ALÍVIO Ao lado, criança com queimadura se distrai na hora do curativo. No game acima, heroína destrói célula tumoral

Na busca por maneiras criativas de prevenir e tratar doenças, a medicina está se voltando para o mundo virtual dos jogos eletrônicos. Eles estão se tornando importantes aliados, principalmente no tratamento de crianças. Os jogos acabam sendo uma maneira divertida de informar e tratar os pequenos. Algo como uma gostosa brincadeira, mas com objetivo terapêutico. Os resultados têm sido animadores.

Duas iniciativas bem-sucedidas foram divulgadas na última semana. A primeira é do Hospital Infantil Nationwide, nos Estados Unidos. Lá, médicos e enfermeiros estão recorrendo a um game na hora da troca de roupa ou de fazer curativos em crianças vítimas de queimaduras. Este é um dos momentos mais sofridos do tratamento porque causa dor extrema. Para tentar atenuar a sensação, os profissionais usavam vários expedientes de distração. Entre eles, música e livros. Mas nenhum teve eficácia tão grande quanto o jogo eletrônico, introduzido em maio. Durante o procedimento, a criança veste um desses “capacetes” típicos de jogos eletrônicos e mergulha num mundo virtual. Os médicos constataram que o recurso ajuda a diminuir a ansiedade dos pequenos, resultando em menor sofrimento. “Sabe-se que há uma forte ligação entre ansiedade e dor. Portanto, distrair os pacientes contribui para que as intervenções sejam menos dolorosas”, explica a psicóloga Catherine Butz, coordenadora do programa no hospital americano.


AÇÃO NO CÉREBRO Em Uganda, vítimas de paralisia cerebral causada pela malária usam jogo eletrônico criado nos EUA. O game melhora o raciocínio, a memória e auto-estima dos pacientes

O outro trabalho que mereceu destaque é o que está sendo realizado em Uganda, com portadores de paralisia cerebral provocada pela malária – uma das mais graves formas da doença, responsável por sérias lesões no cérebro. Cientistas da Universidade de Michigan (EUA) estão utilizando um game batizado de Captain’s Log para melhorar a capacidade cognitiva, a coordenação motora e a atenção dos pacientes, entre outros objetivos. “O jogo também contribui para melhorar a auto-estima e o autocontrole desses indivíduos”, afirma o professor de neurologia Michael Boivin, um dos responsáveis pelo projeto.

Muito do sucesso da estratégia de usar os games vem do fato de os jogadores – as crianças, em especial – ficarem tão entusiasmadas que não desistem de continuar a prática. Um bom exemplo disso é a adesão que o jogo Re-Mission vem obtendo. O game foi criado para jovens com câncer. Os usuários têm de guiar uma robô, chamada de Roxxi, em sua luta para destruir células cancerosas, acabar com bactérias oportunistas que minam as defesas do doente virtual e auxiliá-lo a lidar com os efeitos colaterais da quimioterapia. Em uma pesquisa realizada pela HopeLab – organização sem fins lucrativos idealizadora do jogo – os jogadores incluíram o Re-Mission em suas rotinas e, como conseqüência, apresentaram maior aderência ao tratamento, melhor conhecimento sobre a doença e mais qualidade de vida.

Animados com esse tipo de resultado, os cientistas começam a ampliar as ofertas dessa espécie de “gameterapia” para os adultos. Na Universidade McGill, no Canadá, um grupo de pesquisadores desenvolveu um videogame para melhorar as respostas dos indivíduos a situações estressantes. Uma das tarefas é marcar o maior número de ícones representando sorrisos dentro do menor tempo possível. Segundo os criadores, por meio desse tipo de desafio é possível treinar a mente para observar mais o lado positivo do que o negativo de circunstâncias carregadas de stress. Em um trabalho realizado com trabalhadores de Montreal, os cientistas observaram que os participantes que jogaram apresentaram uma redução de 17% no nível de cortisol, hormônio relacionado ao stress, em comparação aos que não usaram o game. A experiência está relatada na edição deste mês do Journal of Personality and Social Psychology, órgão da Associação Americana de Psicologia.