03/11/1999 - 10:00
A estréia foi tão badalada quanto uma première hollywoodiana, com direito a festas de arromba e extensa cobertura dos jornais. O primeiro capítulo, filmado na Inglaterra, misturava clima de romance épico com cenas escancaradamente chupadas do filme Titanic. Desde o início, dava para ver que a aposta da Rede Globo em Terra nostra era alta, e cada capítulo custava bem mais que os R$ 90 mil habituais. Pouco mais de um mês depois de entrar no ar, vê-se que não estavam blefando. São muitas as evidências do sucesso da novela. Para começar, os irrefutáveis números do Ibope. O instituto vem registrando a média de 50 pontos de audiência da nova novela das oito, chegando a picos de 57. A antecessora, Suave veneno, patinava nos 40 pontos, consequência de uma história fraca e de personagens mal desenvolvidos. Mas também há sinais que mostram que a superprodução está saindo da sala de estar e ganhando as ruas. Até em rodas de praia começam a ser ouvidas expressões como ecco e va bene!, repetidas exaustivamente pelos imigrantes italianos da trama.
Além de reconquistar o espectador para a novela das oito, Terra nostra também poderá ser lembrada por sua acertada escalação do elenco de jovens. A emissora arejou a telinha ao escolher atores que surpreendem ao reunir beleza e talento em doses equilibradas e cuja imagem ainda não estava saturada, como Thiago Lacerda, Carolina Kasting, Marcelo Anthony, Gabriel Braga Nunes e Maria Fernanda Cândido. A decisão foi tomada porque a novela vai ser exibida durante quase um ano. Mesmo se dividindo em três fases diferentes, cogita-se de que alguns atores deste primeiro período, sobretudo os dois protagonistas, voltem no último, que se passará nos dias de hoje.
Entre as revelações, há jovens já consagradas como Ana Paula Arósio, a protagonista Giuliana, que tinha sido coberta de elogios que não se restringiam ao seu rosto perfeito quando protagonizou a minissérie Hilda Furacão. Paloma Duarte, a outra exceção, que interpreta a sonhadora Angélica, tinha demonstrado seu talento em outras novelas. Foi Jayme Monjardim, diretor-geral da novela, que investiu pessoalmente na escalação do galã Thiago Lacerda, de Carolina Kasting e de Maria Fernanda Cândido. “Só escolhi atores iluminados”, diz ele. Para que Carolina vivesse a temperamental Rosana, Jayme precisou conversar pessoalmente com o diretor de criação, Roberto Talma. Quando as gravações começaram, a atriz estava trabalhando na série Malhação como Laila, uma menina que se disfarçava de noviça.
Depois da experiência traumática de Brida, da Rede Manchete, que protagonizava e viu naufragar junto com a emissora, a atriz de 24 anos vem mostrando maturidade como a filha mais velha e voluntariosa do fazendeiro Gumercindo (Antonio Fagundes). Ela tirou proveito do fato de todos os flashes estarem exaustivamente voltados para a dupla Thiago Lacerda e Ana Paula Arósio e, no vácuo deixado pela chatice e eterna tristeza de Giuliana, acabou crescendo como a menina mimada que rouba o mocinho da mocinha. Acostumada a viver mulheres frágeis e delicadas, a atriz ganhou pela primeira vez uma personagem com gênio forte. “Eu sabia que fazer antagonista é sempre interessante, causa algum tipo de reação”, diz Carolina. Paloma Duarte, por sua vez, que coleciona papéis fortes, faz pela primeira vez uma jovem ingênua e reprimida.
Num tempo em que a tevê foi invadida por atores-modelos que causam constrangimento ao abrir a boca, Terra nostra também se destaca pelos desempenhos bastante convincentes de Thiago Lacerda e Maria Fernanda. Ambos são ex-modelos com pouca experiência dramática, mas ninguém pode duvidar que têm mais que os pares de olhos verdes para mostrar. A Paola de Maria Fernanda, até hoje contratada da Ford Models, é prova de que a atriz pode mais do que correr de forma sensual, como aparece na abertura de A indomada, que está sendo reprisada à tarde. De lá para cá, fez cursos de interpretação e duas novelas, Pérola negra, no SBT, e Serras azuis, na Band. Monjardim a escolheu no primeiro teste. “Nem tive tempo para ficar tensa. Só estudei muito o personagem e italiano”, conta ela. Thiago, aos 22 anos, também não decepcionou fazendo o italianinho tão teimoso quanto lindo. Ele já abandonou as passarelas há muito tempo e ficou famoso como Aramel, o Belo, amigo do protagonista de Hilda Furacão. Razões para o êxito da novela não faltam, mas para salvar o horário nobre do atoleiro, a Rede Globo precisou se render à concorrência. Reeditou a bem-sucedida parceria de Benedito Ruy Barbosa e Jayme Monjardim, dobradinha responsável pelo sucesso de Pantanal, produção da extinta Rede Manchete que em 1989 deu muita dor de cabeça à Globo.
Estão lá algumas inevitáveis semelhanças com Pantanal. Entre uma tarantella e outra, muito papo na cozinha, muita refeição em família. Na cama, além de sexo (desta vez, só insinuado), os casais sempre aproveitam para pôr a conversa em dia. Tudo isso num tempo bem mais lento que o habitual. Benedito é mestre em contar histórias concentrando a ação em poucos núcleos, dando pesos mais ou menos equivalentes aos personagens de forma que todos tenham uma história bem delineada. Ele, é óbvio, não dispensa tiradas dignas dos melhores folhetins. Casal apaixonado separado contra a vontade, casamento forçado, filho roubado na hora do parto, lá estão todos os ingredientes para arrebatar o mais frio dos espectadores.