09/06/1999 - 10:00
Depois de cinco meses de bombardeio que transformaram seu governo em um Titanic prestes a afundar, o presidente Fernando Henrique Cardoso faz planos para, mais uma vez, iniciar o segundo mandato. Se der certo a estratégia que está sendo armada por FHC para passar uma borracha na desastrosa largada, a nau, em agosto, já terá acertado o prumo e estará com as máquinas em funcionamento a pleno vapor. Aproveitando-se da trégua que lhe será proporcionada pelo recesso do Congresso, FHC vai fazer até julho uma reforma ministerial com o objetivo de consertar as múltiplas avarias no casco. A reengenharia palaciana vai procurar atender aos gulosos partidos aliados e dar ao mesmo tempo mais dinâmica ao governo. Os reparos começam no próprio Planalto para onde deve ir com o apoio de toda a base governista o ex-deputado e ex-coordenador da reeleição, Euclides Scalco, que voltaria a Brasília com amplos poderes para exercer a coordenação política do governo. "O Scalco está fazendo muita falta", reconheceu o presidente em conversa com assessores na quarta-feira 2 ao avaliar a brigalhada que tomou conta de seus parceiros políticos. Quem vai perder com a ida de Scalco para o Planalto é o desgastado chefe da Casa Civil, Clóvis Carvalho.
Outra mudança prevista é a transferência do ministro das Comunicações, Pimenta da Veiga, para o lugar de Celso Lafer no Ministério do Desenvolvimento. Brigado com a cúpula do PMDB e sem trânsito junto ao presidente do Senado, Antônio Carlos Magalhães, é difícil Pimenta continuar à frente da articulação política. Pimenta tem até planos ousados para o novo cargo como o de dar uma guinada no BNDES que passaria a dar prioridade às pequenas e médias empresas na aplicação do seu bilionário orçamento.
Lugar errado O principal obstáculo ao deslocamento de Pimenta é a intenção do PSDB de São Paulo de emplacar como ministro David Zylbersztajn, genro de FHC e diretor-geral da Agência Nacional do Petróleo (ANP). Antes de promover a troca no Desenvolvimento, Fernando Henrique busca outro cargo para acomodar Lafer, considerado no Planalto "o homem certo no lugar errado". Se depender do próprio Lafer, o presidente não terá maiores dificuldades em encontrar o lugar certo. Magoado por estar sendo rifado pelos tucanos, Lafer recentemente fez um comentário sintomático com um colega de Ministério. "Bom mesmo é ser chanceler", desabafou, saudoso dos tempos em que foi ministro das Relações Exteriores no governo Collor.
Com um outro titular na pasta de Desenvolvimento, FHC pretende mais que uma mudança de estilos. Preservando a atual política monetária e fiscal, ele quer criar um núcleo de novos ministros com força para aproveitar uma possível recuperação dos indicadores econômicos e alavancar uma onda de crescimento. FHC gostaria, por exemplo, de ver no lugar de Francisco Turra o peso pesado Delfim Netto no Ministério da Agricultura. Está disposto também a ressuscitar o Ministério do Desenvolvimento Urbano para executar amplos programas de habitação e saneamento. No rateio, essa pasta deve ficar com o PFL. De olho no cargo, o líder do partido na Câmara, deputado Inocêncio Oliveira, já tem planos na gaveta. Mas há outros nomes no páreo como o do deputado neopefelista Roberto Brant. O ex-tucano poderia ser premiado com o cargo dentro do projeto presidencial de ACM que precisa fincar um pé em Minas Gerais.
Ao agradar o PSDB, onde o ministro da Saúde, José Serra, continuaria com seu poder intocável, e o PFL, Fernando Henrique vai ter também de compensar o PMDB. Pelo roteiro traçado desde a campanha eleitoral, o quinhão do PMDB será o Ministério da Infra-Estrutura, fusão das pastas das Comunicações, Transportes e Minas e Energia. Se for criado, está reservado para o atual ministro dos Transportes, Eliseu Padilha. Mas Fernando Henrique ainda tem dúvidas sobre a conveniência política de extinguir ministérios num momento em que está fragilizado. Enquanto planeja o futuro, FHC tem que administrar na esteira do escândalo dos grampos uma outra crise interna. Na noite da segunda-feira 31, contou com a ajuda de Pimenta e de Clóvis Carvalho para convencer o general Alberto Cardoso a não se demitir da chefia da Casa Militar, em conflito aberto com a Polícia Federal comandada pelo ministro peemedebista da Justiça, Renan Calheiros. Nos próximos dias, FHC terá de bater o martelo sobre o novo xerife da PF. Com o apoio da cúpula do PMDB, Renan indicou para o cargo o delegado Wantuir Jacini, que desagrada ao general Cardoso. "Estou absolutamente convencido de que o presidente vai acatar a sugestão do ministro da Justiça", pressiona Jader. Por causa de quedas-de-braço como essa, FHC resiste a promover uma mudança ainda maior em sua equipe. Sua expectativa é de que as mexidas no governo somadas a uma melhoria no quadro econômico e a uma mudança de sua própria agenda, com espaços cada vez maiores para viagens ao interior, seriam suficientes para a recuperação de pelo menos parte da popularidade perdida. Tudo isso, porém, são planos. A história mostra que as reformas ministeriais costumam sair bem diferentes dos esboços presidenciais.