O presidente da Companhia Vale do Rio Doce, Roger Agnelli, roubou a festa de André Lara Resende, eleito o Economista do Ano pelos colegas de profissão. Na festa de premiação, na noite da terça-feira 15, ele esbanjou sorrisos e foi assediado por jornalistas, executivos e investidores. Um deles, feliz com o desempenho das ações (alta de 507% em cinco anos, mais de três vezes o retorno médio da Bolsa de Valores), pediu para ser fotografado ao seu lado. Agnelli fez pose e não se conteve quando um dos homens de negócio mais poderosos do País passou por eles:
– Tá vendo, seu Brandão? Tá vendo? – brincou com o presidente do Conselho de Administração do Bradesco, Lázaro de Almeida Brandão, seu ex-chefe. Explique-se: egresso da diretoria do Bradesco, Agnelli, mesmo na Vale, sonha em ser presidente do maior banco privado brasileiro.
Cinco anos atrás, Agnelli interrompeu sua carreira na lendária Cidade de Deus, em Osasco (SP), e mudou-se para a cidade do Rio de Janeiro. É de lá que ele comanda a maior mineradora da América Latina em um dos momentos mais decisivos da sua história. Hoje, o principal desafio dos dirigentes da Vale é reforçar a musculatura de uma gigante que lidera o mercado internacional de minério de ferro, mas precisa crescer ainda mais para competir no mundo globalizado com as três únicas concorrentes maiores do que ela. O Brasil ficou pequeno demais para a Vale. O que fazer quando as fronteiras ficam muito próximas?

A ousada resposta seguiu para o Canadá, no fim de semana passado, nas pastas dos diretores da Vale Murilo Ferreira e Gabriel Stoliar: uma oferta de compra da Inco, segunda maior produtora de níquel do planeta, por nada menos que US$ 17,7 bilhões. Eles seguiram para Toronto e Otawa para formalizar a proposta e tranqüilizar as autoridades canadenses quanto à manutenção de empregos, respeito aos direitos trabalhistas e investimentos no país. Se aceita, será a maior aquisição de uma empresa este ano em todo o mundo, depois da compra da Arcelor pela Mittal Steel, por US$ 33 bilhões. Com a tacada, Agnelli pretende alçar a Vale à condição de segunda maior mineradora do mundo, atrás apenas da australiana BHP Billiton.

A Inco é uma empresa de tradição centenária na exploração de níquel, área em que a Vale mal começou a atuar e que considera estratégica para diversificar sua produção. Se Agnelli acertar o alvo, a Vale poderá em poucos anos dominar o mercado de níquel, metal usado na fabricação de aço inox e cuja cotação chegou a US$ 27 mil por tonelada na semana passada. Em 2005, o preço médio foi de US$ 14,7 mil. “Os ativos de mineração estão muito valorizados pela demanda mundial, especialmente por parte da China e da Índia”, observa o economista Cláudio Frischtak, especialista no setor.

Desde 2000, a Vale já exportou US$ 31 bilhões, investiu US$ 14 bilhões e gastou US$ 5,6 bilhões em aquisições. Mesmo assim, 98% de seus ativos estão localizados no Brasil. Com a aquisição da Inco, que tem operações em vários países, essa fatia seria reduzida para 60% e a base geográfica seria ampliada para a América do Norte (27%), a Ásia (5%), a Europa (3%) e outras regiões. Ou seja: sua vocação de empresa global seria reforçada em curto prazo. “Para participar deste jogo é preciso ter escala global, diversificação e presença internacional”, afirma Frischtak.
O problema é que a Vale entrou na disputa pela Inco com duas outras concorrentes de peso, a canadense Teck Cominco e a americana Phelps Dodge. A Teck Cominco ofereceu US$ 17,7 bilhões, dos quais 50% seriam pagos em dinheiro e 50%, em ações. Como a proposta da Vale contempla 100% do pagamento em dinheiro e a empresa canadense não conseguiu financiamento para melhorar a sua oferta, acabou saindo do páreo.

Na quarta-feira 16, Roger Agnelli acabara de presidir a reunião do Conselho Empresarial Brasil-China, em São Paulo, quando recebeu a boa notícia. As ações da Vale, que haviam caído quase 5% diante da perspectiva de aumento brutal do endividamento (os US$ 17,7 bilhões serão emprestados por bancos) e de uma guerra de ofertas com a Teck Cominco, voltaram a subir. Ele comemorou com discrição. Os acionistas da Inco ainda têm na mesa a oferta de US$ 15,7 bilhões feita pela Phelps Dodge. É uma proposta pior que a da Vale. Além do valor menor, somente 25% seriam pagos em dinheiro. Mas, como as negociações ainda estão abertas, tudo é possível. “Estamos tranqüilos, serenos e seguros”, diz Agnelli. “É um jogo de paciência.” Paciência e, claro, muitos bilhões de dólares para investir.