03/10/2001 - 10:00
Mais que uma obra saudosista, o livro Lembranças de São Paulo: o litoral paulista nos cartões-postais e álbuns de lembranças (Editora Solaris, R$ 118), recém-lançado em São Paulo, é um presente aos que se interessam pela história recente do Estado, com seus usos e costumes. Por meio de 450 imagens congeladas em cartões-postais, os autores João Emílio Gerodetti e Carlos Cornejo levam o leitor a uma viagem de férias pelas belas praias desenhadas entre Santos e Cananéia. Isso num período em que piquenique era chamado de convescote – de 1897 a 1950. São fotos curiosas. Lá estão em poses charmosas moças roliças de corte chanel e toquinha de babados no cabelo, cobertas até o pescoço com seus inacreditáveis e enormes maiôs – isso quando não aparecem mulheres de vestidos compridos e homens de ternos e chapéus andando na areia.
Pelas belas imagens, pode-se também acompanhar a evolução dos pequenos povoados à beira-mar. Rever o esforço dos operários na construção da velha estrada de ferro que ligou a capital ao litoral ou observar a arquitetura cuidadosa da estação de passageiros da São Paulo Railway, réplica de um prédio inglês. Perceber o alvoroço do porto de café, o glamour dos hotéis-cassinos, os deliciosos passeios de bonde, a vida simples dos caiçaras e, de quebra, toda a simbologia de dedicatórias pessoais feitas com letras caprichadas em caneta-tinteiro. O livro resulta de uma garimpagem de mais de 20 anos por sebos e feiras de antiguidade, feita por Gerodetti, 62 anos, engenheiro químico – e pesquisador e pintor nas horas mais prazerosas – e Cornejo, jornalista chileno radicado há 15 anos no Brasil, que com seu olhar estrangeiro se apaixonou por São Paulo. “São Paulo mudou muito nas últimas décadas. Antigamente havia uma preocupação maior com o belo do que com o funcional. Isso sempre me impressionou”, conta Gerodetti.
Com o desejo de compartilhar o seu encantamento transformado em coleção, ele resolveu fazer o livro. “Eu não podia convidar todo mundo para vir à minha casa; então, o jeito foi publicar as melhores fotos”, brinca ele. Para dois aficionados, foi difícil escolher apenas 450 imagens entre as 12 mil que Gerodetti mantém. Principalmente porque os cartões-postais não são fotos comuns. “Os cartões se tranformaram na excelente fonte iconográfica porque eram feitos pela melhor técnica gráfica da época, por bons fotógrafos e em material muito resistente. Era comum a figura do lambe-lambe, um profissional que fazia postais com imagens pessoais. As pessoas tiravam suas fotos e enviavam em postais para seus familiares”, conta Conejo. Já com o material do livro escolhido, o jornalista passou o último verão percorrendo todos os pontos em destaque no livro. “Com as imagens antigas na memória, pude ver como as cidades eram lindas e como ainda podem voltar a ser. Existe uma beleza recuperável”, diz ele. O jornalista comemora o início de recuperação da Bolsa do Café e de parte do centro velho de Santos. “Puseram em funcionamento um bonde. Vi uma senhora com o olhar fixo na máquina, a boca entreaberta, o prazer estampado no rosto. Naquele momento, ela voltava no tempo. Essa é uma visão que não tem preço”, afirma.