Hospedado em uma cela com dimensões menores do que as do closet de sua mansão de Brasília, o ex-senador Luiz Estevão protagonizou na tarde da quarta-feira 14 uma cena insólita. Durante banho de sol no pátio da carceragem, sentado em um singelo banquinho, o ex-senador passou quase meia hora aparentemente concentrado no livro Tempo de transcendência – o ser humano como projeto infinito, do teólogo Leonardo Boff. A disponibilidade para se dedicar à obra, que trata do desapego aos bens materiais, deveu-se ao fato de o ex-senador ter sido preso na véspera. Surpreendido pela decisão judicial quando assistia à audiência do processo sobre o superfaturamento das obras inacabadas do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo, ele fora levado para o casarão que abriga a carceragem da Polícia Federal.

Graças a privilégios garantidos a integrantes da magistratura, desde o começo de dezembro o juiz aposentado Nicolau dos Santos Neto ocupa um cômodo do segundo andar do sobrado. Outros três acusados pelo desvio de R$ 196,5 milhões da construção, o advogado Pedro Rodovalho Chaves e os empresários Fábio Monteiro de Barros e José Eduardo Teixeira Ferraz também tiveram a prisão decretada pela Justiça. O advogado está foragido. Os empresários, donos da Incal, a empresa responsável pelas obras, tiveram uma rendição marcada por lágrimas. Vinte minutos antes de se entregarem, Fábio Monteiro de Barros e José Eduardo Ferraz pararam no estacionamento de um supermercado, a três quarteirões do sobrado da Polícia Federal, para se encontrar com as três filhas de Fábio Monteiro, que chegaram em um Vectra para se despedir do pai.

Chorando, Fábio Monteiro interrompeu a despedida e declarou a ISTOÉ, por telefone, que estava inconformado com a prisão. “Ficamos à disposição da Justiça, comparecemos às audiências, não há nada que justifique essa medida”, reclamou. Dez minutos depois, eles se entregaram à polícia. No dia seguinte, apesar de terem o direito de acompanhar Luiz Estevão no banho de sol, os empresários ficaram na cela. “Eles me disseram que estavam muito chateados para sair”, contou Tatiana, 19 anos, a filha mais velha de Fábio Monteiro, depois de visitar o pai, na quinta-feira 15. Horas antes, os donos da Incal foram intimados a pagar um débito da empresa de R$ 70 mil, no prazo de 24 horas. Embora garantam ter R$ 300 mil em uma conta da construtora, eles não atenderão à demanda judicial. É que estão com todos os bens bloqueados há dois anos e meio.