No começo do século XIX, rumores de que canibais habitavam as Ilhas Marquesas e o Taiti, no Pacífico, ainda corriam entre homens do mar. Apavorados com o espectro do canibalismo, 20 náufragos do navio americano Essex descartaram as ilhas como alternativa em sua batalha pela sobrevivência. Divididos em três botes e com provisões para apenas um mês, decidiram tentar alcançar o remoto litoral do Chile. Em No coração do mar (Companhia das Letras, 368 págs., R$ 31,50), o escritor Nathaniel Philbrick não deixa escapar nenhum detalhe deste tormento. Foi como se o temor dos canibais se transformasse numa maldição. Três meses depois do naufrágio, um dos botes foi encontrado com dois sobreviventes. Acuados num canto da embarcação, estavam sugando o tutano de ossos dos companheiros de bordo mortos. Alguns deles, assassinados pelo restante da tripulação.

Com uma narrativa eletrizante, embora repleta de termos náuticos, a obra acaba de render a Philbrick o prêmio não-ficção do National Book Award, uma das mais prestigiadas premiações literárias dos Estados Unidos. O naufrágio do Essex já havia inspirado diversos autores, entre eles Herman Melville (1801-1870), autor do clássico Moby Dick, baseado no drama real. Na ficção, a história termina no momento do naufrágio, quando uma baleia enfurecida atacou e afundou o navio de 238 toneladas. Mas, no livro de Philbrick, a tragédia começa depois que o Essex é afundado, no auge de uma longa e malfadada viagem de caça a baleias. No coração do mar é uma incursão profunda nos limites da resistência humana.