Parodiando a canção Amor e sexo – de Rita Lee, inspirada em texto de Arnaldo Jabor –, São Paulo é hip-hop, Rio de Janeiro é funk; São Paulo é Matisse, Rio é Picasso; Rio é Martin Scorsese, São Paulo é Francis Ford Coppola. A partir destas comparações, ficam as perguntas: como traduzir em texto e imagens o embate, que não raro resulta em empate, se as duas cidades se entrelaçam e promovem a troca de seus significantes, sem perda de identidade, para usar as palavras do semiólogo Roland Barthes? Ou como prefere o jornalista Nirlando Beirão, ao dizer que “são realidades que convergem, mas não se explicam”?

O pingue-pongue ininterrupto entre as duas capitais ganha um elegante registro no livro Rio/Sao: doze visões de duas cidades maravilhosas (FormArte Editora, 260 págs., R$ 80), que reúne ensaios de Beirão à visão de 11 fotógrafos sobre o tema. Com coordenação editorial de Rosana Delellis e direção de arte dividida entre Ricardo Van Steen e Nicky Fonseca, também curador, o livro ganhou edição do artista plástico Arthur Lescher, que soube muito bem jogar com as oposições. Assim, portraits de Bob Wolfenson de gente representante de São Paulo e de Antonio Guerreiro de personagens ícones do Rio praticamente dialogam nos cliques de Arnaldo Antunes e Ibrahim Sued, de Adriane Galisteu e Carmen Mayrink Veiga ou de Pietro Maria Bardi e Nelson Rodrigues.

Contornos e personagens cariocas também desfilam diante das lentes de Miguel Rio Branco e de Severino Silva, enquanto típicas situações paulistanas surgem da visão aguçada de Emidio Luisi. Os textos de Nirlando Beirão fogem da descrição pura e simples das fotos para entrar no terreno da agregação de referências auxiliares que iluminam, esclarecem e reforçam o que se está vendo. Assim como o já citado Barthes, passeiam pelo texto do jornalista citações e detalhes que remetem a pensadores do porte de Susan Sontag, Claude Lévi-Strauss e Pierre Verger; a mitos pop, como Jack Kerouac, Elvis Presley e Lady Di; ou a cineastas da grandeza de Roberto Rossellini, Michelangelo Antonioni e Federico Fellini. Beirão também não esquece da santíssima trindade do romance noir, habitada por Raymond Chandler, Dashiell Hammett e James Ellroy e dos fotógrafos das visões peculiares Henri Cartier-Bresson, Robert Frank e Sebastião Salgado. Exatamente como Rio de Janeiro e São Paulo.