Vencedor deste ano da disputada categoria de não-ficção do prêmio Pulitzer “A Sexta Extinção” foi um dos livros que Barack Obama apertou na sua mala de viagem de férias no mês passado – talvez tenha sido o mais trágico e muito provavelmente o mais interessante dos volumes que levou. Escrito pela jornalista americana Elizabeth Kolbert, que já tinha dois National Magazine Award por publicações sobre o clima, narra de forma magistral a maneira com que o ser humano está prestes a finalizar a sua mais eficiente atuação desde que existe como espécie no planeta: o extermínio da vida.

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VÍTIMAS
O fotógrafo Kerstin Lengen chocou o mundo com a imagem de um
urso polar famélico. Livro mostra que quase toda a vida no
globo está em vias de ser extinta

Kolberth reuniu uma série de reportagens e entrevistas que lhe consumiram semanas em áreas de pesquisa e preservação com cientistas para construir o volume que muda o ângulo de visão das preocupações com o clima – uma das bandeiras do presidente dos Estados Unidos. Ela esteve nas principais instituições dedicadas ao ramo relativamente novo da ciência dedicado à extinção. Usando como pretexto algumas formas de vida erradicadas do globo – para manter uma coluna vertebral evolutiva –, ela articula nos 13 capítulos (com certo humor) as formas como o homem exterminou quase tudo o que foi vital para que ele próprio pudesse se estabelecer como espécie. Quase como um suicídio programado, de maneira infantilmente inconsciente. “Estamos arriscando o nosso futuro ao alterar fundamentalmente a integridade do equilíbrio climático que tem persistido em mais ou menos a mesma configuração desde o fim da última idade do gelo, e que fomentou o florescimento da civilização humana”, escreve a autora.

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ALGOZES
Para a escritora Elizabeth Kolbert, o homem contemporâneo é testemunha
e causador de um dos eventos mais raros da história da vida, o seu fim

Para além das conclusões apocalípticas, a jornalista coloca um prisma curioso sobre a história da ciência. Nem o deus dos cientistas é poupado da revisão de Kolberth que mostra o constrangimento de Charles Darwin quando em 1848 se descobriu que o Hommo sapiens (o que somos) teria se relacionado, se reproduzido e depois exterminado o homem de Neandertal. O texto mostra que não são poucos os indícios genéticos que levam a acreditar que os neandertais foram uma espécie mais amistosa e pacífica do que alguns de nós, que carregamos até 4 % de seus genes. “Assassinamos a nossa própria árvore genealógica. Após exteminar nossas espécies-irmãs (os homens de Neandertal e os hominídeos de Denisova, há muitas gerações), agora estamos fazendo o mesmo com os nossos primos de primeiro e segundo graus.”

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De maneira secundária, mas não menos embasada, o livro se dedica a quebrar alguns mitos ambientais, como o de que as regiões polares seriam mais impactadas pelo aquecimento global do que os trópicos. Segundo a apuração de Kolberth, nesse item, a tendência é inversa. A narrativa foi batizada de “Sexta Extinção” porque o planeta já atravessou outros cinco extermínios em massa de espécies, mas por razões naturais. A “mais recente e famosa” foi a que acabou com a população de dinossauros. De acordo com as fontes da jornalista, a que estamos vivendo hoje deverá ser mais devastadora que aquela. “Nós que vivemos hoje em dia somos não apenas testemunhas de um dos eventos mais raros na história da vida, mas também seu causador”, diz ela.

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Fotos: Kerstin Langenberger, Rogério Reis / Tyba; Holger Neumann