Para os moldes da arte que se faz hoje, Tomie Ohtake foi uma artista tardia. Imigrante de Kyoto, veio para o Brasil em 1936. Só começou a pintar aos 40 anos, depois de formar os dois filhos, o arquiteto Ruy Ohtake e o produtor cultural Ricardo Ohtake, diretor do instituto em São Paulo que leva o nome dela. Nunca aprendeu inteiramente o português, o que jamais representou um empecilho para a divulgação e a valorização de seu trabalho. Com muita gentileza, sempre com a voz muito baixa, repetia com um sorriso que tudo o que tem a dizer está dito em seus trabalhos. A artista, que morreu na quinta-feira 12, aos 101 anos, de complicações decorrentes de uma pneumonia, em São Paulo, é um dos nomes mais conhecidos e valorizados do abstracionismo brasileiro. Suas pinturas, painéis, gravuras e esculturas ocupam dos leilões e museus mais importantes do mundo às vias públicas da cidade que escolheu como lar, a capital paulista. Tomie abandonou a figura no começo dos anos 1960. Desde então, frequentou as mais importantes exposições de arte contemporânea, mantendo a mesma linguagem gestual e intuitiva que se tornou marca inconfundível de sua arte, que ela preferia ver em grande escala. “Não gosto de pintar coisas pequenas, nem de pintar com a ponta dos dedos. Uso o corpo todo”, disse certa vez, quando falava sobre as esculturas tubulares interativas, que hoje ocupam o primeiro piso do Instituto Tomie Ohtake. Tomie queria que as pessoas “dançassem” com suas imensas e levíssimas peças, algo que as crianças sempre tiveram mais coragem de fazer que os adultos.

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CORAGEM
A artista plástica Tomie Ohtake, que só começou a pintar
aos 40 anos, quando os dois filhos já estavam formados

A aparente timidez escondia uma mulher que jamais perdeu o interesse pela recepção de seu trabalho. Em São Paulo, são de sua autoria as ondas de concreto da avenida 23 de Maio, os painéis de pastilha da estação Consolação do Metrô, na avenida Paulista, e o Monumento ao Trabalhador, a imensa “fita” de aço vermelha feita para o Sindicato dos Metalúrgicos de Santo André, que hoje ocupa espaço público do município da Grande São Paulo. Realizada há apenas dois anos, a peça teve toda a execução acompanhada pela artista, que em paralelo preparava exposições e livros que comemoram seu centenário, no ano passado.

Foto Eduardo Knapp/Folhapress