Em 2014, o Brasil viveu a eleição mais acirrada da história do seu período democrático. A vitória de Dilma Rousseff (PT) com a apertada margem de 3,4 milhões de votos desenhou um cenário de divisões e acirramentos ideológicos. As urnas racharam o País por renda e escolaridade, levando Dilma a vencer onde há mais beneficiários de políticas assistencialistas e Aécio a liderar em Estados produtores. A votação expressiva da petista no Nordeste e nas regiões mais pobres e a de Aécio onde se pagam mais impostos criou um clima hostil entre brasileiros conhecidos pela tolerância e pela boa convivência com as diferenças. Passados dois meses da eleição, as relações odiosas entre eleitores estão amenas, mas os sinais de que a sociedade está mais politizada são evidentes. Além disso, a oposição que emergiu das urnas está fortalecida e preparada para atuar como poucas vezes se viu desde que o PT assumiu o País há mais de uma década. Com opositores dispostos ao enfrentamento e amparados pelos mais de 51 milhões de eleitores que queriam alternância de poder, Dilma enfrenta dificuldades políticas desde que foi declarada reeleita.

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ROUND FINAL
Dilma e Aécio Neves protagonizaram uma disputa acirrada no segundo
turno das eleições. No fim, deu Dilma por uma diferença de 3,4 milhões de votos

O cenário pós-eleição e o aumento surpreendente do papel da oposição são resultados de uma disputa marcada por reviravoltas. A morte trágica do ex-governador de Pernambuco Eduardo Campos (PSB), vítima de um acidente aéreo ainda no início da campanha, fez com que a comoção revertesse em apoio à sua vice, Marina Silva, que, galgada à vaga de candidata, apareceu nas pesquisas como favorita durante semanas. Marina se tornou um problema para o PT e o alvo preferencial dos ataques de campanha. Capitaneados pelo marqueteiro João Santana, os programas de rádio e televisão da petista partiram para ataques contra seus adversários, em um confronto no qual valia tudo, menos perder a eleição. Diante dos ataques de Dilma e de peças publicitárias violentas e agressivas, Marina Silva silenciou. Alegando preferir discutir ideias em vez de trocar acusações, viu seu favoritismo sucumbir. A candidata encolheu, desidratou em tempo recorde, e a disputa retomou a polarização histórica entre PT e PSDB.

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O PADRINHO
Lula teve participação decisiva na reta final das eleições. A expectativa é de que
ele exerça maior influência no segundo mandato, a despeito das manifestações
pelo País (abaixo) que revelam o esgotamento do atual modelo de gestão petista

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No segundo turno, o adversário de Dilma ainda precisou enfrentar uma verdadeira guerrilha virtual, montada na campanha pelo ex-ministro Franklin Martins visando à desconstrução dos adversários nas redes sociais. O PT usou a máquina partidária, treinou militantes e fez uma campanha destrutiva, como nunca se viu. Em muitos momentos durante a campanha, o tucano Aécio Neves dava sinais de que iria virar o jogo. Mas Dilma saiu vencedora da guerra eleitoral, embora não tenha apresentado oficialmente um plano de governo e tenha feito apenas promessas genéricas.

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O FATO NOVO
O trágico acidente aéreo que ceifou a vida do então candidato do PSB,
Eduardo Campos, contribuiu para alterar o rumo das eleições

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O resultado apertado ficou aquém dos planos petistas e da mobilização feita para elegê-la. Reeleita, assume o segundo mandato bem menos poderosa do que foi. Terá uma base de apoio menos disposta a aceitar suas imposições. As dificuldades nacionais refletiram-se nos Estados e o poderoso PT da presidente obteve desempenho ruim na ­com­posição da Câmara Federal, das Assembleias Legislativas e do Senado Federal. Na Câmara, o número de deputados federais caiu de 86 para 70, numa comparação entre as eleições de 2010 e de 2014. Para piorar, não elegeu nenhum deputado federal em seis Estados. Nos governos estaduais, o PT fez cinco governadores, enquanto seu aliado mais poderoso e ameaçador, o PMDB, elegeu sete. Em número de habitantes que serão governados, o PSDB de Aécio Neves sai na frente, com o comando de cinco Estados cujas populações ultrapassam 72 milhões de pessoas. O PT governará 48,7 milhões de habitantes.

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As dificuldades eleitorais incentivaram petistas e aliados a deixar claras suas resistências ao estilo de governar da presidente reeleita. Embora discurse garantindo que vai unir o Brasil e aumentar o diálogo com aliados e com integrantes do seu próprio partido, poucos são os setores da sociedade crédulos na sua boa vontade.

Fotos: Andre Penner/AP Photo, Eraldo Peres/AP Photo; Adriano Machado/AG. ISTOÉ; Walter Mello/A Tribuna de Santos/Folhapress