Quando liga a televisão, Maria José Pereira, 71 anos, apaga as luzes da sala. A filha Antonieta acha graça: “À noite, ela anda pela casa com uma lanterna e não acende a luz nem para ir ao banheiro.” O que antes era encarado como mania, tornou-se necessidade: economizar energia elétrica. “Eu uso apenas o que preciso”, diz Maria José, que vive num bairro nobre de São Paulo, sintetizando o que o governo quer colocar na cabeça dos brasileiros. Economizando ou não, os apagões serão inevitáveis a partir de 1º de junho e devem durar pelo menos até novembro, quando se inicia o período de chuvas. Depois de desistir da aplicação de multas para quem não diminuísse o consumo, na terça-feira 8 o Conselho de Política Energética (CNPE) anunciou um plano de racionamento que prevê blecautes programados em todas as regiões do País. Agora é salve-se quem puder.

O esquema de racionamento será discutido na próxima reunião do CNPE, em 23 de maio, mas algumas medidas já foram tomadas. Para organizar o caos e preparar a população para os tempos de guerra, o governo dividiu os consumidores em grupos. O mais atingido será, sem dúvida, o consumidor doméstico. Além de sair apagando as lâmpadas pelos cômodos da casa para colaborar com o racionamento, será preciso desembolsar alguns reais para não ser pego desprevenido na hora dos blecautes, que terão duração de duas a quatro horas.

Mudar hábitos será imprescindível, a começar pelos banhos muito quentes e prolongados. Chuveiros elétricos são responsáveis, em média, pelo valor de metade da conta de luz doméstica. E especialistas acreditam que 7% do consumo nacional de energia elétrica seja utilizado para fazer funcionar esses utensílios. O aparelho, uma exclusividade brasileira, é o típico exemplo do barato que sai caro: custando a partir de R$ 15, ele onera o consumidor ao longo do tempo. Uma família de quatro pessoas não gastará menos de R$ 30 por mês só com banhos diários de 15 minutos.

Alta tensão – Se a mesma família instalar um sistema de aquecimento solar, vai gastar cerca de R$ 600, mas a economia é garantida. “O investimento será pago em, no máximo, três anos”, garante Marcos Luciano, gerente comercial de uma loja especializada em energia solar. O sistema não tem prestígio no Brasil. Estima-se que apenas 400 mil residências possuam um desses no País. Para quem não pode pagar caro, a USP desenvolveu um aparato de aquecedor solar que utiliza placas de termoplástico, reservatórios de papelão, de isopor e de alvenaria com preços entre R$ 15 e R$ 110.

Outro vilão da conta de luz é o ar-condicionado. Se ficar ligado uma hora por dia, o resultado será um custo de, pelo menos, R$ 9 no fim do mês. A socialite carioca Vera Loyola já resolveu esse problema. “Simplesmente tirei aparelhos de ar condicionado de várias das minhas empresas”, diz ela. O advogado paulistano Roberto Mello, cuja conta de luz ultrapassa R$ 400, também vai tomar medidas drásticas. À noite, no horário de pico – das 17 às 22 horas –, a casa onde moram nove pessoas se transforma numa espécie de câmara de alta tensão: três tevês ligadas, computador, som, chuveiros, secadores de cabelo e lâmpadas acesas. “Em momentos de crise como esse, é um luxo desnecessário, por exemplo, passar todas as camisetas, como acontece em casa”, diz.

O medo da escuridão já fez aumentar também as vendas e aluguéis de geradores elétricos movidos a gasolina, gás natural ou diesel em quase 50%. Entre os domésticos, – com potência suficiente para manter tudo funcionando numa casa de três quartos e dois chuveiros –, o mais barato não sai por menos de R$ 10 mil. Na guerra do racionamento, quem não pode se armar com artigos de luxo, deve se preparar para não ficar no breu com munições mais acessíveis. Lanternas, lampiões e a tradicional vela tornaram-se opções baratas para a hora do apagão. Mas é preciso não só pensar no remédio e tratar de economizar energia. “O problema do brasileiro é que ele só é solidário em situações de absoluta emergência e não no dia-a-dia”, reclama o advogado Roberto, aquele da conta de R$ 400.

Como fugir da escuridão
Aquecedor solar de água
Custo:
a partir de R$ 600 (valor médio de aparelho instalado em uma casa simples com um chuveiro e três pessoas)

Funcionamento: placas coletoras de calor são instaladas no telhado da casa. A água fria sai da caixa-d’água, sobe pelo encanamento por um mecanismo natural, chamado termossifão, e fica aquecida no contato com a placa. Um reservatório térmico (feito em aço inox ou cobre) armazena a água quente (cerca de 50 graus) que vai para o chuveiro. A caixa-d‘água fria alimenta o reservatório, mantendo-o sempre cheio. Em dias chuvosos e frios, é possível ligar o reservatório na tomada. Ainda assim, o consumo de energia é inferior ao de um chuveiro elétrico
Vantagens: a vida útil do aquecedor varia de 20 a 25 anos É possível reduzir o consumo de energia em mais de 50%
Restrições: o aquecedor solar pode ser colocado em qualquer casa térrea ou sobrado, mas não é possível instalá-lo em prédios altos já construídos. Nesses casos, é necessário que o sistema de aquecimento esteja previsto na planta do prédio
Onde comprar: empresas especializadas. No exemplo, aparelho cedido pela Soletrol. Tel.: 0800-112274
 
Geradores a diesel
Custo:
de R$ 10 mil (10 kVA) a R$ 100 mil (450 kVA)
Locação (mensal): de R$ 1 mil (10 kVA aberto) a R$ 16,5 mil (400 kVA silenciado)
Funcionamento: a energia é gerada pelo óleo diesel (há também modelos a gás natural ou a gasolina). Para residências, o modelo de 10 kVA é o ideal. Há também geradores abertos e os silenciados. A potência máxima dos grupos geradores produzidos no Brasil chega a 450 kVA. Esses são ideais para indústrias Onde comprar/alugar: fábricas do ramo. No exemplo, aparelhos cedidos pela Montesp. Tel.: (11)6910 6634
Vantagens: ligado à chave geral, alimenta todas as correntes elétricas
Pontos negativos: se não houver silenciador, o barulho é quase ensurdecedor
 
Lampião a gás ou a pilha
Custo da pilha:
de R$ 30 a R$ 40
gás de cozinha: cerca de R$ 22 – o bujão de 2 kg é vendido separadamente e custa cerca de R$ 20
gás butano: de R$ 47 a R$ 80 – o bujão de 190 g custa R$ 5
Onde comprar: lojas de artigos para camping e supermercados. No exemplo, produto da loja Wal Mart . Tel.: (11)6915 3700
Vantagens: não faltará luz enquanto houver pilha ou gás – no mínimo nove horas e no máximo 30
Pontos negativos: os que funcionam com gás de cozinha têm o risco de vazamento e são difíceis de carregar (pesam um pouco mais de 2 kg)
 
Sensores de presença e minuterias
Custo:
de R$ 40 a R$ 60 Funcionamento: os sensores são instalados ao lado do interruptor e a minuteria o substitui. Nos dois casos, pode-se programar o tempo em que a luz deve ficar acesa
Onde comprar: lojas de materiais elétricos. No exemplo, produtos cedidos pela Elétrica Van 2000 – Rua Santa Ifigênia, 159 – São Paulo/SP
Vantagens: pode-se dormir com a luz do quarto acesa ou esquecer de apagar a lâmpada da sala antes de sair. O sensor capta o último movimento humano no ambiente e desliga a iluminação depois de um período que varia de 30 segundos a 12 minutos

 

 
Lâmpadas fluorescentes econômicas
Custo:
de R$ 10 a R$ 50

Onde comprar: lojas de materiais elétricos. No exemplo, produtos cedidos pela Elétrica Van 2000
Vantagens: as lâmpadas fluorescentes são 80% mais econômicas que as incandescentes e mais duráveis.
Pontos negativos: o custo é dez vezes mais alto. Uma incandescente custa cerca de R$ 1
 
No break
Custo: o mais simples custa cerca de R$ 200 (para micro-computadores de uso doméstico)
Funcionamento: o aparelho é ligado ao computador e, quando a energia cai, o computador permanece ligado por no mínimo cinco minutos – depende do modelo do no break Onde comprar: lojas de artigos para informática
Vantagens: ficar livre da desagradável sensação de perder algum documento num blecaute repentino
 
Microgerador de luz
Custo:
R$ 69,97
Funcionamento: o abajur – que já vem com uma lâmpada fluorescente e tem entrada para outra incandescente – funciona normalmente ligado na tomada, enquanto uma bateria interna está sendo carregada. Se faltar energia elétrica, a bateria é acionada e o aparelho permanece aceso de três a seis horas Onde comprar: supermercados Wal Mart
Vantagens: funciona de qualquer jeito – com energia elétrica e com bateria reciclável e recarregável
Pontos negativos: o abajur não pode ser utilizado somente na falta de energia. Para ficar aceso por seis horas, é necessário deixá-lo na tomada durante, no mínimo, 20
 
Velas
Custos: a alternativa mais simples e barata para o apagão é a vela, ou melhor, o fogo. Os preços variam de acordo com o tamanho. O pacote com três velinhas, cada qual com 12 horas de duração, custa, em média, R$ 1,70. Já uma embalagem com seis unidades da número 8, uma das mais compridas, sai por R$ 4, e um pacote com oito unidades da mais tradicional, a número 6, que dura pouco menos de um dia, tem preço médio de R$ 1,50