Foi preciso um intervalo de mais de cinco décadas, uma série de reuniões secretas no Canadá e até um empurrão divino, com a mediação do papa Francisco, para que, em dezembro, Estados Unidos e Cuba anunciassem a retomada das relações diplomáticas. Separados por apenas 140 quilômetros de distância e um abismo ideológico, os dois países acertaram uma troca de prisioneiros, que envolveu três cidadãos cubanos e dois americanos. Mais do que isso, o limite de remessas para Havana foi expandido, Cuba saiu da lista de “Estados patrocinadores do terrorismo” e as regras para viagens à ilha caribenha foram relaxadas, ainda que o turismo continue proibido. “Esses 50 anos mostraram que o isolamento não funcionou”, disse o presidente americano, Barack Obama, durante o anúncio oficial. “É tempo de outra atitude.” Nos próximos meses, os americanos planejam abrir uma embaixada em Havana, que, sob o comando de Raúl Castro, irmão de Fidel Castro, já passava por uma transformação, com novas regras para a atração de investidores estrangeiros e o direito sobre propriedades privadas.

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NOVOS AMIGOS
Barack Obama (à esquerda na montagem) e Raúl Castro trocaram prisioneiros
e palavras de confiança. O embargo, no entanto, continua

Estima-se que o rompimento com os vizinhos causou um prejuízo de US$ 1 trilhão para a pequena ilha de 11 milhões de habitantes. Antes da revolução de 1959, que levou Fidel ao poder, Cuba dependia amplamente das exportações de açúcar aos EUA. O regime castrista, no entanto, estatizou ativos estrangeiros e se aproximou da União Soviética. Com o colapso do bloco socialista e sob os efeitos do embargo econômico americano, que pune, por exemplo, empresas estrangeiras que negociem com a ilha, Cuba se aprofundou em crise. A partir de 2000, o eixo comercial virou-se para a Venezuela de Hugo Chávez. O país sul-americano passou a fornecer petróleo subsidiado à ilha em troca de médicos e professores, entre outros serviços – mas agora, com o preço do barril em queda e a economia castigada pela inflação e pelo desabastecimento, Caracas já não tem a mesma capacidade de ajudar Havana. A retirada do embargo é, portanto, estratégica. Mas, para o azar de Raúl Castro, sua aprovação depende do aval do Congresso americano, dominado por uma oposição republicana muito menos disposta a reatar com Cuba que Obama. Ali, a frase “somos todos americanos” proferida pelo presidente, em espanhol, dificilmente terá o mesmo efeito que teve para os cubanos que saíram às ruas para comemorar a nova fase.

Fotos: Yamil Lage/AFP Photo; Susan Walsh/AP Photo