02/05/2007 - 10:00
O médico Arlindo Chinaglia Júnior é um político diferente. Nos anos 70 do século passado, quando jovem residente num hospital de Taguatinga, periferia de Brasília, dizia a todos que se chamava Neto para fugir da ditadura. Hoje, aos 57 anos, presidente da Câmara dos Deputados, ele continua refratário a revelar seu paradeiro (ou o que vai fazer). “Ninguém sabe com quem eu me reúno ou com quem almoço”, rejubila-se. Essas excentricidades estão provocando queixas de seus pares. Tido como alguém que diz tudo o que pensa e não dá muita atenção à diplomacia, ele resolveu, numa das suas primeira medidas à frente da Câmara, marcar sessões deliberativas às segundas-feiras. Pressionado agora, ele recuou das sessões às segundas. Pelos corredores, alguns deputados ainda reclamam do seu temperamento. O homem que chegou à presidência da Câmara há apenas três meses cheio de promessas e de boas intenções vê sobre si o peso da corporação que dirige. Alguns de seus planos estão caindo. Mas outros estão vindo por aí. Na entrevista abaixo, Chinaglia adianta que vai comprar outras brigas.
Trabalhamos todas as segundas-feiras com quórum alto por dois meses. Desde a Constituinte, a Câmara não trabalhava tanto. Foi um esforço brutal para todo mundo, mas os deputados reclamavam que é importante estar nas bases políticas nas segundas.
Não existe nenhum Parlamento no mundo que trabalhe de segunda a sexta, em horário comercial. Porque além das sessões deliberativas no plenário tem o trabalho nas comissões técnicas e o trabalhão de representação popular. Até porque, se alguém deixar de freqüentar o lugar em que costumava ir antes da eleição, vai receber o epíteto de “deputado Copa do Mundo”, aquele que só aparece de quatro em quatro anos para pedir votos.
Eu nunca disse que não haveria reposição das perdas da inflação. E é só isso que os líderes dos partidos, por unanimidade, combinaram: repor as perdas dos últimos quatro anos. O que povoa o imaginário popular é que o valor do salário do deputado é muito alto. Mas, se compararmos com atividades de igual importância, ou até menor, veremos que não é bem assim.
Estamos falando de um processo histórico que não foi criado nesta legislatura. Houve uma crise brutal na legislatura passada que, é claro, atinge a imagem do Legislativo. Mas esse distanciamento do eleitor vai diminuir na medida em que trabalharmos mais. E à medida que houver punição para a corrupção e para o que houver de errado.
O que a atual legislatura tem a ver com as passadas? Nada. Não podemos ser julgados pelos atos dos outros. No caso da crise passada, as investigações não apontaram objetivamente o que seria o tal do mensalão. O que houve ali seguramente foi crime eleitoral. Tenho que admitir que é muito complicado para os parlamentares julgarem os colegas. Tem inclusive uma proposta de emenda constitucional para que esse julgamento seja feito pelo Supremo.
É melhor que o julgamento seja pelo Judiciário, até porque sempre vai haver a suspeição de que houve proteção, qualquer que seja o resultado. Mas isso não é unânime, muitos interpretam como o Parlamento abrir mão do seu poder. Eu, pessoalmente, tenho dúvidas. Mas admito que, seguramente, o Parlamento não se sente confortável com o modelo atual.
Não, sou contra. É preciso ter muito cuidado para não trazer para o colo da Câmara tudo quanto é boato ou situação. Não é o Poder Legislativo que está em foco na Operação Hurricane. Só pelo fato de aparecer numa conversa gravada o nome de deputados, já querem imediatamente que o assunto seja debatido na Câmara. Se amanhã qualquer deputado aparecer envolvido, primeiro ele vai ser punido pela Justiça.
Devem ser aqueles que notaram que fui líder do governo durante toda a crise e os decepcionei porque jamais usei de argumento menor para fazer os embates. Ou aqueles que se surpreenderam durante a disputa pela presidência da Câmara, quando, numa semana, obtive o apoio da bancada do PMDB e do PSDB. Olha, tenho me esforçado bastante para que cada deputado se sinta em pé de igualdade com os demais.
Quem diz isso é mal informado. Ninguém sabe com quem eu me reúno ou com quem almoço. Os que reclamam não o fazem inocentemente. Há deputados que ainda não esqueceram a disputa para presidente.
Não decidi comprar briga alguma, falo com a imprensa em média quatro vezes por dia. Mas, quando assumi a presidência, recebi estudos referentes a todas as ocupações de espaços na Câmara. O local onde estão os jornalistas, segundo o projeto original de Oscar Niemeyer, não deveria ser ali. Não fui eu quem inventou, vão brigar com o Niemeyer. E escrevam que ele é um arquiteto pífio porque pensou mal a estrutura da Câmara. Os jornalistas querem é iniciar uma operação abafa.
Quando os jornais publicaram esse assunto antes de ele entrar na pauta oficial da Mesa da Câmara, tentaram abafar sua discussão. Isso é pressão. Mas é bom que se diga: isso não me intimida, pressão não me intimida. É claro que eu admito pressão, mas que ninguém se iluda que isso me tirará o ânimo de fazer o que for julgado melhor. Daí é que talvez venha a idéia de que gosto de confronto. Eu apenas zelo para que cada um cumpra bem o seu papel. Portanto, a presidência da Câmara não será exercida por ninguém da imprensa. Será exercida por mim e pronto!
O PT sempre foi acusado de ser um partido dividido. Eu venci porque fiz todo um esforço para unir o PT. A bancada, por unanimidade, decidiu que eu seria o candidato, essa foi a chave do sucesso. Quando alguém pergunta do Dirceu, por que não pergunta do Júlio Delgado, deputado do PSB, que também me apoiou? Lembro que o Júlio foi o relator do processo do Dirceu no Conselho de Ética, que pediu a sua cassação. A questão é: Dirceu tem influência do PT? Tem, é claro que tem. Portanto, foi bom ele ter me apoiado, mas não foi o único.
O Campo Majoritário também vem passando por um processo de disputas e de mudanças internas. Acho que a corrente acabou se valendo da sua força e foi vítima dela. Como tinha maioria, negociou menos do que deveria ter negociado, ouviu menos do que deveria e na hora de escolher os cargos partidários, o poder foi exercido com exclusividade.
Alguns dirigentes internos cometeram erros. A questão do financiamento de campanha foi o mais brutal e inadmissível erro do PT. O caminho do arejamento é tomarmos as medidas concretas sobre cada caso. Onde deu problema? Na questão financeira. Teve candidato a prefeito que recebeu dinheiro de caixa 2 porque a direção nacional mandou. Então, por que o PT não faz agora da sua contabilidade financeira um exemplo para o País? Por que não cria um conselho e disponibiliza suas contas para a sociedade? Com a reeleição do Lula e a votação que o PT recebeu na última eleição, a população nos deu mais uma chance. Então temos que aproveitá-la.
Depende do momento político. Neste momento, não atrapalha. Até porque não há brasileiro que não queira que se resolva a crise aérea. Se alguma investigação puder acrescentar dados para corrigir o que estiver errado, é evidente que a CPI pode jogar um bom papel. Mas há uma desconfiança de que essa CPI queira somente desgastar o governo.
Quando alguém de expressão na oposição decide conversar com o governo, isso é em si importante para o País. Não significa que a partir de uma conversa as partes vão estar de acordo em temas relevantes. Não vejo nenhum mal no diálogo.
Está longe. A candidata principal do PT é Marta Suplicy, e eu não disputaria com ela.
A melhor candidata é a Marta e ponto. Se ela não for, aí é uma outra situação. E ponto.