Quem nunca se sentiu culpado ao render-se à deliciosa tentação provocada por doces maravilhosos, fartos bocados de picanha e aquela pizza quatro queijos derretendo? Passar vontade pode ser ruim, mas ceder à gula e padecer de remorsos pela falta de resistência diante da comida é bem pior do que se imagina. É o que pesquisadores da Universidade de Hull, na Grã-Bretanha, concluíram em estudo que analisou amostras de saliva de pessoas que provaram diversos tipos de alimento e bebida. O resultado do trabalho indicou que houve queda no nível de imunoglobina, substância que defende o corpo de agentes externos causadores de doença, em pessoas que ficaram com peso na consciência por terem aproveitado os prazeres culinários. Ou seja, elas ficaram mais vulneráveis à ação de vírus e bactérias. Dentro desse grupo, os que consumiram doce foram os campeões da baixa resistência.

A culpa por exagerar nas guloseimas é apenas um lado dessa angustiante moeda do controle da alimentação. A outra sequela desse comportamento é controlar demais as calorias ingeridas. Depois que se tornou obrigatória a presença de informações nutricionais na embalagem dos alimentos industrializados, há dois anos, não há quem não dê uma espiadinha na tabela calórica. Entre muitos consumidores, o hábito virou mania. Para o coordenador do centro de transtornos alimentares do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas, Takí Cordás, essa espécie de neurose nacional, representada pela busca por dietas prontas, não é brincadeira. Segundo ele, a população não está consciente da necessidade de uma reeducação alimentar, preferindo seguir regimes absurdos ou simplesmente fechar a boca. “Os índices de bulimia, anorexia, depressão e distúrbios psiquiátricos relacionados a problemas alimentares não param de crescer. As pessoas estão cada vez mais longe dos centros habilitados para tratamentos, o que as empurra cada vez mais para um quadro de patologia”, garante.

A estudante Camila Fasanella, 17 anos, procurou auxílio psicológico para se relacionar melhor com a alimentação. “Precisava perder seis quilos, emagreci 20. Se continuasse daquele jeito, a coisa ia ficar feia”, conta. Camila, no entanto, ainda controla a alimentação, conferindo a quantidade de calorias antes de comprar alguma coisa para comer e fugindo do seu maior inimigo: a gordura. Ela acredita que cortar a quantidade de óleo na comida é a solução para uma vida mais saudável e para diminuição do peso. Não é tão simples assim. A nutricionista Mirtes Stancaneli afirma que ser saudável está longe de ser chato ou neurótico e que certos mitos precisam ser derrubados. Segundo ela, guiar-se pelas calorias de um alimento pode ser prejudicial. “Em primeiro lugar, é preciso entender o que são calorias, gorduras, carboidratos e proteínas. Depois é necessário equilibrar a quantidade de calorias ingeridas com a quantidade de exercício que se faz. Esse é o truque para a perda de peso”, revela. Mirtes ainda ressalta que a gordura não deve ser inimiga de ninguém, já que ela é importante para o corpo. De acordo com a nutricionista, até 30% do cardápio diário pode ser composto de gorduras sem que isso afete o peso.

Excessos – Para a psicóloga Rejane Sbrissa, especialista em obesidade, o problema da mania de controlar as calorias é que ela vai se expandindo com o tempo. Todo mundo começa comprando produtos lights, depois passa a cortar as gorduras e logo a se punir ao cometer o que considera excessos. “Muita ginástica, muita comida e muita paranóia são nocivos à saúde”, diz. Foi o que aconteceu com a estudante Mariana Castro, 21 anos. Aos 16, fez dieta para emagrecer e durante um ano esqueceu do resto. Tudo se resumia a contabilizar as calorias e nunca passar de mil por dia. Quando ultrapassava esse limite, sofria com a culpa e tentava compensar no dia seguinte.
O administrador Ibere Benutti, 28 anos, decidiu colocar saladas como prato principal de seu cardápio diário. “Às vezes me pergunto se estou paranóico. Para não pirar, caio de boca quando estou com muita vontade de algo e nem lembro das calorias e gorduras”, confessa. Já a jornalista Clélia Bueno, 26 anos, manteve durante muito tempo uma tabela de calorias na bolsa. “Não que eu deixasse de comer ao conferir certos absurdos calóricos. Mas precisava saber o quanto estava comendo”, explica. Hoje, ela conhece a maioria dos dados de cor e é capaz de assustar os menos avisados com informações como o total de calorias propiciadas por um BigMac ou um Diamante Negro. Aliás, para quem ficou curioso, essas delícias equivalem, nada mais, nada menos, a 700 e 110 calorias, respectivamente. Se estiver dentro de seus critérios, pode se esbaldar. Sem culpa.

Saudável ou neurótico?
Faça o teste para descobrir se sua preocupação com o que você come está se tornando saudável ou o levando à loucura
1) Você está num bar com amigos, eles resolvem pedir uma porção de provolone à milanesa, que você adora. Como você reage?
a) Sem grilo, você não come pensando na sua dieta saudável
b) Não come e faz questão de contar para os outros o quanto o petisco oleoso faz mal
c) Come sem peso na consciência e se delicia com a porção
d) Come, mas tenta sentar o mais longe possível do prato para não cair na tentação várias vezes porque cada bolinha pesa na sua consciência
2) No final de semana você exagerou, caiu de boca nos doces, pizzas e gorduras. Na segunda-feira, você:
a) Acorda bem e até lembra do exagero, mas fica feliz por ter comido coisas gostosas
b) Tenta contabilizar as calorias consumidas e deixa de ir almoçar com os colegas para ir à academia
c) Compensa na alimentação cortando as coisas mais pesadas
d) Come mais ainda de raiva por ter exagerado
3) Seu melhor amigo resolve fazer uma surpresa e prepara vários pratos que você adorava comer na adolescência: picanha, tutu de feijão, batatas fritas, lasanha quatro queijos e com direito a torta de chocolate com sorvete de creme de sobremesa. Como você reage?
a) Come com moderação até ficar satisfeito, evitando exageros e constrangimento do amigo
b) Come sem exageros, mas a vontade de se esbaldar faz com que você reclame da quantidade de gordura presente na comida
c) Cai de boca e se delicia lembrando dos velhos tempos. Sem culpa
d) Quando descobre o cardápio fica num dilema terrível, acaba comendo, mas volta para casa a pé de tanto peso na consciência

RESPOSTA:
Some os pontos de cada questão e veja onde você se encaixa
1-a 0 ponto
1-b 4 pontos
1-c 0 ponto
1-d 4 pontos
2-a o ponto
2-b 5 pontos
2-c 3 pontos
2-d 6 pontos
3-a 0 ponto
3-b 2 pontos
3-c 0 pontos
3-d 5 pontos

1) 0 a 5 – Ótimo! Independentemente de sua dieta ou hábito alimentar, você está sabendo aproveitar os prazeres da mesa sem brigar com sua consciência. Apenas preste atenção para não exagerar sempre
2) 6 a 10 – Você está paranóico, é verdade, mas fique atento. Tenha em mente que mais do que ter hábitos saudáveis é preciso estar de bem com a sua atitude
3) 11 a 15 – Você está na linha vermelha! Cuidado. Sua própria sintonia não anda bem, você pode tanto estar virando o chato da dieta junto aos amigos, como fazendo mal a sí mesmo por sentir tanta culpa. Tente equilibrar o que você pensa e o que você come. Você verá como comer pode ser mais prazeroso sem que necessariamente você esteja fazendo mal a sua saúde.