A força-tarefa liderada pelo governo federal para combater o crime no Rio de Janeiro foi anunciada em 16 de maio e ainda não produziu um único fato digno de registro. No outro lado do front, para o desespero crescente do carioca, o inimigo deita e rola. Na semana passada, vias expressas foram fechadas por tiroteios, tropas de traficantes atacaram um depósito da Polícia Civil e até uma bazuca e munição de canhão foram encontradas no Morro do Adeus e na Vila Cruzeiro, no Complexo do Alemão/Penha onde o jornalista Tim Lopes foi condenado e executado pelo tribunal do narcotráfico. Pressionado por mais uma onda de reação da sociedade contra a violência, o secretário de Segurança Pública do Rio, Roberto Aguiar, cobrou do governo federal o cumprimento de suas obrigações na força-tarefa e abusou da sinceridade numa entrevista: “Se vocês querem que sejamos milagrosos, ponham Jesus como secretário de Segurança”, desabafou na quarta-feira 10. Na madrugada seguinte, cerca de 50 bandidos em dez carros atacaram PMs que faziam uma blitz na Linha Amarela, ligação da Barra da Tijuca (zona oeste) com a zona norte.

A demonstração de força dos bandidos começou no sábado 6, quando o trânsito foi interrompido na Linha Amarela por quase uma hora durante um intenso tiroteio entre policiais e traficantes do Complexo da Maré, na zona norte, o mais populoso conjunto de favelas do Rio. Na noite seguinte, numa de suas mais ousadas ações, o tráfico atacou com 40 homens o depósito da Delegacia de Roubos e Furtos de Automóveis (DRFA). Metralharam tudo e deixaram o prédio semidestruído. Perseguidos, os bandidos aterrorizaram motoristas que passavam pela Linha Vermelha, uma das principais vias de acesso ao Rio.

Ousadia – Na segunda-feira à noite foi a vez do Túnel Zuzu Angel, que liga os elegantes bairros da Gávea e de São Conrado. Um bando fechou o local para roubar os motoristas. Vários motoristas em pânico abandonaram os carros e saíram correndo. Quando os policiais chegaram, já não encontraram os assaltantes nem as vítimas. Os efeitos no trânsito foram sentidos ainda por muitas horas. No dia seguinte, mais notícias do front inimigo. Durante uma revista no presídio Edgar Costa, em Niterói, foram encontrados celulares, armas, maconha, cocaína e uma balança de precisão. A vistoria foi motivada por uma denúncia anônima e contou com 140 policiais, sem a participação da força-tarefa. De acordo com o secretário estadual de Justiça, Paulo Saboya, será instaurada uma sindicância para apurar como os objetos entraram na unidade.

A quarta-feira reservaria para os cariocas outra cena que fortalece a tese de colombização do Brasil: PMs apreenderam uma bazuca sueca e uma munição de canhão no Morro do Adeus, em Ramos, zona norte. A bazuca, de uso das Forças Armadas, estava carregada e pronta para ser acionada. A bala de canhão foi encontrada em uma lata de lixo. Ninguém foi preso. No mesmo dia, impaciente com a invisibilidade da força-tarefa, a sociedade foi mais uma vez às ruas implorar pela paz. Cerca de 12 mil pessoas fizeram em Bangu, zona oeste, uma passeata contra o fechamento de escolas e postos de saúde por ordem do narcotráfico. Eram professores, alunos e pais de 145 escolas indignados com as regras impostas pela bandidagem.

O delegado da Polícia Federal Getúlio Bezerra, coordenador da força-tarefa, reage às críticas. “Não queremos assumir a Secretaria de Segurança. Nosso trabalho é nacional. Estamos atacando as fontes de produção e as linhas de distribuição para o Rio”, afirma. Ele contabiliza “cerca de 30 ações estratégicas” iniciadas desde sua posse, em 26 de junho. “Focamos nosso trabalho nas drogas, no dinheiro e nas armas. Mas não sou o salvador da pátria nem esse programa é a salvação de todos os males”, desabafou o delegado, numa atitude semelhante à do secretário de Segurança em sua singela menção a Cristo. Bezerra prometeu para breve instalar uma unidade-modelo na Superintendência da Polícia Federal do Rio, “com o que há de mais moderno no País”. Entre os eventos que têm atrasado o trabalho das forças federais, segundo ele, até a Copa do Mundo está incluída: “Aconteceram feriados, a saída do ministro da Justiça, a conquista do penta. Tudo isso atrapalhou um pouco o nosso trabalho.”

As comemorações do penta, no entanto, não impediram o avanço do inimigo. Nem as evidências de que sua atuação se amplia pelo País. Na quinta-feira, o crime organizado surpreendia em Belo Horizonte, onde a polícia descobriu um arsenal clandestino com granadas das Forças Armadas dos Estados Unidos e até munição antiaérea numa casa do bairro Cardoso. Em Minas Gerais, as festas também não arrefeceram o ânimo da bandidagem.

Colaboraram: Francisco Alves Filho e Marcos Pernambuco