18/04/2007 - 10:00
Houve época em que nos bancos escolares se aprendia a cultuar os chamados heróis da Pátria. Figuras como Tiradentes, dom Pedro I, o duque de Caxias e a princesa Isabel, entre outros, eram pintados como patriotas exemplares e seres imaculados. Com o fim do regime militar, muitos desses mitos começaram a ser relativizados; alguns foram totalmente derrubados de seus pedestais. Talvez o caso mais famoso seja o de Domingos Jorge Velho, no passado tido como símbolo da audácia bandeirante e hoje visto como um reles bandoleiro que chefiou a malta que em 1695 destruiu o quilombo dos Palmares e matou Zumbi. Este, por sua vez, mercê do movimento negro, passou a ocupar o lugar da princesa Isabel no panteão nacional dos heróis.
Visões hegemônicas forjam mitos históricos. Se a Holanda tivesse vencido os portugueses no Nordeste no século XVII, nosso herói não seria Matias de Albuquerque, mas Domingos Fernandes Calabar, senhor de terras e contrabandista que traiu os portugueses e se passou para o lado dos batavos. Nos anos 20, como mostrou o historiador Celso Castro, o Exército instituiu o culto oficial a Caxias, em substituição ao culto espontâneo da tropa pelo general Manuel Luís Osório, o maior herói da Guerra do Paraguai. A imagem do “pacificador” serviria como um antídoto contra a indisciplina militar. Posteriormente, a partir do Estado Novo, a figura de Caxias passou a ser identificada à idéia de fusão do Exército com a Nação.
Tiradentes, contudo, é o mais poderoso e universal de nossos mitos. Ele foi reivindicado por republicanos, monarquistas, direita e esquerda. Pesquisas recentes revelaram um personagem contraditório, imperfeito, ao contrário do que pretende a hagiografia oficial. Demasiado humano, demasiado brasileiro. Felizmente, um herói em carne e osso, não o modelo positivista de virtude perpetuado em sombrias estátuas de bronze.