, fica uma certeza: essa era para ter sido nossa Copa. Tinha tudo para ter sido o hexa.
Não foi uma boa Copa. Para se ter uma idéia, não teve nenhum jogador que se destacasse, nenhum garoto novo aparecendo. Tanto que foi escolhido como melhor da Copa o (francês Zinedine) Zidane. Por aí se vê o que foi essa Copa. São coisas que acontecem, não quer dizer que o bom futebol esteja morrendo.
Sobre isso falam muita coisa, mas o fato é que Ronaldo ficou parado por causa de um estiramento e engordou. E acabou alcançando o peso dele durante os jogos. Não foi por isso que o Brasil perdeu a Copa.
Isso é invenção! É o outro lado querendo aparecer. Garanto que nenhum jogador saiu da concentração. Agora, na hora da folga cada um faz o que quiser. Uns fazem compras, outros… (risos). Veja o caso do Real Madrid, cheio de jogadores brasileiros, todos solteiros. Quem vai segurar esses caras?
Tudo foi feito antes da Copa. Durante a Copa isso não existiu.
De madrugada nunca foi feito nada. Toda entrevista era dada na concentração, dentro do horário normal. O que aparecia no Brasil era gravação. Entrevista de madrugada nunca houve.
Posso dizer que o Parreira treinava esse tipo de lance todos os dias, repito, todos os dias, com faltas contra e a favor do Brasil. Sabíamos que, dependendo do local, o lance pode ser decisivo. Aí veio o jogo da França. O Henry fez o gol e todos ficam olhando onde estava o Roberto Carlos. Acontece que não era ele quem havia treinado e estava escalado para estar ali, dentro da área, na cola do Henry, até porque é mais alto que o Roberto. Não vou dizer quem era esse jogador de defesa, mas não era o Roberto Carlos quem deveria ter marcado a chegada do Henry. Ele devia estar ali.
Não poderia ter acontecido aquilo, mas o cara provocou. Zidane, infelizmente, entrou na do italiano. Um jogador experiente como Zidane não pode perder a cabeça assim.
É um clima mais quente, acho que o Brasil tem condições.