Nenhuma grande revelação, nenhuma fofoca. Apenas um retrato em branco-e-preto de uma bela reportagem sobre a vida de um dos maiores artistas da MPB feita pela jornalista Regina Zappa mostrando um Chico Buarque de Hol-landa mais acessível do que de costume, confiante de que a bió-grafa não ultrapassaria seus “territórios sensíveis”. Mesmo os assuntos que pode-riam ser explosivos, como o alcoolismo e sua separação de Marieta Severo, são tratados de forma amena. “Chico tinha uma relação de pouco cuidado com ele mesmo. Uma coisa meio punk, compulsiva e um pouco destrutiva”, conta Marieta no livro. Não raro, chegava em casa de madrugada. Acordava quando as filhas já tinham voltado do colégio, embora fosse um pai zeloso. Mas esqueçam: nenhuma linha sai da boca dele a respeito da separação. Política, música, família e futebol são os principais ingredientes deste simpático Chico Buarque (Relume Dumará, 200 págs., R$ 15), da série Perfis do Rio.

Recheado de histórias que revelam como foram feitas algumas de suas canções mais conhecidas, o livro de Regina vai quebrando a mística de que Chico Buarque é um ser miste-rioso. A jornalista ouviu dezenas de pessoas e pinta o compositor e cantor carioca como um sujeito simples nos assuntos cotidianos, capaz de se contentar com um ovo frito, que tem insônias e escreve no escuro para não espantar o sono. Um ser apaixonado pelo futebol, que jogou num time de segunda divisão na Itália durante seu auto-exílio no final dos anos 60, e inventou um jogo de temática futebolística, o Ludopédio, fabricado pela Grow.

O livro conta ainda detalhes da sua infância em São Paulo, a relação com o pai, o historiador Sérgio Buarque de Hollanda, a rápida flertada com o movimento religioso de ultradireita Tradição Família e Propriedade (TFP), a passagem pelas páginas policiais como ladrão de carro, a paixão imediata pela bossa nova e sua entrada definitiva na música. Pensou em ser diplomata, mas foi estudar arquitetura na Universidade de São Paulo (USP). Só depois de A banda estourar em 1966 pensou mais seriamente em abraçar a carreira musical. Incrível é que Chico Buarque jamais teve aula de violão ou voz. E, para espanto, nunca escreveu uma letra solitária sem antes já ter a canção para encaixá-la. Músicas e letras, aliás, que marcaram época.