13/09/2000 - 10:00
O governo federal apresentou recentemente ao Congresso sua proposta de orçamento para 2001. Prevê receitas de R$ 269 bilhões e despesas de R$ 286 bilhões. Propõe aumentar os gastos em desenvolvimento social em R$ 9,5 bilhões relativamente a 2000. O mais significativo deles, em saúde, representa um desembolso de R$ 86 por brasileiro neste ano e de R$ 107 em 2001. Como essas despesas vêm caindo há anos, em termos reais equivalem a apenas três quartos do valor aplicado em 1995.
Nas áreas de saneamento e habitação, decisivas para a diminuição da mortalidade infantil, a despesa proposta é de R$ 9,50 por habitante em 2001. Parece um bom aumento em relação aos R$ 3 de 2000, mas só porque este foi um valor ridiculamente baixo: em 1997, a proposta foi de R$ 27 por habitante – se bem que apenas 31% desse valor tenha sido realmente executado.
Em muitas áreas, além dessa, o valor proposto pelo governo e aprovado pelo Congresso tem-se revelado mera ficção. De 1995 a 1999, 86% do total de dispêndios planejados para habitação ficou na intenção. O mesmo aconteceu com 38% do que seria destinado a saneamento, 40% no caso da pecuária, 46% na proteção ao meio ambiente, 56% no ensino supletivo, 33% no urbanismo, transporte urbano e hidroviário. Apenas 21 dos 59 programas realizaram, em média, 90% ou mais do valor programado. Nos oito primeiros meses deste ano, o governo só investiu 10% do previsto, conforme reportagem publicada no dia 10 no jornal Folha de S.Paulo. Nem todos os setores ficaram à míngua: os gastos em publicidade, de R$ 146 milhões, foram iguais àqueles em saúde, educação e ciência e tecnologia juntos.
Se… – O governo prevê receitas de R$ 16,5 bilhões que são particularmente hipotéticas. Dependem de o preço do barril de petróleo não passar de US$ 24,60 e o dólar de R$ 1,82 em 2001 e de a concessão da banda C levantar pelo menos R$ 18 bilhões (apesar da consultoria internacional Yankee Group estimar que ela não vale mais que R$ 7 bilhões). Além disso, o Congresso precisa aprovar o aumento da CPMF de 0,30% para 0,38% e o desconto de 11% nas aposentadorias de servidores.
Grande parte das despesas previstas – principalmente juros da dívida pública, INSS e pagamento dos servidores – são consideradas intocáveis. Se os R$ 16,5 bilhões de receitas hipotéticas não acontecerem, o corte recairá todo sobre as despesas dependentes de decisão política – menos de 20% do total. Pode ser desastroso para aquelas onde os recursos já são insuficientes, como ensino superior e saúde. Continuariam no papel projetos novos, como o de segurança, o de transposição do rio São Francisco, bem como os de saneamento e renda mínima, vinculados pelo governo ao aumento da CPMF e do IPI.
A alternativa é mexer no imexível: cortar servidores e reduzir seus salários, pensões e aposentadorias (e, talvez, também as aposentadorias do setor privado), ou reduzir os juros da dívida. No primeiro caso, há o risco de ferir direitos adquiridos, agravar os problemas da pobreza e do desemprego e prejudicar serviços essenciais. No segundo, haveria dificuldade na rolagem da dívida caso a redução não fosse bem aceita pelos credores. No entanto, a taxa real de juros orçada para 2001 (9,8%, descontado o IPCA) supera a vigente em 2000 (8,5%-9%) – previsão curiosa, já que, dado o otimismo implícito nas demais previsões, seria de se esperar uma queda. E, cada 1% a menos nessa taxa significa uma economia de R$ 7 bilhões – o triplo do valor do Fundo de Combate à Pobreza.
O que sai do bolso |
Em média, cada uma das 50 milhões de famílias brasileiras, com renda média esperada de R$ 24 mil em 2001, deve pagar um total de R$ 7.500 em tributos no ano que vem. A parcela dos governos estaduais é de R$ 1.950, a dos municípios soma R$ 300 e a do FGTS, R$ 330. É uma média abstrata: na realidade, a distribuição da carga tributária é bem desigual e a da renda, mais ainda. Para os assalariados, os impostos e contribuições representam de 40% a 45% da renda bruta. O governo federal quer levar R$ 4.720 via impostos, contribuições e previdência e mais R$ 130 através do aumento da gasolina. Por família, pretende ainda conseguir R$ 170 com venda de concessões, endividar-se mais R$ 340 e obter R$ 280 de outras fontes. Isso, para gastar R$ 5.640. A maior parte vai para despesas mais ou menos automáticas: R$ 890 para juros da dívida externa e interna, R$ 1.430 para o INSS, R$ 780 para Estados e Municípios, R$ 290 com subsídios e precatórios, R$ 650 para servidores ativos, R$ 510 para servidores inativos. Entre ativos e inativos, os servidores do gabinete da Presidência recebem R$ 3, do Legislativo R$ 84, do Judiciário R$ 134 e das Forças Armadas R$ 309. Sobram R$ 1.070 para despesas que dependem de vontade política. A previsão é de que, em nome de cada família brasileira, o governo destine, para outras despesas além de salários, R$ 835 para o desenvolvimento social. São R$ 355 para saúde, R$ 156 para qualificação profissional, seguro-desemprego e fiscalização trabalhista, R$ 146 para educação (incluindo R$ 24 do programa de renda mínima), R$ 91 para assistência e previdência social. E, ainda: R$ 49 para reforma agrária, R$ 32 para saneamento e habitação (incluindo R$ 23 para programas de saneamento vitais para reduzir a mortalidade infantil), R$ 4 para cultura e esportes, R$ 3 para sociedades e culturas indígenas. De resto, infra-estrutura recebe R$ 106 (sendo R$ 65 para transportes), agricultura R$ 90, Forças Armadas R$ 57, financiamento a exportações R$ 45, Legislativo e Judiciário R$ 37, ciência e tecnologia R$ 36 (incluindo, por exemplo, R$ 3 para o programa espacial), recursos hídricos R$ 33 (incluindo R$ 6 para transposição do rio São Francisco), segurança pública R$ 24, financiamento à indústria R$ 11, turismo R$ 3, meio ambiente R$ 3. |