26/12/2014 - 19:00
Em março de 2014, o País ainda digeria a prisão dos caciques políticos condenados meses antes no processo do mensalão, quando surgiu um escândalo de proporções infinitamente maiores. Se o noticiário já relatava problemas de gestão na Petrobras e alguns negócios suspeitos, a deflagração da Operação Lava Jato descortinou um complexo esquema criminoso que teria desviado mais de R$ 10 bilhões dos cofres da mais importante estatal brasileira. A detenção do doleiro Alberto Youssef, conhecido do caso Banestado, somou-se à do ex-diretor de Abastecimento da companhia Paulo Roberto Costa, cujas ligações com o PP do mensaleiro José Janene – morto em 2010 – e a estreita relação com petistas de primeiro escalão encadearam-se numa lógica perversa. Quem esperava que o julgamento da Ação Penal 470 fosse o remédio para extirpar da política o mal da corrupção, não sabia o que ainda estava por vir.
O DELATOR
Preso na Operação Lava Jato, o ex-diretor de Abastecimento da
Petrobras Paulo Roberto Costa entregou à PF uma lista com
cerca de 60 nomes, entre ministros e parlamentares
Sob comando do juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba (PR), o inquérito da Lava Jato desdobrou-se em mais de uma dezena de ações penais distintas. Em nove meses, a operação teve sete fases, a última delas – batizada de Juízo Final – colocou atrás das grades personagens até hoje intocáveis: os donos e principais executivos das maiores empreiteiras brasileiras, acusadas de prática de cartel, fraude em licitações e superfaturamento de contratos para o pagamento de propinas a agentes públicos e políticos. As investigações revelaram que o esquema também lavou recursos ilícitos em doações oficiais para campanhas políticas do PT, do PMDB, do PP e de outros partidos aliados do governo.
Por não ter jurisdição sobre autoridades de foro privilegiado, Moro não pôde avançar nessa seara. Evidências e indícios colhidos pela Polícia Federal e o MPF foram encaminhados ao ministro Teori Zavascki, relator do caso no Supremo Tribunal Federal, e também ao procurador-geral da República, Rodrigo Janot, a quem caberá decidir sobre eventual pedido de investigação dos políticos. Costa, que firmou um acordo de delação premiada para reduzir sua pena, entregou uma lista com cerca de 60 nomes, dos quais 28 já vazaram, entre os quais estão ministros, governadores e parlamentares.
MAIS UM TESOUREIRO
Como no mensalão, outro tesoureiro petista é envolvido:
João Vaccari Neto. Ele é apontado como beneficiário da propina
O benefício da delação premiada foi uma das novidades introduzidas pela Lava Jato.
Já existia desde 2003, mas foi aperfeiçoado. Como disse o procurador Deltan Dallagnol, integrante da força-tarefa da Lava Jato, as colaborações têm utilidade social. Servem para trocar “um peixe pequeno por um peixe grande”. “Quando você pega uma sardinha, você pode comer essa sardinha ou usá-la como isca para pegar um tubarão”, diz. Até agora, 12 investigados firmaram acordos de delação, mas apenas quatro foram homologados pelo STF. Ao propor um acordo, o investigado deve convencer os procuradores e delegados de que possui informação nova e valiosa. Tudo o que for dito em depoimento precisa ser corroborado por evidências materiais, caso contrário, não vale e o investigado perde o benefício.
Youssef e Costa foram os primeiros a entrar em acordo e revelar como funcionava o pagamento da propina, os percentuais pagos aos partidos e os principais operadores. Com a ajuda deles, a PF chegou ao ex-diretor Internacional Nestor Cerveró, que ainda não foi indiciado, e ao ex-diretor de Serviços Renato Duque, que chegou a ser preso e depois acabou liberado por habeas corpus – mas continua sendo investigado. Outro personagem-chave arrolado por ambos foi o tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, que ainda permanece solto. Das delações mais produtivas até agora, destacam-se as dos ex-executivos da Toyo Setal Julio Camargo e Augusto Mendonça Neto, responsáveis por corroborar as provas que PF e MPF tinham contra os grandes empreiteiros. Outro delator importante de Duque foi o ex gerente-executivo Pedro Barusco que não apenas entregou contas e nomes de autoridades, como se comprometeu a devolver aos cofres públicos cerca de US$ 100 milhões, algo em torno de R$ 260 milhões.
O ELO COM O PT
O ex-diretor de Serviços da Petrobras Renato Duque
representava a ponte do esquema com o PT
Há ainda outros delatores não identificados. Um deles teria prometido devolver o dobro desse valor.
Fotos: Joel Rodrigues/Folhapress; ED FERREIRA/AG. ESTADO; Geraldo Bubniak/AGB