Espelho da sociedade americana, Hollywood erigiu ao longo dos anos uma imagem triunfante dos Estados Unidos, moldada principalmente através de filmes que promovem heróis indestrutíveis e a violência-espetáculo. Com o recente atentado, esta imagem pode ficar tão abalada quanto o muro que separa o rio Hudson dos escombros do World Trade Center. A maior indústria cinematográfica do planeta mergulhou num impasse criativo. Precisa decidir rapidamente os novos paradigmas de diversão. Sabe-se que produtores independentes – e oportunistas – já estão atrás dos sobreviventes para reconstituir nas telas o impacto dos últimos acontecimentos. Mas os grandes estúdios parecem perdidos nas suas decisões. Jorge Peregrino, vice-presidente da United International Pictures (UIP) para a América Latina e Caribe, diz que ainda não há diretrizes claras de como Hollywood irá se comportar. Ele deixa evidente, no entanto, que filmes violentos ou que façam alguma alusão ao terrorismo e atentados serão adiados por tempo indeterminado.

Todo o cuidado tem sido pouco. A DreamWorks, de Steven Spielberg, por exemplo, alterou a campanha publicitária de A última fortaleza (The last castle) – com estréia prevista no Brasil para o dia 16 de novembro – pensando em possíveis efeitos subliminares. “Havia a imagem de uma bandeira americana de cabeça para baixo e isso para eles poderia ser sinal de má sorte”, afirma Peregrino. Explosões também devem sumir das futuras produções. Peregrino aposta na alta de enredos leves, como comédias e histórias românticas. “Se houver guerra, e ela se prolongar, pode acontecer como na Segunda Guerra Mundial, com fitas ufanistas, feitas para aumentar a auto-estima dos americanos.”

Rodrigo Saturnino Braga, diretor geral da Columbia Tristar Buena Vista do Brasil, lembra que também pode se reproduzir a mesma situação ocorrida logo após o assassinato do presidente John Kennedy, em 1963. “Para superar o trauma, os americanos se voltaram para os filmes-família. Foi a época de grandes sucessos como A noviça rebelde e My fair lady.” Por enquanto, a Columbia enfrenta um problema mais urgente. O que fazer com Black hawk down, sem título em português, dirigido por Ridley Scott, com Ewan McGregor e Sam Shepard no elenco? Em fase de conclusão, o filme não poderia tocar em questão mais delicada: o sangrento conflito entre soldados americanos e guerrilheiros da Somália, desencadeado em outubro de 1993 e regado a tiroteios, explosões e muitas baixas. “O destino do filme, para nós, ainda é uma incógnita”, diz Braga.

Um sinal do que o público quer ver já foi dado. No final de semana pós-atentado, a grande bilheteria nos Estados Unidos coube a Hardball, com Keanu Reeves, um drama sobre beisebol que não tem nem cheiro de terrorista.