Durante anos, o professor Vladimir Meyer (Vlady) viveu oprimido por sua herança política e pessoal. Para tentar convencer o filho Karl que sua opção pelo socialismo não fora um trágico equívoco, Vlady lhe escreve uma longa carta na qual narra a epopéia da geração de seus pais. Eles foram militantes revolucionários alemães, que abraçaram o comunismo nos anos dourados da revolução soviética e depois viram aquela utopia se transformar num regime genocida. Esta narrativa dramática é a essência de Medo de espelhos (Record, 320 pág., R$ 35), belo romance do escritor, roteirista e militante político paquistanês Tariq Ali.

Na sua carta ao filho cético, o obstinado Vlady conta que, apesar de todos os erros, a geração de seus pais – e também a sua – não foi apenas uma geração vencida e fracassada. O pai de Vlady, Ludwik, lutou no Exército Vermelho durante a guerra civil que se seguiu à Revolução Bolchevique de 1917 e depois montou uma eficiente rede de espionagem soviética na Europa. Crítico feroz do stalinismo, acabou assassinado por agentes do Kremlin em 1937. A mãe, Gertrude, era uma devotada comunista que até o fim da vida guardou um terrível segredo. E que segredo!

Para Vlady, a queda do Muro de Berlim, em 1989, trouxe grandes esperanças logo transformadas em amarga frustração. O mundo cinzento do stalinismo foi substituído pelas leis da selva capitalista. Ágil e envolvente, Medo de espelhos pode ser lido como um thriller no qual espionagem, traições, amores e frustrações nos conduzem a uma fascinante viagem ao dilacerado mundo pós-comunista.