28/03/2001 - 10:00
Primeiro foi a queda do muro de Berlim, em 1989. Dois anos depois, veio abaixo a União Soviética. Na madrugada de sexta-feira 23, espatifou-se ao sul do oceano Pacífico o maior símbolo do avanço tecnológico russo, a estação orbital Mir, que significa paz. Faltavam dois minutos para as três da manhã quando o que restou das 135 toneladas da estação se transformou numa chuva de bolas de fogo, algumas do tamanho de um carro. Os destroços do que foi o maior e mais pesado objeto a orbitar a Terra, depois da Lua, entraram na atmosfera, como previsto, numa descida em curva até o mergulho derradeiro nas águas frias do Pacífico, entre a Austrália e o Chile.
A transmissão da missão suicida ao vivo, pela CNN, foi um tira-gosto dos problemas que virão. No centro de operações de Moscou, a expressão no rosto dos cosmonautas russos era de tristeza. Em luto, eles aceitavam condolências. Na sede da emissora de tevê, em Atlanta, os americanos celebravam apenas mais um show pirotécnico.
Ainda assim, o tombo do orgulho russo teve sabor de triunfo. Em órbita desde fevereiro de 1986, a Mir foi projetada para uma missão de cinco anos, mas durou o triplo. A jornada de 3,5 bilhões de quilômetros, cerca de 88 mil voltas ao redor da Terra, foi marcada por contratempos, como o incêndio a bordo, a falta de comunicação com Moscou e a pane costumeira nos computadores, mas seu legado é indiscutível. Pioneiros na exploração espacial, os cosmonautas russos provaram ser possível a longa permanência a bordo. O recorde foi de 438 dias.
Com o final da União Soviética, a economia perdeu fôlego e não tinha condições de gastar US$ 250 milhões ao ano para manter a estação em órbita. Além disso, aumentava a pressão americana para que a Rosaviakosmos, a agência espacial russa, concentrasse esforços na Estação Espacial Internacional, um consórcio de 16 países, entre os quais o Brasil. A Rússia fez de tudo para obter dinheiro. No ano passado, vendeu por US$ 20 milhões uma passagem para o americano Dennis Tito conhecer o espaço. A agência americana Nasa proibiu Tito de participar dos treinamentos que antecedem a viagem. Os russos bateram o pé. Garantem que o milionário embarca dia 30 de abril no próximo vôo em direção à estação internacional. Na prática, começa agora o frenesi em busca dos destroços da Mir. Exatamente como no episódio da derrubada do muro de Berlim, os pedaços do ícone espacial russo serão vendidos nas ruas, como souvenir.