Lenta a Justiça sempre foi. Em São Paulo, parou de vez. Com a greve dos serventuários, que já dura dois meses, o caos se estabeleceu no Judiciário do Estado. Nada indica que o impasse entre os grevistas e o presidente do Tribunal de Justiça, desembargador Márcio Martins Bonilha, esteja no fim. Eles prometem não dar trégua enquanto as reivindicações não forem atendidas. Estão parados 52 mil funcionários – 42.800 na ativa e 9.200 aposentados. A paralisação tem a adesão de 80% dos servidores, e as reivindicações são: reposição de 54% e melhores condições de trabalho – faltam computadores, impressoras, água e até papel higiênico nos fóruns. Esta é a mais longa greve do Judiciário paulista. A média salarial dos serventuários gira em torno de R$ 1 mil. Márcio Bonilha ofereceu gratificação extraordinária de R$ 150 a ser paga em fevereiro e apresentou de um projeto de lei contendo o plano de cargo, carreiras, vencimentos e salários a ser encaminhado à Assembléia Legislativa, em janeiro de 2002. Os funcionários rejeitaram a oferta. “Não queremos esmola, queremos o cumprimento do artigo 37 da Constituição, que garante reposição salarial anual, e isso não acontece há sete anos”, pleiteou um dos líderes do movimento durante manifestação no centro de São Paulo, na quarta-feira 24.

A impossibilidade de reajuste, segundo Bonilha, decorre da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), que limita os gastos com a folha de pagamento. “Estamos no limite do permitido. Estou impossibilitado de atender as reivindicações. Não é intransigência minha”, explicou o desembargador. Segundo Bonilha, o único fato novo que pode fazer avançar as negociações seria uma alteração na proposta orçamentária do Judiciário. Sua tramitação está suspensa, por decisão liminar, na Assembléia Legislativa desde o dia 16. O órgão especial havia proposto orçamento de R$ 2,72 bilhões para 2002, mas o Executivo cortou R$ 627,28 milhões. A iniciativa resultou num mandado de segurança, impetrado pelo desembargador Luiz Pantaleão. Na decisão do primeiro vice-presidente do TJ, desembargador Álvaro Lazzarini, o ato “lesou irremediavelmente os interesses do Judiciário de modo inconstitucional, abusivo e ilegal”. A decisão foi parar no Supremo, que deve dar ganho de causa ao Judiciário.

O presidente da OAB-SP, Carlos Miguel Aidar, sustenta que a LRF da forma que está não serve para o Judiciário paulista: “Aqui está o maior número de processos, de juízes e de funcionários. Portanto, São Paulo não pode ser tratado da mesma forma que os demais Estados”. Já o jurista Damásio de Jesus prefere um outro argumento. “A lei ordinária (a LRF) não pode prevalecer sobre a Constituição, que assegura o reajuste anual dos salários.” A greve também expôs divisões internas do TJ. Alguns desembargadores têm recebido as lideranças sindicais, acenado com promessas. “Quem faz cortesia com dinheiro público ao arrepio da lei está fazendo demagogia. Não temos recursos para atender às reivindicações “, diz Bonilha.

Para poder trabalhar, funcionários levavam para as repartições seus próprios computadores, impressoras, mesas e até fogão. Os serventuários culpam Bonilha pela paralisação e atacam: “Os vencimentos dos juízes e dos desembargadores foram reajustados em 38,64% em fevereiro de 2000. Eles receberam, retroativamente, férias e licença-prêmio”, calculou Dayse Bernardi, membro da comissão de negociação. “Não é verdade. O ano passado o governo concedeu uma suplementação que foi objeto de pagamento de todos os pedidos pendentes de férias atrasadas e licença-prêmio. Todo servidor que formulou o pedido nesse sentido foi atendido. O que ocorreu foi um pagamento maciço de débitos judiciais oriundos de administrações anteriores”, rebateu o desembargador. Segundo ele, os servidores tiveram um aumento, nos últimos seis anos, de 64,71% nas gratificações fora a concessão do último abono que deu margem a um acréscimo salarial em média de 13,15%. “As categorias inferiores receberam 20,5%”, contabilizou. “A situação é grave. Um servidor se matou porque estava sendo pressionado por agiotas e outro morreu de enfarte”, contou Ivone Moreira, presidente da Associação dos Oficiais de Justiça. A falta de consenso pôs fim à comissão de negociação e o impasse chegou ao órgão especial. Os grevistas querem que ele faça valer a Constituição.

Colaborou Mário Simas Filho (SP)

Novas propostas

Inês Garçoni

O Ministério da Educação e o sindicato que representa os professores das universidades e escolas técnicas federais (Andes), começam a falar a mesma língua. A categoria está em greve há mais de dois meses, período em que os dois lados tiveram apenas seis reuniões para negociação. A paralisação deixou 500 mil alunos das 52 instituições federais sem aulas e ainda suspendeu o vestibular na UFF e na UFRJ, no Rio. Na reunião de quarta-feira 25, o MEC ampliou o leque de propostas, apoiado por deputados do governo e da oposição: reajustar a Gratificação de Estímulo à Docência (GED) em 30%, incorporar a Gratificação de Atividade Executiva (GAE) aos salários-base, realizar concurso público já em 2002 e estender em 60% a Gratificação de Incentivo à Docência (GID) aos inativos e pensionistas, entre outras coisas. No mesmo dia, os parlamentares se dispuseram a alocar R$ 350 milhões do Orçamento para cobrir a pauta dos professores, R$ 100 milhões a mais do que tinham sugerido de início. “Com este montante dá para avançar bastante”, diz Roberto Leher, presidente do Andes. Para o diretor de Política do Ensino Superior, Luís Roberto Curi, a proposta representa “nossa flexibilidade em relação ao Andes”. No entanto, há um objetivo do qual o ministro Paulo Renato Souza não abre mão: os docentes devem voltar ao trabalho ainda este mês. Caso contrário, “o Ministério não terá como pagar os salários de outubro”, como explica a nota do MEC enviada à imprensa.