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empre que encontra um turista nas suas andanças pela cidade, Olavo Drummond vai logo oferecendo um aperto de mãos e se apresentando como prefeito. Aos 74 anos, o grande orgulho do ex-ministro do Tribunal de Contas da União é ser administrador de sua terra natal, Araxá, cidade de 80 mil habitantes, a 374 quilômetros de Belo Horizonte. Após 50 anos de vida pública, o prefeito decidiu aposentar-se com o fim do mandato, em dezembro deste ano, apostando todas as suas fichas na tentativa de barrar a instalação de uma fábrica de ácido sulfúrico e fosfórico na cidade. “Fiz coisas muito importantes na vida e não quero acabar assim, carregando para sempre a culpa de ter destruído minha cidade”, diz ele. Desde já afirma que vai negar o alvará necessário à empresa. O prefeito acredita que as águas sulfurosas da região, onde a lendária figura de Dona Beja, em meados do século XVIII, tomava banhos nua, estarão ameaçadas pela fábrica. Drummond teme pela vocação turística de Araxá. A principal atração da cidade é o Parque Termal do Barreiro, lugar escolhido pelo presidente Getúlio Vargas para abrigar o Grande Hotel, inaugurado em 1944 e cujo cassino atraiu muita gente até 1946, quando o jogo foi proibido. Fechado em 1991, o hotel foi entregue à iniciativa privada em 1998 e está em reformas, mas promete ser a grande fonte de arrecadação de Araxá quando reabrir.
O alvo da prefeitura é a empresa de fertilizantes agrícolas Serrana, líder do mercado brasileiro, que há 30 anos tem uma unidade em Araxá e chega a empregar 700 pessoas no auge da produção. Para baratear os custos, a Serrana quer fabricar o ácido sulfúrico, matéria-prima para a produção de fertilizantes, dentro de seu complexo industrial. Desde sua inauguração, a empresa compra o ácido de outros municípios e chega a receber até uma carreta do produto por hora. “O risco de um caminhão destes tombar na cidade é muito maior que o de vazamento de uma fábrica”, alega Roberto Busato, diretor industrial da Serrana e o atual inimigo número 1 de Drummond. O prefeito rebate: “Eles querem fazer esta fábrica a 2,5 quilômetros do Grande Hotel. Além da garoa ácida, que vai deteriorar a construção, os turistas terão de conviver com a vista e o cheiro da chaminé.” A distância apontada pelo prefeito é contestada pela Serrana. Munido de fotos por satélite, Busato diz que a distância exata é de 4,5 quilômetros. “Até na possibilidade de os turistas avistarem a chaminé nós pensamos. De acordo com o projeto, ninguém vai ver nada de lá”, afirma.

Promessas – Aparentemente, a Serrana saiu ganhando. Cumpriu todos os requisitos legais para obter a licença e promete iniciar as obras até abril. Durante o ano de 1999, a Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam), soberana na decisão de permitir ou não a instalação, exigiu esclarecimentos da empresa. “Estou tranquilo em afirmar que eles cumpriram todas as exigências técnicas e legais e por isso nosso parecer foi favorável”, diz José Cláudio Ribeiro Junqueira, presidente da Feam. A Serrana também tem a seu lado parte da população araxaense, cuja maioria apóia o projeto. “Eles estão sendo enganados com promessas de empregos. Meu povo confunde ácido sulfúrico com suco de laranja”, reclama Drummond, que questiona ainda o processo de licenciamento da Feam.
A alternativa sugerida à Serrana pelo prefeito é a construção de um duto para o transporte do ácido. Assim, a fábrica poderia ficar a mais de dez quilômetros do Grande Hotel. Mas a empresa nem cogita da hipótese. “É mais dispendioso e os riscos de vazamento de um duto são grandes, ao contrário da fábrica. A tecnologia é avançada e dificilmente acontece algum acidente”, diz Busato. A pedido da Prefeitura de Araxá, a Embratur vai realizar os levantamentos necessários para transformar a região em local de interesse turístico, o que dificultaria os planos da Serrana. Procurado pelo prefeito, o deputado Fernando Gabeira (PV-RJ) também está auxiliando na empreitada. “Estou do lado dele porque acho que a fábrica terá um impacto negativo sobre a cidade, que depende do turismo”, diz.