25/07/2001 - 10:00
A troca de desaforos entre o presidenciável tucano José Serra e seu adversário Ciro Gomes (PPS) faz parte da estratégia do xadrez sucessório disputado por Fernando Henrique e aliados para deter a oposição. A última semana foi de movimentações intensas: de bate-bocas a processos judiciais. A ordem do rei, peça mais importante do jogo, é não deixar acusação sem resposta. De arma em punho, peões, bispos e outras peças governistas se mexem, inclusive na Justiça, para evitar um xeque-mate adversário já no início da partida. Na sexta-feira 13, um jantar de FHC com empresários que representam boa parte do PIB incluiu no cardápio um debate sobre a governabilidade, a partir do texto Brasil quadrado? Democracia, subversão e reforma, do cientista político Wanderley Reis. Ele foi distribuído aos comensais pelo anfitrião Olavo Setubal, presidente da holding que controla o Grupo Itaú. Reis, professor emérito da Universidade Federal de Minas, alerta que a democracia brasileira ainda não passou pelo teste de ser governada pelo PT e ressalta que há no Brasil um “substrato sociopsicológico” que favorece candidaturas populistas, identificadas por ele como as do governador mineiro Itamar Franco (PMDB) e Ciro Gomes.
Oban – Foi a deixa para que a disputa subisse um tom, com direito a duros golpes de ambos os lados. O candidato do PPS comparou o jantar dos pesos pesados da economia com a reunião que precedeu a criação da Operação Bandeirantes (Oban), grupo de ultradireita pós AI-5, financiado por empresários, que torturava e matava os opositores ao regime militar. Do polêmico jantar de Setubal participaram Antônio Ermírio de Moraes (Votorantim), Joseph Safra (Banco Safra), Lázaro Brandão (Bradesco), Luiz Ortiz Nascimento (Camargo Corrêa), Jorge Gerdau Johannpeter (Gerdau), Roberto Teixeira da Costa (Sul América), Luís Fernando Furlan (Sadia) e Stefan Salej (Federação das Indústrias de Minas). O presidente nacional do PT em exercício, o deputado José Genoíno, pôs mais lenha na fogueira sucessória ateada por Ciro. Disse que a comparação era procedente, mas fez uma ressalva: “Ele só não estava totalmente certo porque não havia armas e tanques no jantar”, e emendou acusando FHC de estar fazendo um conchavo antidemocrático.
Horas depois, foi a vez de os tucanos moverem suas peças. O ministro da Saúde, José Serra, atacou Ciro chamando-o de oportunista e irresponsável. Lembrou que o ex-tucano marchou do lado do PDS, que apoiava o regime autoritário: “Ciro, que militou nas filas da ditadura, critica o presidente da República, falando em Oban, a mesma que deteve e encapuzou Fernando Henrique quando era diretor do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento.” O ex-governador do Ceará, sempre comparado a Collor pelos governistas, contra-atacou: “Quem é oportunista? Eu que renunciei ao governo do Ceará para acudir à crise mortal na primeira fase do Plano Real assumindo a Fazenda ou o sr. José Serra, que se pôs contra o Plano, fazendo de tudo para sabotá-lo?” Para aumentar a briga, FHC também bateu. “Foi um desrespeito. Estive na Oban, fui encapuzado lá. Portanto, ele não tem o direito nem a autoridade moral para falar nisso. Até porque o passado dele não permite que se arrogue como democrata naquele momento”, disse o presidente ao jornalista Sandro Vaia de O Estado de S.Paulo.
Guerra – FHC não ficou só no discurso. Botou a Justiça contra Ciro, que o acusou “de levar a corrupção ao centro do poder”. O governador do Rio, Anthony Garotinho, também está sendo processado por acusar o Planalto de ter pago R$ 1 milhão por fitas com diálogo onde acerta um suborno a um fiscal da Receita (leia entrevista à pág. 7). Mas a batalha dessa guerra, prevista para durar até novembro de 2002, não parou por aí. O PSDB, ex-partido de Ciro, em nota da executiva nacional, o acusou de não ter um programa. Afirma que ele é um adversário que “se refugia em velhos truques do palanque, simulando projetos de governo”. No dia seguinte, Ciro distribuiu sua resposta, com críticas a FHC e um resumo das principais propostas de seu projeto. Ele afirma que Sivam, Proer, DNER, Sudam, Sudene e TRT-SP “são siglas que evocam a frouxidão moral de um governo visto por mim e pela imensa maioria da população como leniente no combate à corrupção”. Seguindo a determinação do bateu-levou, o porta-voz da Presidência, George Lamazière, disse que a resposta de Ciro ao PSDB só acrescenta mais material ao processo em curso contra ele e “mostra ao País a leviandade de suas acusações”. Enquanto o Planalto passou a semana elegendo como alvo Ciro e Garotinho, Itamar trabalhava duro em Brasília para costurar o difícil apoio do PMDB para se tornar presidente da sigla. Lula preferiu seguir o caminho da roça:
não entrou na briga e foi descansar com a família no interior
de São Paulo.