DANIELA THOMAS

ALEXANDRE SANT'ANNA/AG. ISTOÉ

Meirelles leva o seu globalizado Ensaio sobre a cegueira

JAYME CARVALHO JR.

Salles concorre com Linha de passe, tema bem brasileiro

Na disputa pelo Oscar de melhor filme estrangeiro, Central do Brasil, de Walter Salles, teve como pedra no caminho A vida é bela, do italiano Roberto Benigni. Mais recentemente, a torcida pela consagração de uma produção nacional na maior premiação do cinema aumentou com Cidade de Deus, de Fernando Meirelles, que concorreu a quatro estatuetas, entre elas a de melhor diretor. Ele perdeu para o neozelandês Peter Jackson. Na próxima edição do Festival de Cannes, que começa na quarta-feira 14, Salles e Meirelles, os dois mais bem-sucedidos cineastas DIVULGAÇÃObrasileiros, desta vez estarão concorrendo entre si pela Palma de Ouro – o primeiro com o drama social Linha de passe, que custou pouco e reúne atores jovens e desconhecidos, o segundo com o caro e globalizado Ensaio sobre a cegueira (escolhido para abrir o evento), inteiramente falado em inglês e estrelado por grandes nomes de Hollywood, como Julianne Moore e Mark Ruffalo. Na verdade, poderia estar ocorrendo o contrário, já que Salles assina freqüentemente produções internacionais e Meirelles costuma se dedicar a projetos voltados a temas brasileiros. Como acontece poucas vezes em festivais, o Brasil joga agora em duas frentes, oferecendo um filme com cara de independente e outro com perfil de cinema de arte. Para qualquer lado que pender o gosto do júri, presidido por Sean Penn, as chances serão, no entanto, exatamente as mesmas, sobretudo no que diz respeito a sua influência: ele já declarou que aprecia tanto o trabalho de Walter Salles quanto o de Fernando Meirelles.

ALEXANDRE BAXTER

BEM NA ESTRÉIA

O ator Matheus Nachtergaele já trabalhou com Salles e Meirelles e segue agora o passo dos dois mestres. Seu primeiro trabalho, A festa da menina morta (à esq.), está na mostra paralela de Cannes

Dentre a obra de Meirelles, o presidente do júri gosta especialmente de Cidade de Deus. Além dessa empatia, ele conhece bem a trama de Ensaio sobre a cegueira, baseado na obra homônima de um dos maiores nomes da literatura portuguesa, o escritor português José Saramago. Trata- se de uma metáfora sobre a resistência humana em enxergar a realidade e teve muitas cenas rodadas em São Paulo. Há, aqui, uma curiosidade que o Brasil leva a Cannes no campo das locações: os dois filmes fogem da tendência atual de só se exibir o Rio de Janeiro e a sua violência urbana e se valem de regiões e ruas paulistanas como cenários. Linha de passe, co-dirigido por Daniela Thomas, é centrado, por exemplo, numa família pobre da zona leste da cidade. Um de seus personagens, Dario, é interpretado por Vinícius de Oliveira, justamente o então menino de Central do Brasil. Como já foi dito, nem com esse filme nem com Cidade de Deus o Brasil carregou o Oscar. Agora, concorrendo em dose dupla, tem muitas chances de levar a Palma.