AVANÇO Método inovador é estudado por cirurgiões de Brasil, França e Estados Unidos

Sem nenhum corte e com recuperação mais rápida, uma nova técnica conhecida como Notes (do inglês Natural Orifice Translumenal Endoscopic Surgery) promete causar uma grande transformação nas cirurgias convencionais. A técnica aproveita os orifícios naturais do corpo humano, como a boca e o canal da vagina, para inserir instrumentos delicados e abrir caminho com pequenos cortes no interior do organismo até chegar aos órgãos que precisam ser tratados. A primeira paciente do mundo a ser submetida ao método inusitado foi a carioca Neusa Maia, 43 anos, uma auxiliar de enfermagem atendida no Hospital das Clínicas de Teresópolis, no Rio de Janeiro. “Quando eu cheguei ao hospital para tirar a vesícula, não podia imaginar que passaria por uma cirurgia tão diferente”, diz.

Neusa ficou mais surpresa por não sentir dores no pós-operatório. “Nem precisei tomar analgésico. Dois dias depois já estava segurando meu neto no colo. Ele tem dois anos e pesa 13 kg”, comemora. Para remover o órgão, os médicos introduziram, pelo canal da vagina, algumas pinças especiais e um endoscópio, aparelho de exames que transmite imagens do organismo para uma tela de vídeo. Depois fizeram pequenos furos nas paredes do canal para alcançar a vesícula. Desse modo, cortaram menos camadas de tecido do que pelo processo usual. “A operação durou apenas uma hora e meia e foi um sucesso”, diz o cirurgião Ricardo Zorrón, que realizou o procedimento. Ele lidera as pesquisas na Universidade Federal do Rio de Janeiro e no Hospital Eits Ircad, na França. Além de fazer duas cirurgias, experimentou o desempenho do Notes na coleta de tecidos para diagnóstico de um tumor de ovário. “O resultado foi bom”, revela.

Considerado um procedimento experimental, ou seja, que ainda precisa ser muito estudado para virar rotina, o método Notes de cirurgia começa a ser avaliado também em hospitais como Albert Einstein e Pérola Byington, em São Paulo. Por enquanto, sua indicação está restrita ao tratamento da vesícula. Mas as possibilidades não se encerram aí. Importantes centros avaliam sua utilização nas cirurgias de remoção de apêndice e de redução do estômago realizada em obesos. No Hospital Johns Hopkins, nos Estados Unidos, onde o método é investigado desde 2004, avalia-se como fazer a intervenção sem cortes pelo ânus e pela uretra.

O procedimento representa um passo à frente em relação à laparoscopia, hoje considerada a cirurgia menos agressiva e cada vez mais usada no centro cirúrgico. Enquanto a laparoscopia exige quatro pequenos cortes na superfície do abdome para inserir câmeras e pinças, o Notes dispensa incisões na pele. Segundo os especialistas, isso elimina cicatrizes, diminui o risco de infecções, elimina as dores no pós-operatório e reduz o tempo de recuperação. Com a laparoscopia, a paciente que tirou a vesícula levaria, em média, 15 dias para voltar à vida normal. Pela Notes, esse período foi de 48 horas. Como o recurso também abrevia o período de internação, acredita-se que pode ter impacto positivo no bolso.

Otimista, Zorrón prevê um futuro promissor para a técnica que está aprimorando. “É a maior revolução ocorrida desde a descoberta da anestesia, no século XIX, e da laparoscopia, realizada a partir de 1987”, avalia. Em dez anos, acredita ele, as cirurgias com o método serão feitas por robôs, com o médico na sala ao lado. Mas há quem seja mais comedido. “É um recurso interessante, mas ainda precisa ser aperfeiçoado e depois testado em grande número de pessoas”, diz José Reinan Ramos, presidente do Colégio Brasileiro de Cirurgiões.

AS VANTAGENS DA TÉCNICA
 

• Não deixa cicatrizes na pele

 

• Não há necessidade de fazer curativos

 

• A alta hospitalar é dada em dois dias

 

• O paciente não sente dor no pós-operatório

 

• Muitas vezes, não é preciso tomar analgésicos

 

• Por não haver cortes, há menor risco de infecções

 

• Pode-se fazer atividade física após 48 horas

 

• Os custos podem ser menores