25/01/2006 - 10:00
Em tempos de Big Brother, não anda fácil a vida dos naturistas, que querem ir à praia sem roupa, mas com privacidade. Em Abricó, única praia oficial de naturismo do Rio de Janeiro, a associação que representa seus 255 associados decidiu contratar seguranças particulares para impedir que os com-roupa entrem ou espionem seu reduto. Usando apenas bonés e óculos escuros, dois “xerifes” têm a função de zelar pela moral e pelos bons costumes no território. Contratados para guardar a praia pelo menos até o fim do verão, eles têm na sua mira, além dos bisbilhoteiros de sempre, exibicionistas que querem transformar a praia paradisíaca em ponto de namoro.
“A função principal é preservar a ética naturista e dar tranqüilidade aos freqüentadores”, explica um dos líderes do movimento, o professor de educação artística Pedro Ribeiro, 47 anos. “Estamos cercados de curiosos. De um lado, os voyeurs, que buscam o melhor ângulo para nos espionar. De outro, os exibicionistas, que fazem sexo na praia quando ela está mais vazia. O que acaba atraindo mais voyeurs”, angustia-se Pedro, editor do site naturista Olho nu. Os seguranças de Abricó também têm orientação para manter os bons modos entre os naturistas, particularmente os novatos, que desconhecem regras de boa convivência, como evitar olhares insistentes na direção alheia, nunca filmar ou fotografar e disfarçar ereções mergulhando na água.
A Associação Naturista de Abricó (ANA) diz que sua guarda particular serve para cobrir a omissão do poder público. Únicos autorizados a entrar em Abricó com roupa, policiais militares e guardas municipais nunca são vistos na área. Os naturistas também reclamam que a prefeitura não colocou até hoje no local placas indicando que a praia é reservada, por lei, para a prática de naturismo. A prefeitura promete instalar as placas em breve e ainda plantar mudas de vegetação de restinga no limite entre a praia e a estrada que a margeia, uma forma de dar maior privacidade aos banhistas. Símbolo da luta pelo direito de ir à praia sem roupas, Abricó, no Recreio dos Bandeirantes, zona oeste do Rio, só foi reconhecida como território dos sem-roupa há cerca de um ano, depois de uma luta de dez anos na Justiça.
Uma pesquisa realizada recentemente entre seus freqüentadores traça um perfil inesperado do naturista brasileiro e, partindo desse microcosmo, coloca a nu esse desconhecido. No total, foram ouvidos 124 naturistas, sendo 92 homens e 32 mulheres, entre empresários, professores, policiais, profissionais liberais, comerciantes e aposentados. A maioria apóia a segurança desarmada em Abricó. “Nesse país supostamente liberal, topless ainda causa frisson, imagina nudismo. Muita gente prefere cachorros e gigogas (plantas aquáticas que infestam as praias do Rio neste verão) aos naturistas. Temos que defender nossa integridade”, aponta o economista pernambucano Ângelo Caciatori, 37 anos, que freqüenta Abricó com a mulher, a arquiteta carioca Giani, 27 anos. Os dois se encaixam no perfil revelado pela pesquisa. São em sua maioria pessoas casadas (67%), com filhos (55%) e acima dos 35 anos – 40% têm entre 36 e 45 anos e 24%, acima de 45 anos. O nível de escolaridade é elevado, com 62% com graduação, mestrado ou doutorado. A maioria não é de naturistas de primeira viagem: um terço pratica naturismo todo fim de semana e quase metade já freqüentava outras praias – como Pinho, em Camboriú (SC), Brava, em Caraguatatuba (SP), e Trancoso, em Porto Seguro (BA).