21/03/2001 - 10:00
A jornalista Paulo Francis, já falecido, certa vez classificou as mulheres, em um artigo, de “patetas do capitalismo”. O motivo: elas adquiriram o direito de trabalhar fora – e dentro de casa. Não há inocente mais útil a uma sociedade de consumo. Apenas 3% das mulheres ocupam altos cargos executivos, segundo dados da Organização Internacional do Trabalho. Desanimador? Para algumas mulheres, sim. Mas os tempos atuais são de questionamentos, retirada de máscaras, busca de caminhos… Autora do livro Absolvendo a Cinderela – ou o direito de voltar a ser mulher, lançado na semana passada pela editora Mauad, a roteirista e jornalista carioca Cátia Moraes, 41 anos, casada e mãe de uma filha de dez anos, defende o direito de a mulher esquentar a comidinha do marido que chega cansado do trabalho e condena o modelo feminino que imita o homem. Cátia, que fez pesquisa de rua em supermercados, academias de ginástica, e entrevistou mulheres para a confecção do livro, afirma que se fala muito em orgasmos múltiplos, mas a maioria das mulheres não conhece, ainda, nem o orgasmo simplesinho.
ISTOÉ – A mulher se decepcionou com o mercado de trabalho?
Cátia Moraes – Sim, e esse é um dos motivos pelos quais ela quer voltar a ser Cinderela, mulherzinha – levar o marido até a porta para despedir-se com um beijo, esquentar a comidinha quando ele chegar do trabalho… A mulher se decepcionou porque descobriu que trabalha para pagar contas, que entrou numa selva onde é obrigada a ser masculina, a incorporar a competitividade e certa frieza. Pior, sempre ganhando menos que o homem, por mais que trabalhe, e sempre tendo a responsabilidade de cuidar da casa.
ISTOÉ – Ela quer o poder?
Cátia – Não necessariamente. Ela quer ter o direito de trabalhar numa função criativa. Está acostumada a fazer várias coisas ao mesmo tempo. Quer explorar suas potencialidades, pretende seguir os seus desejos; não objetiva o poder. A Maria Carmem Barbosa (roteirista) disse, em entrevista para o livro, que, no período em que chefiava o Departamento de Recursos Artísticos da Rede Globo – cargo que ocupou por dez anos –, ia ao banheiro várias vezes apenas para chorar. O poder cobra um preço muito alto.
ISTOÉ – Qual é a situação ideal para a mulher?
Cátia – Não há receita. A Soninha (comentarista de futebol, também entrevistada para o livro) diz que quando um direito vira obrigação é porque passou do ponto. A mulher tem de ter o direito de escolher. As que são conscientes e se questionam querem redescobrir o que é ser mulher sem camisa-de-força social. O ideal é o trabalho de meio expediente porque elas têm necessidades que o homem não têm e precisam de mais tempo livre.
ISTOÉ – Por exemplo?
Cátia – Cuidar da casa, ir ao supermercado, cuidar dos filhos, ver vitrines, fazer unha, cabelo, depilação, ginástica… Tudo que ela não consegue fazer durante a semana porque está trabalhando e faz correndo no sábado. O pior de trabalhar dez, doze horas por dia é a distância dos filhos. Não dá para educar filhos nesse esquema.