30/04/2003 - 10:00
Para tirar harmonias e melodias de um velho pedaço de madeira, é preciso mais do que palavras mágicas. A arte de transformar troncos em instrumentos não compete a fadas e madrinhas, mas a um tipo bem diferente de mágico: os luthiers. Estes não usam amuletos e cartolas. Na maioria das vezes, preferem macacão e camiseta. Sua varinha de condão são suas plainas e seus formões. Seu castelo são pequenas oficinas, normalmente escuras e cheias de serragem. A palavra lutherie, traduzida para luteria em português, nasceu na França, derivada do termo árabe al’ud, sinônimo de “a madeira”. Agora, pela primeira vez em livro,
os perfis de oito grandes luthiers brasileiros foram reunidos pelo
paulista Carlos Roque, 48 anos.
Escolhi quatro instrumentos populares e quatro instrumentos eruditos e fui conversar com os músicos para descobrir quem eram os mais representativos construtores de cada um deles”, explica o autor de Luthiers: artesãos musicais brasileiros (edição independente). “Quem toca esses instrumentos mostra o rosto nos recitais e nas capas dos discos e pode ficar conhecido. Mas os rostos e os nomes de quem os constrói serão sempre desconhecidos do grande público”, diz.
Contrabaixo acústico, violoncelo, violino, viola de arco, viola caipira, violão, violão de sete cordas e cavaquinho fazem a cozinha sonora da obra de Carlos Roque. A exatidão e a beleza de suas peças aproximam artesãos como Paulo Gomes, especializado em contrabaixo, e Vergílio Artur de Lima, craque da viola caipira. Se o primeiro executa uma ou duas peças por ano e restaura mais de 30 em sua oficina na capital paulista, o segundo comemora o interesse crescente pelo mais brasileiro dos instrumentos e, instalado na mineira Sabará, finaliza uma média anual de 15 violas. Ambos conquistaram prestígio ímpar. Contrabaixos de Paulo Gomes integram o arsenal de gênios da música norte-americana, como o jazzista Ron Carter e o solista erudito Gary Karr. As violas de dez cordas de Vergílio peregrinam pelo Brasil e pelo Exterior nos braços de violeiros como Ivan Vilela, Paulo Freire, Roberto Corrêa e Pereira da Viola.
Com apresentação assinada pelo compositor alemão Hans-Joachim Koellreutter – introdutor do dodecafonismo no Brasil e professor de Tom Jobim –, o livro custa R$ 100 e pode ser adquirido diretamente com o autor no e-mail karlosroque@aol.com. Luthiers como Paulo Gomes e Vergílio – acompanhados no livro por Rafael Sando, Luigi Bertelli, Izaías Batista de Oliveira, Sérgio Abreu, Jó Nunes e João Batista – só terminam sua obra quando a música escapa, encantada, de seus instrumentos. Como um sorriso de Pinóquio.