Uma inesperada onda de sexo está invadindo os cinemas. Depois de um período de certa reclusa, filmes diversos têm se mostrado cada vez mais ousados, provocando um frisson parecido àquele causado nos anos 70 por O último tango em Paris e O império dos sentidos. Há dez semanas em cartaz, Um copo de cólera, de Aluizio Abranches, vem rendendo mais comentários às calorosas acrobacias sexuais vividas pelo casal 20 Julia Lemmertz e Alexandre Borges do que pela conflitante relação imaginada pelo escritor Raduan Nassar em seu livro homônimo. O mesmo tem acontecido com Os idiotas, polêmico trabalho do dinamarquês Lars von Trier sobre um grupo de pessoas que enfrentam a moral vigente comportando-se como deficientes físicos e mentais dando espaço a uma orgia no meio da história. Não menos fortes são as cenas eróticas de Romance, da francesa Catherine Breillat, grande atração da 1ª Mostra do Cinema Francês, acontecida no Rio de Janeiro e em São Paulo, semana passada, que promete causar alvoroço quando for lançado em agosto no País. Além de mostrar sua protagonista se masturbando, praticando sexo oral e se aventurando pelo sadomasoquismo, a diretora escalou para o elenco o astro pornô italiano Rocco Siffredi, que se comporta como se estivesse num de seus mais de mil vídeos em que mostra o famoso atributo.

 

Orgia – Pode parecer coincidência, mas o mesmo artifício é usado no filme adulto mais aguardado do ano, De olhos bem fechados (Eyes wide shut), que será lançado nos Estados Unidos na sexta-feira 16 e no Brasil em 3 de setembro – último trabalho do cineasta Stanley Kubrick, morto em março passado, cinco dias depois de finalizá-lo. Tanto que já ganhou o apelido de 1999 uma odisséia do sexo, referência ao clássico de Kubrick 2001 uma odisséia no espaço, desde que o crítico inglês Alexander Walker, amigo e biógrafo do diretor, descreveu numa crítica publicada há uma semana no jornal London Evening Standard detalhes do enredo guardado a sete chaves por três anos. Entre as revelações do privilegiado espectador, que furou todo o esquema de divulgação da distribuidora Warner Bros. ao assistir ao filme numa sessão particular com a viúva Kubrick, estão uma movimentada sequência de sexo grupal no qual os convivas usam como adereço apenas máscaras venezianas.

O que tem causado grande curiosidade e garantido a publicidade de De olhos bem fechados, no entanto, é a promessa de intensas cenas íntimas entre os protagonistas Tom Cruise e Nicole Kidman, casados na vida real. Dizem que os dois tiveram até auxílio de terapeutas sexuais para armarem seu circo tântrico. O que se sabe mesmo é que Cruise interpreta um médico e Nicole uma ex-dona de galeria de arte bem colocados na vida. A história começa com o par se preparando para uma aventura erótica numa festa de milionários. Numa das sequências já conhecidas, o casal aparece nu, se acariciando diante do espelho. "Podíamos ficar excitados ou sentir o que quiséssemos e acho que era isto que Kubrick queria", afirmou Nicole em recente entrevista. Para filmá-los em situações como esta, Kubrick dispensou toda a equipe e operou a câmera sozinho. Com Aluizio Abranches aconteceu o oposto. Ele conta que dirigiu as tórridas cenas amorosas de Um copo de cólera acompanhado de fotógrafo, maquinista, eletricista e foquista. "Foi tudo feito de uma vez só. Apesar de parecer tão natural, ensaiamos quase dois meses", lembra Abranches, que contou com o trabalho de uma coreógrafa para ajudar na preparação corporal dos atores.

 

Realismo – Seja como for, devido ao realismo alcançado muita gente jura que Julia e Borges chegaram às vias de fato. "Este tipo de observação é ridículo, meu filme não é Catalina Vídeo", irrita-se o diretor, referindo-se ao famoso selo pornô. O tênue limite entre arte e pornografia não parece incomodar a provocativa escritora e diretora Catherine Breillat, que esteve no Brasil divulgando Romance. Em 1968, seu livro de estréia foi proibido na França para menores de 18 anos por causa da linguagem pesada. À época, Catherine tinha apenas 17. Para narrar a trajetória de Marie (Caroline Bucey) – uma professora parisiense, descontente com o casamento, que busca o prazer com amantes diversos –, Catherine usa e abusa do sexo explícito. A cena mais comentada mostra Marie na intimidade com o amante Paolo (Rocco Siffredi). Segundo a atriz, o ato em si, repetido seis vezes nas filmagens, foi pura representação. Siffredi afirma que não. Este tipo de dúvida não passa pela cabeça dos espectadores de Os idiotas. O que se vê na tela é sexo pesado mesmo, com cenas mais que explícitas. Para não constranger nem exigir muito do elenco, o diretor Lars von Trier – um dos signatários do movimento Dogma 95, que procura colocar em xeque o artificialismo do cinema atual – utilizou atores pornô como dublês dos protagonistas. Ou seja, se um dia você quiser ver Os idiotas em vídeo, procure bem na locadora. Pode estar na seção de eróticos ou na de filmes-cabeça.