Instabilidade econômica e política quase sempre andam juntas, como ensina a história. A Itália é uma eloquente prova disso. Com o Produto Interno Bruto em queda e um índice recorde de desemprego, os italianos tiveram nos últimos três anos nada menos do que três primeiros-ministros. O quarto assumiu na semana passada. Trata-se do centro-esquerdista Matteo Renzi, ex-prefeito de Florença que, aos 39 anos, se tornou o mais jovem premiê do país. Renzi chama a atenção pela velocidade com que chegou ao poder e pelo estilo pouco convencional. Há dois anos ele era um político florentino conhecido apenas regionalmente. Ganhou relativa fama ao abandonar os carros oficiais e ir ao trabalho a pé ou de bicicleta. Também fez certo barulho ao disparar frases de efeito (“É preciso jogar 90% dos políticos italianos na lata do lixo” foi uma delas), mas seu golpe de mestre começou a ser aplicado em dezembro do ano passado, quando assumiu a secretaria nacional do Partido Democrático (PD). Desde então, Renzi passou a bombardear publicamente o primeiro-ministro Enrico Letta, até obter uma moção de sua legenda exigindo um novo governo. Candidatou-se à vaga de Letta e obteve da Câmara Alta 169 votos favoráveis à sua indicação ao comando do governo parlamentarista.

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MARQUETEIRO
Renzi ficou conhecido por trocar os carros oficiais por bicicletas

Renzi é dono de um estilo político em que o popular e o populismo se misturam. Como prefeito de Florença, aposentou os comunicados oficiais e passou a interagir diretamente com a população por meio de redes sociais. Em um país com uma população cansada da classe política, nomeou um ministério formado por nomes pouco conhecidos. Ao evitar estrelas, evita dividir os holofotes ou dar visibilidade a futuros opositores. Uma das poucas concessões foi acatar o pedido do presidente Giorgio Napolitano, que indicou Pier Carlo Padoan para o comando da Economia. Apesar de dizer que vai desencadear profundas transformações no país, Renzi é um pragmático. Para governar até 2018, conforme planeja, precisa atrair o maior número de legendas. O novo primeiro-ministro já acenou para lideranças de diversos espectros, como o chefe da legenda Força Itália, Silvio Berlusconi. Expulso do Senado após uma série de polêmicas e uma condenação por fraude fiscal, o ex-premiê já deu declarações simpáticas ao centro-esquerdista. “Ele tem a metade de minha idade e isso é um bom sinal para o futuro do país e para sua classe dirigente”, comentou Berlusconi.

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DISCRETA
"Por favor, façam como se eu não existisse",
disse a primeira-dama Agnese Landini a jornalistas

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PARCEIRO?
Até o ex-premiê Silvio Berlusconi andou elogiando Renzi,
hábil em se aproximar de políticos de várias tendências

Espalhafatoso na política, Renzi é discreto na vida privada. Isso se deve em grande medida ao perfil de sua mulher, uma professora substituta de literatura de 37 anos. Avessa a joias e maquiagens e fã de calça jeans e camiseta, Agnese Landini é uma espécie de antiprimeira-dama, especialmente num país como a Itália. Quando não está na escola, passa quase todo o tempo em casa, cuidando dos três filhos – de 12, 10 e 7 anos. Recentemente, ao ser abordada por jornalistas, saiu-se com esta: “Este é o momento de Matteo. Por favor, façam como se eu não existisse.” As preocupações de Renzi estão agora direcionadas à situação econômica do país, mergulhado em um endividamento acima de 130% do PIB, uma das taxas mais altas da Europa. Para frear a crise, o primeiro-ministro disse que pretende reduzir a carga tributária e mudar a legislação trabalhista. O discurso é bonito, mas realizar as tais mudanças não é tão simples assim. Resta saber se Renzi será mais um falastrão de talento ou um político transformador de verdade.

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Fotos: Reuters/Tony Gentile; Rropi/Zumapress/Glow Images; Andreas Solaro/AFP