Depois do coreano, um norueguês. Na semana passada, o pesquisador Jon Sudbon, do Radium Hospital, em Oslo, na Noruega, foi acusado de ter fraudado um estudo sobre câncer, publicado na revista científica Lancet. Ele teria inventado pacientes para aumentar a sua amostragem. A notícia mexeu com a comunidade científica, já perplexa com a constatação, há duas semanas, de falcatruas nos estudos de células-tronco conduzidos pelo sul-coreano Woo Suk Hwang. Na opinião do médico Gabriel Oselka, 65 anos, coordenador do Centro de Bioética do Conselho Regional de Medicina de São Paulo e professor de ética médica da Universidade de São Paulo, histórias como essas são exceções. O problema é que as falsificações ainda são difíceis de detectar. A seguir, a entrevista do especialista a ISTOÉ.

ISTOÉ – Os pesquisadores estão cometendo mais fraudes?
Gabriel Oselka –
Esses casos são exceções. A maioria dos estudos tem credibilidade.

ISTOÉ – Há um cenário propenso a golpes?
Oselka –
É grande a pressão para que os cientistas publiquem mais artigos em revistas especializadas. Suas instituições ganham mais prestígio, verbas e a carreira acadêmica é facilitada. Esse ambiente é convidativo à prática de atos fraudulentos para gente cujos princípios são frágeis.

ISTOÉ – É fácil identificar as artimanhas para adulterar estudos?
Oselka –
Não. Os mecanismos de revisão não foram desenhados para isso. Antes de o trabalho ser publicado, por exemplo, ele é avaliado por revisores independentes que, entre outras coisas, analisam a metodologia e a coerência da pesquisa. Mas há lacunas. Como desconfiar de provas formalmente corretas? Uma maneira seria fazer auditorias onde o trabalho foi realizado. Mas isso não acontece. Um dos motivos é falta de verbas.

ISTOÉ – Como as trapaças aparecem?
Oselka –
Na maioria das vezes, por denúncias de gente que trabalhou próximo ou participou da pesquisa.

ISTOÉ – E quanto às notícias de estudos manipulados para favorecer
laboratórios farmacêuticos?
Oselka –
Isso é preocupante. Há uma tendência de publicar somente os resultados positivos da droga. Mas, desde o final de 2005, publicações de peso aceitam apenas trabalhos inscritos num registro público (catálogo virtual onde são registradas pesquisas em andamento). O objetivo é estimular os cientistas a tornar público o que fazem e depois o resultado, seja ele qual for.

ISTOÉ – Essas denúncias não abalaram a confiança na ciência?
Oselka –
Espero que não. É importante saber que o controle dos estudos melhorou, embora ainda não seja o ideal.

ISTOÉ – Recentemente houve denúncias de violação da ética em uma pesquisa
de malária no Amapá. Exigiu-se dos participantes que deixassem mosquitos
picar seus braços. Como se explica?
Oselka
– O assunto é grave, está sendo investigado e precisa ser esclarecido. As informações veiculadas dão conta de que o projeto inicial dessa pesquisa não previa esse tipo de procedimento, que é antiético. Essas pessoas podem ter contraído a malária.