10/05/2000 - 10:00
Descendente de espanhóis que no início do século se estabeleceram no Pontal do Paranapanema (SP) alugando carroças para o transporte de dormentes, Almir Guedes Soriano, o novo presidente da União Democrática Ruralista (UDR), é um homem pragmático e não carrega em seu currículo nenhuma história de militância partidária. Nem sequer na Unesp de Jaboticabal, onde se formou em Engenharia Agrônoma, Soriano envolveu-se em política. Essa falta de antecedentes, porém, é inversamente proporcional à disposição que esse pequeno produtor rural de 40 anos de idade tem de enfrentar o que define como os dois maiores adversários do desenvolvimento brasileiro: o governo de Fernando Henrique Cardoso e o MST. “Nosso principal inimigo é o governo de FHC. Ele governa para o FMI e os Estados Unidos, e não para os brasileiros”, diz. “Já o MST é a prova concreta de que no País o crime compensa. Trata-se de uma organização revolucionária, que se coloca acima das leis e ameaça a democracia brasileira.”
Soriano herdou o Sítio São Pedro, uma propriedade de 100 hectares em Mirante do Paranapanema, onde mantém 250 cabeças de gado e faz cruzamentos industriais com matrizes de Nelore. Para sustentar os dois filhos, de 13 e 10 anos, ele conta com o auxílio dos rendimentos de sua mulher, uma dentista. Sua gestão à frente da UDR deverá marcar uma nova fase da entidade, mais aberta aos pequenos produtores e com propostas que vão além dos embates com o MST. Da antiga entidade resta a implacável defesa do direito de propriedade. “Não iremos tolerar nenhum tipo de invasão. Vamos fazer valer o Código Civil, que legitima a defesa da propriedade e, se a defesa da terra precisar ser feita com armas, ela será na bala”, desafia. “Não podemos, no entanto, limitar nossas atividades ao confronto com o MST. Vamos arregimentar os pequenos proprietários e mostrar para a sociedade que queremos, na verdade, uma política agrícola voltada para os interesses nacionais, e não essa política entreguista, que coleciona vítimas econômicas e sociais.”
Revolta – O novo líder ruralista teve sua primeira experiência política em 1996. Na época, ele passou a acreditar que os problemas dos pequenos proprietários não estavam situados da porteira para dentro. Soriano apostava no plantio do algodão. O problema é que o governo facilitou a importação do algodão chinês e quebrou o produtor nacional. Revoltado, ele procurou o Sindicato Rural de Presidente Venceslau – órgão que hoje preside – e ajudou a organizar o caminhonaço que se dirigiu a Brasília. “Lembro que consegui lotar um ônibus. Foi a primeira vez que estive em Brasília. Quando olhei aquilo conclui: ‘Esse povo aqui não quer saber da gente não.’” Quatro anos depois, no sábado 29, Soriano assumiu a presidência da UDR e, devido às manifestações dos sem-terra em todo o País, não teve tempo para cerimônias. São-paulino e fã de motocicletas, Soriano explicou a nova postura dos ruralistas. “Não somos contra a reforma agrária, mas entendemos que o governo está fazendo uma favelização do campo. Somos contra isso. No mundo, não há mais lugar para a pequena propriedade”, afirma. “O governo tem gasto muito dinheiro com o MST, mas gasta errado.
Não resolve nem o problema econômico nem o social. Como está, não estimula cooperativas para escoar a produção excedente.”
Uma das principais tarefas dessa nova UDR, segundo Soriano, será a denúncia do que chama de “reforma agrária demagógica”. Para isso, ele tem feito contatos com diversos parlamentares ruralistas – uma bancada que ele estima em 150 membros, mas que pode chegar a somar 250 votos no Congresso. Esses contatos acabam se transformando em audiências públicas. Nessas conversas, os deputados têm recebido informações sobre supostos superfaturamentos nas desapropriações feitas pelo Incra. “Nosso objetivo é promover uma CPI da Reforma Agrária”, conta. “Será a maneira mais didática de mostrar para todo o Brasil como o governo jogou fora mais de R$ 5 bilhões e não garantiu renda nem produção.”
Soriano se define como um brasileiro arrependido. Ele lembra que votou em FHC e se considera traído. “Ele não é o presidente do Brasil. É o defensor dos interesses americanos e isso está arruinando a vocação agrícola brasileira. Nossas pesquisas indicam que, para cada assentado, nove filhos de produtores rurais abandonam o campo”, diz. Para o presidente da UDR, a razão disso tudo está na falta de uma política específica para o setor. “FHC e sua turma defendem uma globalização de mão única. Internamente, competimos com produtos estrangeiros altamente subsidiados e, lá fora, muitos países impõem barreiras alfandegárias para nossa produção”, explica, num discurso muito parecido com o do MST.