A educação deve viver dois grandes momentos, nos próximos 50 anos: um daqui a duas décadas, quando, espera-se, o conceito de escola-cidadã, que ensina direitos e deveres por meio de exemplos e reflexão, será uma prática consolidada. O segundo deve acontecer em 2050, com a entrada em cena de um conceito batizado de pedagogia da Terra ou, mais frequentemente, formação holística. A previsão é de Moacir Gadotti, professor titular da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo e diretor do Instituto Paulo Freire, organização não-governamental que presta consultoria a escolas e a secretarias de educação. Depois de se centrar durante os últimos dois séculos no acúmulo de conhecimento, a educação deve se voltar a questões tão existenciais como o medo, a morte ou a vida após a morte, o que nos lembra a academia do filósofo grego Platão, de cerca de dois mil anos. Uma tendência visível não só nos sonhos de quem trabalha e pensa na educação, mas registrada no relatório da Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI publicado pela Unesco neste final de ano. Uma espécie de carta de intenções com quatro pilares básicos: aprender a conhecer, a fazer, a viver juntos e, finalmente, a ser. Integrando todos os demais, o item aprender a ser busca a realização pessoal e o conhecimento das emoções. “O retorno à formação integral do homem deve ser a tônica do próximo milênio”, diz o professor Alípio Casali, titular de pós-graduação em Educação da PUC de São Paulo. “A educação tem se preocupado com partes do homem, ora com a moral, ora com a erudição, ora com a profissionalização e agora volta a olhar o conjunto”, diz Casali.

Segundo os especialistas, as grandes mudanças não levam menos de três ou quatro décadas para sair dos sonhos e chegar ao cotidiano. Mas, quando isso acontecer, a escola se tornará mais barulhenta, prazerosa, participativa e essencialmente amorosa. “Em seus corredores andariam alunos entusiasmados com seus trabalhos. A tônica seria a autonomia a partir de um bom projeto pedagógico”, diz o diretor do Instituto Paulo Freire. Duas questões básicas nortea-riam os professores: o gerenciamento – e não o repasse – do conhecimento e o desenvolvimento da sensibilidade. A relação do homem com o mundo seria outra. De exploradores passaríamos a reverenciadores do planeta. “Pequenos e simples prazeres, como pisar descalços na grama úmida ou na areia quente, seriam revalorizados”, diz o professor. Os educadores estimulariam em seus alunos não só a capacidade de aproveitar as fontes de conhecimento, mas principalmente a de sentir prazer em estar e conviver com o outro. O espaço físico da escola também acompanharia a nova ordem. Nos sonhos da pedagoga Sílvia Fichmann, que coordena a equipe consultiva da Escola do Futuro, da Universidade de São Paulo, as crianças deveriam usufruir de um lugar de muita experimentação, onde pudessem conviver com animais, fabricar remédios ou cultivar uma horta. A formação escolar não seria dividida em séries e a tecnologia seria o instrumental para estudos feitos sempre em grupo.

“Cada um se desenvolveria conforme o seu ritmo, suas competências e áreas de interesse, trabalhando em projetos”, propõe. A música, extremamente importante, estaria de volta ao currículo como fundo para todas as atividades. “Dentro da lógica dos interesses individuais, nem todos se envolve-riam com música, mas teriam acesso a ela”, pontua. As crianças, livres dos horários, das filas e estimuladas a experimentar teriam, finalmente, uma escola capaz de formar cidadãos.