O carro popular, surgido em 1993, nunca satisfez inteiramente seu público-alvo, para o qual um zero-quilômetro, “popular” ou não, continuou fora de alcance. A criação do governo Itamar Franco, barateado por conta da redução de impostos, teve um notável sucesso entre a parcela da classe média que teve seus orçamentos cada vez mais apertados e também como segundo ou terceiro carro das famílias mais abonadas. Mais da metade dos compradores ganha mais de R$ 3 mil por mês, de acordo com uma montadora. Hoje, o segmento representa mais de 70% dos carros vendidos no Brasil. Então, por que o governo e a maioria das montadoras querem unificar as alíquotas, acabando com o que aparentemente foi um êxito?

Para a maioria das montadoras, o carro popular não só gera menos lucro que os demais produtos como também os “canibaliza” – isto é, em vez de captar novos consumidores para a indústria automobilística, está roubando possíveis clientes do mercado de carros médios. Realmente, isso pode estar acontecendo: de 1994 a 2000 os carros populares passaram de 40% para 70% do mercado, mas as vendas totais de carros cresceram só 4%. As vendas de carros com motores de cilindrada superior a 1.000 cm3 caíram 38%. Esse encolhimento do mercado para carros médios mantém baixa a escala de sua produção, aumenta os custos de sua montagem, reduz sua lucratividade potencial e também dificulta as exportações, já que às montadoras não interessa tentar criar mercado para carros de 1.000 cm3 em outros países.

A Receita Federal também sente que poderá ganhar com a unificação: se a nova alíquota for pelo menos igual à média ponderada entre os atuais 10% dos “populares” e os 25% dos outros – ou seja, algo entre 15% e 16% – talvez caia um pouco o número total de carros vendidos, mas aumentará a proporção de carros médios, o faturamento total e a arrecadação sobre esse faturamento.

Ganha também o consumidor de renda mais alta, que pagará menos pelo carro médio ou de luxo. A estimativa é que o preço final do segmento caia, em média, 7,2%, de acordo com um levantamento encomendado por uma montadora. Em contrapartida, o dos “populares” deverá subir pelo menos 5,5%.

Quem perderia então? Perde a Fiat, uma exceção entre as montadoras, pois foram justamente os “populares” que a levaram à liderança no Brasil e no Mercosul. Perdem muitos dos fabricantes brasileiros de autopeças, pois esses carros tendem a ter um maior grau de nacionalização. Segundo as montadoras, o índice de nacionalização dos modelos “mil” chega a 90% – e é de 70% para os demais. Perdem consumidores de veículos que terão menos opções para economizar. Perdem principalmente o meio ambiente e a balança comercial, já que o carro médio consome mais, polui mais e demanda mais importações de peças e combustíveis.