Fotos: Leo Caldas/Ag. Lumia
O professor Meira, na sede do Cesar, que transforma alunos em empreendedores

Rica em história, arquitetura, folclore, belas praias, boa culinária e muito sol, Recife começa a ser reconhecida pelo potencial tecnológico. À frente dessa mudança está uma organização não-governamental (ONG) ligada ao Departamento de Informática da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). O Centro de Estudos e Sistemas Avançados do Recife, o Cesar, faz a importante ligação entre o mercado e o conhecimento acadêmico, geralmente restrito à universidade. O resultado são empresas que geram capital, empregos e renda para a universidade, o que significa que os bons cérebros não precisam trocar as praias da capital pernambucana pelo congestionamento de São Paulo.

Criado em 1993 por um grupo de professores da universidade, o Cesar tem mais de 150 funcionários – vários saídos dos bancos escolares – e prevê faturar R$ 5 milhões neste ano, contra R$ 3,9 milhões do ano passado, quando metade do lucro foi reinvestido. A outra porção ficou para o Departamento de Informática. Em quatro anos, a ONG criou 30 empresas ligadas à tecnologia da informação e em sua carteira de clientes estão nomes como IBM, Organização das Nações Unidas e BCP, empresa de telefonia celular com 2,3 milhões de assinantes em São Paulo e em seis Estados do Nordeste. “Escolhemos o Cesar pela capacidade de desenvolver novas idéias”, diz Michel Levy, vice-presidente da operadora, que na sexta-feira 15 assinou um acordo com o centro para criar aplicações que combinam internet e celular.

Criatividade – Idéias não faltam. “Quem disse que celular precisa ser usado só para falar?”, questiona o presidente não remunerado da ONG, o paraibano de 45 anos Silvio Meira, professor-titular de Informática da UFPE. “Semáforos podem ter celulares em seu interior. Quando uma ambulância precisa fazer determinado trajeto para chegar a um hospital, o motorista só teria que digitar uma senha no seu telefone para abrir todos os semáforos do caminho”, prevê Meira.

Formado em Engenharia Eletrônica, o cientista dá aulas de bermudas e camiseta e lembra mais um aluno do que um professor com doutorado pela Universidade de Kent, na Inglaterra. No Cesar, não há horário fixo de trabalho. Isso nem de longe significa folga. É comum encontrar a colorida sede do centro, no campus da UFPE, fervilhando no final de semana e em plena madrugada.

O segredo da ONG está em seus olheiros, profissionais vindos da iniciativa privada que tentam conciliar as necessidades do mercado de informática com os projetos em andamento na universidade. “Eles sabem o que as empresas e os usuários precisam e sabem o que a gente pode fazer”, diz Meira. Foi esse grupo que transformou a tese de doutorado de Pedro Falcão Gonçalves em uma empresa, o Radix, mecanismo de busca vendido para o banco Opportunity por cerca de US$ 5 milhões. Hoje com sede própria, o Radix tem 75 funcionários. Não fosse a intervenção do Cesar, dificilmente a tese teria virado um empreendimento. “É difícil para quem está na universidade encontrar alguém que precise exatamente daquilo que está sendo desenvolvido em laboratório”, diz Meira. “O futuro é uma combinação complexa entre investidores, empresas, cultura, usuários, pesquisa e desenvolvimento. O Cesar existe para articular isso tudo”, prevê o engenheiro. 

Vale do Maracatu

Dentro de no máximo dois anos, mais de 100 empresas de internet e informática da capital pernambucana terão novo endereço: armazéns abandonados do porto de Recife. Ao mesmo tempo que desfrutarão de incentivos fiscais e tecnológicos, como uma rede de fibras ópticas para conexão de alta velocidade à internet, estarão colaborando com a revitalização de parte do porto, que será desativada e transferida para o porto de Suape, a 40 quilômetros ao sul da capital. O Cesar, o Departamento de Informática da UFPE e a Secretaria de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente de Pernambuco também irão de mouse e cuia para a nova localização.

“Queremos sinalizar para o mercado e para as empresas de ponta que estamos criando um ambiente propício para o desenvolvimento de tecnologia”, diz Carlos Marinho, secretário de Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente de Pernambuco. Ao todo, o governo investirá R$ 33 milhões no projeto, chamado de Porto Digital. O dinheiro resulta da privatização da Celpe (Companhia de Eletricidade de Pernambuco). “Vamos juntar a tecnologia à tradição e à rica história do Recife”, empolga-se Marinho.

“O Porto Digital vai ser um local de convergência de tecnologia e da nova economia”, diz Silvio Meira, do Cesar. Ele compara a iniciativa ao Vale do Silício, na Califórnia, a maior concentração de empresas de tecnologia do mundo. “Lá, quando alguém tem um problema para resolver, acha a solução com colegas que encontra na rua”, diz Meira.