24/01/2001 - 10:00
Desde 1971, o Fórum Econômico Mundial, organizado por uma fundação suíça cujos membros são as “mil mais influentes empresas globais”, tem promovido a cada final de janeiro suas reuniões em Davos, Suíça, onde a cúpula dos negócios e das finanças mundiais se encontra para discutir reflexões teóricas sobre a globalização e formular estratégias práticas para conduzi-la. Nos primeiros 30 anos de sua existência, o Fórum de Davos teve um papel importante na ascensão do neoliberalismo e na formulação de regras que hoje estão sendo impostas não só ao comércio internacional como à política interna dos governos nacionais.
Durante a maior parte de sua história, esse fórum despertou muito pouco interesse da esquerda e dos movimentos populares. Menos ainda, acendeu a vontade de formular uma resposta à altura. O primeiro sinal de mudança viu-se em 1994, nas selvas de Chiapas na Conferência Intercontinental pela Humanidade e contra o Neoliberalismo, mas teve pouca continuidade até 1998, quando, com o bem-sucedido movimento contra o Acordo Multilateral de Investimentos (uma carta de direitos dos investidores internacionais que todos os países deveriam ratificar), a globalização da contestação tomou impulso para ganhar as ruas de Seattle em novembro de 1999 e de Praga em setembro de 2000.
A própria agenda de Davos 2001 revela nos temas das seis sessões principais a ansiedade com os esperados protestos: “O que é preciso para que a globalização atenda às expectativas do Hemisfério Sul?”, “Como as novas tecnologias afetam nossa forma de trabalhar e a forma como as empresas interagem com clientes e parceiros?, “Que mudanças são necessárias para recuperar a confiança do público nas empresas e acalmar os temores em relação ao poder das corporações?”, “Como podemos responder aos temores sobre a globalização e às reações negativas de forma construtiva e significativa?”, “Que medidas práticas precisam ser tomadas para transformar o abismo digital global numa oportunidade digital?”, “Negócios e ONGs: da diatribe ao diálogo”.
Faltava à inquietação dos movimentos de oposição, porém, uma arena para formular suas estratégias. Nessa semana, pela primeira vez, isso vai ser tentado. Em direta contraposição a Davos, o Fórum Social Mundial deverá acontecer todos os anos simultaneamente à reunião esta de 25 a 30 de janeiro. Não terá sede fixa, mas a primeira reunião será em Porto Alegre, Rio Grande do Sul. Os temas foram organizados em torno de quatro eixos: “A produção de riquezas e a reprodução social”, “O acesso às riquezas e a sustentabilidade”, “Afirmação da sociedade civil e dos espaços públicos”, “Poder político e ética na nova sociedade”.
O perfil médio dos participantes de Porto Alegre, representantes de ONGs e sindicatos, é bem diferente do de Davos, dominado por executivos de transnacionais, mas ambos os encontros têm seus acadêmicos, prêmios Nobel, representantes de governos e organizações que se esforçarão por estar presentes tanto no encontro do Norte quanto no do Sul: o líder timorense José Ramos Horta, por exemplo, confirmou presença nos dois eventos, a Argélia manda seu presidente a Porto Alegre e seu ministro das Finanças a Davos. Pela primeira vez, o mundo vai ouvir o outro lado da questão global: o lado de baixo.