Com sua língua presa, mas sempre venenosa, o atacante Romário afirmou recentemente que, se fosse torcedor, não pagaria de jeito nenhum R$ 10 ou R$ 15 para assistir, das arquibancadas, aos jogos da Seleção ou do Campeonato Brasileiro. “Doizinho (R$ 2), talvez”, fuzilou. Uma onda de livros sobre futebol, entre eles Os cabeças-de-bagre também merecem o paraíso (Objetiva, 156 págs., R$ 21,90) e Divino – a vida e a arte de Ademir da Guia (Gryphus, 218 págs., R$ 29), de Kleber Mazziero de Souza, oferece boas alternativas para os apaixonados que, a exemplo do artilheiro, não suportam mais as pancadas, carrinhos e passes errados distribuídos por brucutus entrincheirados em grandes equipes. Esses textos desenterram histórias impagáveis, retratam paixões, radiografam craques e resgatam partidas memoráveis dos tempos em que jogada monumental ainda era entendida como um negócio feito pelo ídolo nos limites do campo.

Nessa tabelinha entre futebol e literatura há lances ambiciosos, como o projeto Camisa 13, lançado na terça 23 pela editora DBA e a empresa de entretenimento Geração Conteúdo. Eles gastaram R$ 350 mil em cachês pagos a 13 craques do mercado editorial, contratados para escrever sobre seus times. O primeiro da série, O vermelho e o negro – uma pequena grande história do Flamengo (DBA, 220 págs., R$ 32), previsto para novembro, traz o olhar do escritor e jornalista Ruy Castro sobre o clube mais popular do País. Serão reveladas boas histórias sobre a fundação do clube em 1895, uma resposta de rapazes do bairro carioca do Flamengo aos remadores do Botafogo que conquistavam suas vizinhas. “O texto passeia por um século de vitórias e derrotas e chega ao tricampeonato carioca de 1999/2000/2001, com gols fantásticos sobre o Vasco”, provoca o autor.

Tramas interessantes – Em dezembro, José Roberto Torero colocará em campo o seu Dicionário santista de A a Z, sem X. Em seguida virão, um a cada mês, os livros do Corinthians (Washington Olivetto e Nirlando Beirão), Bahia (Bob Fernandes), Vasco (Aldir Blanc), Cruzeiro (Jorge Santana), Atlético Mineiro (Roberto Drummond), Internacional (Luis Fernando Verissimo), Grêmio (Eduardo Bueno), Palmeiras (Mário Prata), São Paulo (Alberto Helena Jr.), Fluminense (Nelson Motta) e Botafogo (Sergio Augusto). Alguns autores bolaram tramas interessantes. Mário Prata, que passou a se interessar pelo Palmeiras quando seu amigo de infância Leivinha foi para o clube, criou um protagonista corintiano que finge ser palmeirense para agradar o pai da nova namorada. “O cara vai estudar a história do Palmeiras para encarar o sogro. Nesse ponto, usarei informações verdadeiras para enriquecer a ficção”, adianta ele. A tiragem inicial de cada livro será de cinco mil exemplares.

Outras jogadas de classe foram feitas pelo mercado. No mesmo dia do lançamento do Camisa 13, o santista Torero voltou para o segundo tempo e lançou Os cabeças-de-bagres também merecem o paraíso, seleção de crônicas publicadas na imprensa, classificada como “gol de letras” pelo colunista e ex-jogador Tostão. Entre elas, a dos irmãos siameses que “formavam” um ótimo zagueiro e foram separados é de arrancar gargalhadas. Outro excelente livro do gênero é O gol é necessário (Civilização Brasileira, 100 págs., R$ 15). São textos do escritor, poeta, tradutor e botafoguense roxo Paulo Mendes Campos organizados pelo jornalista Flávio Pinheiro. Mas o jogo está longe do fim. Vicente Matheus: quem sai na chuva é pra se queimar (Editora do Brasil, 303 págs., R$ 23,90), do jornalista Luiz Carlos Ramos, se revela uma eficiente biografia que mostra os bastidores da relação apaixonada do dirigente com o Corinthians. Reúne dezenas de frases que construíram a imagem folclórica de Matheus. Além daquela que faz parte do título, sobre a difícil tarefa de dirigir o Corinthians, estão lá as deliciosas “Haja o que hajar, o Corinthians será campeão”, disparada em 1977, e “Sócrates é invendável e imprestável”, de 1980.

Príncipe etíope – Outra biografia com alta carga de emoção é Divino – a vida e a arte de Ademir da Guia, retrato bem construído do maior ídolo da história do Palmeiras. Na primeira quinzena de dezembro, a editora Relume-Dumará promete colocar nas lojas a biografia de outro gênio, o “príncipe etíope” Didi, escrita pelo jornalista Roberto Porto para a série Perfis do Rio. Interessados em textos mais cabeça sobre o esporte estão igualmente bem servidos com Footballmania – uma história social do futebol no Rio de Janeiro (1902-1938) (Nova Fronteira, 376 págs., R$ 29), do historiador Leonardo de Miranda Pereira, e No país do futebol (Jorge Zahar, 82 págs., R$ 14), do antropólogo Luiz Henrique de Toledo. No interessante O futebol em Nelson Rodrigues (Educ, 218 págs., R$ 20), o pesquisador José Carlos Marques defende a tese de que existe uma construção literária “relacionada ao barroco latino-americano” nas crônicas esportivas do dramaturgo. Diante de tantas opções, não seria má idéia colocar um desses livros ao lado do controle remoto nas noites de quarta-feira e nas tardes de sábado e domingo. Na primeira tesoura voadora de um volante brutamontes, o telespectador desliga a telinha, vira leitor e mergulha no sonho.