23/05/2007 - 10:00
DEDICAÇÃO Reagan escrevia no escritório, na casa de campo
ou em viagens. Em 1981, comentou o casamento:
“29 anos da maior felicidade que posso merecer”
Ronald Reagan, o 40º presidente dos Estados Unidos, escreveu em 13 de março de 1981 que gostava de fazer coisas que seus antecessores não tinham feito. Não completara dois meses no cargo público mais importante do mundo, mas já estava entrando na história por registrar o cotidiano da Presidência em diários. O republicano Reagan, que liderou uma intensa corrida armamentista no período em que ainda havia União Soviética, preparou ao todo cinco volumes com memórias de seus dois mandatos, entre 1981 e 1989. Esses registros chegam na próxima semana ao mercado americano na forma de um único livro, The Reagan diaries, publicado pela editora HarperCollins. O compêndio de 784 páginas foi organizado pelo historiador Douglas Brinkley, biógrafo de Jimmy Carter e Henry Ford.
Os diários – com capa em couro e um refulgente selo presidencial na frente – foram mantidos por Reagan, ex-astro de Hollywood, para que ele pudesse se recordar dos tempos em que esteve no comando do país. Afinal, batalhara muito para atingir o posto. Reagan se esforçara duas vezes para sair candidato à Presidência. Na terceira tentativa, finalmente conseguiu o que almejava e em 1980 venceu o pleito contra Carter. Até conquistar o cargo, Reagan nunca criara um diário. Ele comprou o primeiro dias antes de iniciar seu mandato, em 20 de janeiro de 1981. Depois disso, escreveu regularmente, mesmo em viagens internacionais. Em seu estilo sucinto e repleto de abreviaturas, o republicano narra os bastidores de seu governo, com direito a momentos íntimos em que revela a devoção por Nancy, sua mulher, e a angústia provocada pelo comportamento dos filhos Ron e Patty, que sempre reclamavam, diversas vezes aos gritos, da constante vigilância dos agentes do Serviço Secreto. “Disse para ele (Ron) não falar comigo desse jeito”, assinalou em abril de 2003. No ano seguinte, em fevereiro, uma briga com Patty o leva a observar: “Insanidade é hereditária. Você a pega dos filhos.”
Como presidente, Reagan demonstra nos diários que é o homem forte. Em agosto de 1982, quando Israel faz um devastador bombardeio sobre Beirute, liga irritado para o primeiro-ministro Menachem Begin. “Falei que ele deveria parar ou nossa relação estaria em perigo. Usei deliberadamente a palavra holocausto e disse que o símbolo de sua guerra era a foto de um bebê de sete meses com os braços arrancados pelas bombas.” Begin o atendeu. Por sinal, o republicano por algumas vezes temeu que o juízo final estivesse perto em função dos conflitos no Oriente Médio. Outro momento marcante foi a primeira vez em que Reagan e Mikhail Gorbachev, então um dirigente soviético, se reuniram, em novembro de 1985. “Hoje é o dia. Senhor G. e eu nos encontramos. Tínhamos 15 minutos para uma conversa privada. Ficamos uma hora, o que excitou a imprensa. Então, nos juntamos à plenária do meeting. Ele começou falando que nós não acreditamos neles etc. (…) Disse que declaramos zonas de interesse especial ao redor do mundo, mas que nós os atacamos quando a URSS fez o mesmo. Devemos reconhecer o direito das pessoas a uma revolução. Finalmente foi minha vez e eu os peguei o tempo todo através das histórias de agressões dos soviéticos. (…)
Ele é firme, mas eu também sou.” Reagan permitia-se também um certo humor, mesmo quando a situação o desfavorecia. Em maio de 1981, ele e o príncipe Charles se reuniram e o chá foi providenciado pelo staff. “Horror dos horrores! Eles o serviram à nossa maneira, com o saquinho de chá na xícara. Percebi que ele apenas segurava a xícara e que, depois, a depositou na mesa”. Reagan descreve que o chefe de sua equipe pessoal pediu desculpas a Charles, ao que o príncipe respondeu. “Eu não sabia o que fazer com aquilo.”
Anotações como essas, feitas em tinta azul e preta em letras marcadas por alguns floreios, foram essenciais para conservar bem vivas as memórias do 40º presidente americano. Anos depois, o mal de Alzheimer (doença neurológica degenerativa) o atingiu a tal ponto que obrigou o ex-chefe da Casa Branca a deixar de vez a vida pública. Reagan morreu em 2004, aos 93 anos.
ATAQUE No instante em que sofreu o atentado que assombrou o mundo (acima), Reagan não percebeu que fora atingido. “Tomar um tiro dói”