20/09/2000 - 10:00
Leopoldo Silva |
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Marconi Perillo em campanha: banheiros para os pobres e muito asfalto |
A política produz relações surpreendentes. Na sua vida pública, a candidata à Prefeitura de Goiânia, deputada Lúcia Vânia (PSDB), deu prioridade à ação social. Como secretária da área nos governos Collor e Itamar, aplicava recursos federais na distribuição de cestas básicas, recuperação de creches e obras de saneamento. Como deputada, dedicou, no ano passado, R$ 1 milhão do Orçamento federal para melhorias sanitárias em Goiás. Atendeu aos apelos do aliado e governador do Estado, Marconi Perillo (PSDB), que planeja espalhar banheiros nas casas pobres de Goiás. O filho de Lúcia Vânia, Frederico Abrão Costa, transita na mesma área, mas em funções bem diferentes. É dono de uma empreiteira, a Ética, e retira parte do seu sustento da execução de obras públicas. Um dos empreendimentos que sustentam o caixa de Frederico está em Luziânia e é suprido com recursos da Saneago, a empresa de saneamento do governo goiano.
O filho de Lúcia Vânia não precisou entrar em uma concorrência pública para ter a obra, que poderá chegar a R$ 4 milhões. Fechou um contrato de subempreita com a construtora titular do convênio, Andrade Monteiro. Frederico diz estar convencido de que honra o nome que deu à sua empresa. “Sou empresário, engenheiro formado e não vejo nenhum conflito ético nisso”, afirma. João Geraldo Maia, diretor da Andrade Monteiro, diz que Frederico é seu amigo e decidiu entregar-lhe a obra porque passava por grandes dificuldades financeiras. Argumenta que a Saneago não estava liberando o dinheiro. “Depois disso, os atrasos pioraram ainda mais”, acrescenta. Se quiser resolver o problema, Frederico tem a opção de acionar a rede de relações materna. Além de aliada do governador Perillo, Lúcia Vânia tem entre seus apadrinhados o diretor financeiro da Saneago, Daniel Domingues. Mas o expediente poderá não ser necessário. Adversários garantem que Perillo está acertando as faturas pendentes com os empreiteiros. No Ministério Público, há denúncias de que algumas das construtoras beneficiadas teriam colaborado com a campanha.
Sebastião Nogueira/Walter Alves |
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Lúcia Vânia, presidente da Centrais Elétricas: aliança política e verbas suspeitas |
Susto – Acostumado a escândalos eleitorais do clã peemedebista que dominou o Estado, o Ministério Público anda assombrado com a lama que já chegou aos calcanhares do governo tucano. Existem diversas investigações de casos de improbidade administrativa, abertas por suspeita de lesão ao patrimônio estadual. O programa Asfalto Novo, assinado entre o governo Perillo e mais de 100 municípios do Estado, inclusive Goiânia, prometia colocar nas ruas e avenidas mais de 600 quilômetros de asfalto. Os convênios foram assinados no dia 29 de junho, um dia antes do prazo permitido pela lei eleitoral. Os procuradores, porém, suspeitam que a data foi forjada. E sustentam que os convênios só foram publicados no Diário Oficial no dia 14 de agosto, muito depois do prazo fatal exigido pela lei. Qualquer promotor sabe que asfalto, em ano eleitoral, é moeda corrente na busca por novos eleitores. Outro caso grave é o possível desvio de dinheiro da Centrais Elétricas de Goiás (Celg) para a campanha à prefeitura de Lúcia Vânia. A Celg repassou, sem licitação, alguns milhões de reais para uma fundação do Rio de Janeiro, a Pró Uni-Rio, para serviços de consultoria fiscal. O dinheiro pode ter sido desviado para a campanha de Lúcia Vânia. Na quarta-feira 20, o Ministério Público instituiu uma investigação formal contra a deputada-candidata, o presidente da Celg, Clóvis de Oliveira, e o diretor financeiro da empresa, Lincoln Xavier, além de pedir à Justiça a quebra do sigilo bancário da operação.
A teia de relações de Lúcia Vânia também alcança a Celg. Clóvis de Oliveira é apontado como o coordenador informal da campanha da candidata do PSDB. Lincoln Xavier também é ligado à candidata tucana. Ninguém na Celg conhece nenhum serviço prestado por essa empresa. O dinheiro, porém, saiu rápido. No mesmo dia em que o processo 00.009231 foi aberto, R$ 4.457.059,45 foram pagos à fundação por meio da ordem de pagamento 956 e depositados na conta 48322-2, agência 93/0 do Banco do Brasil, no Rio. O MP acredita que seja apenas uma das ordens bancárias.
Conta bancária – “É razoável suspeitar de desvio. Aqui em Goiás não seria a primeira vez, nem a segunda, que recursos públicos foram usados em campanhas eleitorais”, afirma o procurador regional eleitoral Hélio Telio. Se condenada, Lúcia Vânia pode ter sua candidatura cassada. A Polícia Federal também está investigando um possível crime eleitoral. “É preciso saber quem foi o destinatário dos pagamentos feitos pela Uni-Rio com o dinheiro que recebeu da Celg”, afirma Telio. “A Lúcia Vânia não iria usar a conta bancária pessoal. Seria imprudência demais”, ensina o procurador, calejado na investigação de outros dois casos rumorosos no Estado. O chamado Caso Caixego, que foi o desvio de R$ 5 milhões de um acordo trabalhista para a campanha eleitoral do hoje senador Iris Rezende (PMDB) ao governo do Estado. E o caso da Astrográfica e Editora Ltda., empresa de fundo de quintal que, depois de prestar serviços para a campanha de Iris ao governo e Maguito Vilela (PMDB) ao Senado, recebeu do Banco do Estado de Goiás o módico empréstimo de R$ 3,5 milhões. Dois diretores do banco tinham sido tesoureiros da campanha eleitoral.