14/02/2014 - 20:50
Em sua primeira semana como presidenta do Federal Reserve (Fed), o Banco Central dos Estados Unidos, a nova-iorquina Janet Yellen, 67 anos, causou estragos à reputação do Brasil. Em um extenso relatório enviado ao Congresso americano, o Fed classificou a economia brasileira como a segunda mais vulnerável entre os países emergentes, à frente apenas da Turquia e atrás de nações como Índia, Indonésia e África do Sul. Segundo o documento, que faz 11 citações ao Brasil, a fragilidade se deve a fatores como inflação em alta e crescimento econômico baixo – os mesmos indicadores que têm causado preocupações à presidenta Dilma Rousseff. O Banco Central brasileiro, no entanto, questiona o relatório e afirma que “as referências sobre o Brasil revelam defasagem sobre a percepção do País”.
CENÁRIO PREOCUPANTE
Relatório do Banco Central americano, presidido por Janet Yellen, colocou o Brasil
como o segundo país mais vulnerável entre os emergentes. Para Marco Stefanini,
CEO da Stefanini, uma das empresas brasileiras mais internacionalizadas,
a visão otimista que os empresários tinham do País mudou
A avaliação do Fed surpreende porque foi a mais contundente crítica à economia brasileira em muito tempo. Nos últimos anos, o avanço do País em diversas áreas – a redução da desigualdade e o aparecimento de uma nova classe média, para citar apenas alguns exemplos – foi reconhecido e até festejado pela comunidade internacional. De certa forma, o Brasil se tornou queridinho de diversos mercados e passou a ser cobiçado por investidores de inúmeros países. Em um período de dez anos, o País bateu seguidos recordes na captação de dinheiro estrangeiro, um sinal inequívoco da nova força da economia nacional. Agora, porém, a credibilidade conquistada a duras penas parece estar ameaçada, como demonstrou o relatório do Fed. Resultado: o dinheiro de fora começa a minguar. De acordo com o Banco Central, em 2013 as empresas estrangeiras investiram US$ 41,6 bilhões no Brasil, ou US$ 11 bilhões a menos do que em 2012.
A mão inversa revela o outro lado desse fenômeno. Em 2013, o volume de dinheiro desembolsado por multinacionais brasileiras no Exterior dobrou: foram US$ 14,7 bilhões em 2013, ante US$ 7,5 bilhões em 2012. O que explica isso? “Existe hoje uma confiança maior no cenário internacional do que no nacional”, afirma André Sacconato, diretor de Pesquisa da Brasil Investimentos & Negócios (Brain). “Os empresários estão mais reticentes com os rumos da política econômica do governo.” A mesma avaliação é compartilhada por Luís Motta, sócio da consultoria KPMG. “Há um cenário de menor risco lá fora”, diz Motta. Presidente da Sociedade Brasileira de Estudos de Empresas Transnacionais e da Globalização Econômica (Sobeet), Luís Afonso Lima vai direto ao ponto. “Os empresários estão buscando no Exterior alternativas para a redução da demanda no mercado interno”, diz ele.
Não faltam casos de multinacionais brasileiras que estão ampliando sua atuação internacional. Uma das maiores empresas de alimentos do mundo, a BRF inaugurou em dezembro passado uma fábrica nos Emirados Árabes Unidos, ao custo de US$ 120 milhões. Presente em 30 países e terceira empresa brasileira mais internacionalizada segundo ranking elaborado pela Fundação Dom Cabral, a multinacional de serviços de TI Stefanini tem planos para incluir a Ásia na sua rota estratégica. CEO da empresa, Marco Stefanini afirma que a percepção que tem do País não é mais a mesma. “Sempre tive uma visão otimista do Brasil, mas agora estou mais cauteloso”, diz. Segundo ele, investir no Exterior não significa, pelo menos por enquanto, reduzir aportes no Brasil.
O setor financeiro é um retrato preciso da busca de oportunidades no Exterior. No fim de janeiro, o Itaú Unibanco selou um acordo de fusão com o banco chileno CorpBanca. O BTG Pactual, do banqueiro André Esteves, inaugurou recentemente uma unidade no México. “Queremos ser um líder relevante na América Latina”, diz Mateus Carneiro, que coordena os negócios do banco nessa região. Ter gigantes multinacionais é saudável para qualquer nação, mas o que deve estimular o ímpeto das empresas não é a falta de oportunidade em seu país de origem. O cenário precisa mudar – inclusive para influenciar a opinião de pessoas como a americana Janet Yellen.
Fotos: Cliff Owen/AP Photo; Ana Paula Paiva/Valor/Folhapress